O reducionismo sacramental é um dos fatores que prejudicam uma vivência adequada do batismo.
Muito cedo na vida da Igreja, em meio a disputas teológicas e eclesiológicas, os sacramentos foram submetidos a uma visão jurídica, particularmente à questão da sua validez. A pergunta era mais ou menos a seguinte: qual é o mínimo necessário para que um sacramento possa ser considerado válido? No caso do rito batismal, o mínimo que se julgava necessário para que fosse considerado válido era: um ato com água à qual se junta a palavra de instituição. E o próprio ato com água acabou reduzido, muitas vezes, à aspersão de algumas poucas gotinhas. Compare-se esse encolhimento ao estritamente essencial, por exemplo, com a riqueza do rito de Hipólito. Essa redução ao estritamente necessário é extremamente prejudicial, pois ameaça o batismo de perder sentido para as pessoas e tornar-se-lhes ininteligível. Na opinião de um eminente teólogo luterano, com essa minimização sacramental a igreja trai as pessoas que são batizadas, na medida em que ela não mais expressa o batismo como um passo de tremenda importância, “na medida em que não fornece um evento base a partir do qual pode ser derivado todo o complexo de conceitos batismais [...]”.(Brand, Eugene LBatismo: uma perspectiva pastoral. São Leopoldo: Sinodal, 1982)—
Outro fator que prejudica uma vivência adequada do batismo é a fragmentação do rito.
Um documento da Comissão de Fé e Constituição, do Conselho Mundial de Igrejas, explica as diversas manifestações dessa fragmentação. (BEST, Thomas F.; HELLER, Dagmar (Ed.) Becoming a Christian: The Ecumenical Implications of Our Common Baptism. Geneva: WCC, 1999) Diz que, seguidamente, o batismo foi separado do ensino cristão, da ceia do Senhor, do culto e da vida comunitária. O ato batismal, freqüentemente, deixou de ser aquele que dá admissão à mesa do Senhor. A confirmação veio a ser “celebrada anos depois do próprio batismo e sem qualquer referência batismal”. Raramente é estabelecida uma relação entre o processo do batismo e “a vida em suas muitas dimensões, e menos ainda em sua dimensão ética. Em muitos casos, o Batismo com água e o dom do Espírito foram desconectados, tornando-se, seguidamente, dois “batismos”. Essa multifacetada fragmentação do rito batismal teve consequências desastrosas para a compreensão e vivência do batismo.
A prática batismal atual sugere que o batismo seja muito mais um rito de nascimento ou maternidade/paternidade, do que um rito de iniciação.
A maioria dos batismos das igrejas históricas é de crianças recém- nascidas. Muitas liturgias de batismo encerram com uma bênção da mãe ou da mãe e do pai da criança batizada. Freqüentemente,uma das principais leituras das liturgias batismais é Mc 10.13-16 (... Deixai vir a mim os pequeninos...), que não é um texto batismal. A inclusão da bênção da mãe ou da mãe e do pai e a inserção do chamado evangelho das crianças de Mc 10 na liturgia batismal testemunham a salutar percepção de que é preciso, sim, celebrar liturgicamente,na presença de Deus e da comunidade, as passagens relevantes da vida, entre as quais se destacam o nascimento e a maternidade e paternidade. No entanto, não há como negar que a inclusão desses elementos na liturgia batismal confunde a comunidade e a leva a ver no batismo muito mais um rito de nascimento, de maternidade e paternidade, do que o rito de iniciação a uma sociedade alternativa. Dessa forma, ambos saem prejudicados, tanto o rito de iniciação, que é descaracterizado, quanto o de nascimento ou maternidade e paternidade, que também acaba não recebendo o lugar que merece.
A confirmação veio a tornar-se requisito para a participação na ceia do Senhor, introduzindo uma separação entre esta e o batismo.
Muito cedo, no ocidente, o ato litúrgico da unção pós-batismal com imposição das mãos veio a ser uma ação reservada ao bispo. No século 5, essa ação passou a ser designada confirmar. Como nem sempre havia um bispo disponível para executá-la, essa parte acabou por separar-se do restante da liturgia batismal, sendo gradativamente protelada até que as crianças atingissem 7 anos de idade. Aquele antigo ato de unção com imposição das mãos, ao ser celebrado separadamente, veio a ser entendido como “um sacramento, através do qual o bispo da igreja confirmava que a pessoa havia sido batizada dentro da doutrina correta” (KALMBACH,Pedro. Bautismo y Educación. Buenos Aires, 2005). Os reformadores do século 16 rejeitaram tal sacramento, mas fizeram da confirmação um período de catequese e exame sobre o catecismo, culminando num ato litúrgico. Em algumas liturgias do século 16, “os confirmandos confessavam sua fé e recebiam uma bênção com imposição das mãos e o pedido de que Deus lhes outorgasse a força do Espírito Santo” (KALMBACH,Pedro. Bautismo y Educación. Buenos Aires, 2005). Na seqüência dessa evolução, a confirmação tornou-se o que hoje, por vezes, ainda é:requisito para a participação na ceia do Senhor.
Fonte: Livro de Batismo da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil
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