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ID: 2275

Meio Ambiente e 500 Anos do "descobrimento" da América - 1992

Carta Pastoral da Presidência

19/05/1992

O tema da IECLB, dizendo “Comunidade de Jesus Cristo a Serviço da Vida”, tem demonstrado relevância palpitante. Pretendo colocar sob este mesmo tema também a mensagem desta carta. Refere-se a dois eventos de destaque neste ano de 1992. Ambos sensibilizam a consciência cristã e pedem o apoio da Comunidade de Jesus Cristo.

1. O primeiro é a realização da “Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento” (UNCED), respectivamente a ECO-92, a ter lugar no Rio de Janeiro nos dias 04 a 12 de junho próximo.

1.1. O objetivo consiste em definir diretrizes globais de proteção ao meio ambiente e de alcançar acordos quanto à diminuição de produção e emissão de substâncias poluentes. Assim como as Nações Unidas, há décadas, formularam os “Direitos Humanos”, assim pretendem formular agora algo semelhante a “Direitos da Natureza”, em prol da preservação da vida no Planeta.

1.2. É claro que o assunto é de extraordinário interesse também e justamente para a Comunidade cristã. O ser humano recebeu o mandato de cuidar, não de destruir o jardim de Deus. Conseqüentemente, é grande a mobilização de Igrejas e entidades cristãs em torno dessa Conferência. Particularmente, o Conselho Mundial de Igrejas se engajou, com amplo apoio, não por último, de parte da Federação Luterana Mundial.

Foi elaborado material preparatório e haverá, nos dias 01 a 07 de junho, um encontro ecumênico no Rio de Janeiro, como uma forma de acompanhar a ECO-92. Está planejado também, para os dias 09 a 12 de junho, um “Foro Global”, promovido pelas assim chamadas “Organizações Não-Governamentais”, consistindo em grande número de programações paralelas. Em tudo isso se expressa a consciência de que o assunto do meio ambiente é por demais importante para ser deixado a cargo de políticos e governos tão somente. A natureza maltratada e a vida ameaçada exigem o engajamento de toda a sociedade, de todos os seus segmentos e de todas as suas organizações.

1.3. As notícias sobre o processo da preparação não são propriamente animadoras. A ECO-92 periga sucumbir na rivalidade dos interesses econômicos, no conflito norte-sul, na barganha política. Seria isto um desastre de imprevisíveis conseqüências para a sobrevivência da humanidade. Impõe-se o imperativo da renúncia ao consumo, especialmente por parte de quem tem recursos; impõe-se a necessidade de investir em tecnologias alternativas, impõe-se a urgência de equilibrar os escandalosos desníveis sociais em todo o mundo. Pois os piores inimigos do meio ambiente são a pobreza e o luxo. A humanidade - será ela capaz de promover as mudanças que a garantia do futuro exige e de redirecionar o comportamento?

1.4. A Comunidade de Jesus Cristo é chamada a colaborar com sua parte. Peço que a ECO-92 seja lembrada em intercessão no culto de Pentecostes, no dia 07 de junho. Recomendo, ainda, que “ecologia” seja tema de programações comunitárias e que sejam estudadas possibilidades de compartilhar as preocupações e, eventualmente, os resultados concretos da ECO-92 no ensino e na reflexão bíblica. Chamo especialmente a atenção às celebrações alusivas, elaboradas por iniciativa da Região Eclesiástica IV.

Cumpre-nos - assim entendo - atuar como “fermento ecológico” nas mais diversas oportunidades. Participarão da conferência no Rio de Janeiro, representando a IECLB: o Distrito Eclesiástico da área e, com incumbência especial, o Pastor Dr. Haroldo Reimer, o 2º Vice-Presidente Dr. W. Altmann e o Pastor Presidente. A ECO-92 requer a nossa oração, a nossa reflexão e a nossa ação. É esta uma maneira de concretizar o serviço à vida com que a Comunidade de Jesus Cristo está comprometida.

2. Também o outro evento, que é a comemoração dos 500 anos de “descobrimento” da América, merece ser colocado sob o enfoque do tema da IECLB.

2.1. O assunto, a essas alturas, já não é mais novo. Foi encaminhada carta de reflexão e estudo às comunidades, elaborada pela Comissão convocada para assessorar a IECLB na preparação das programações. Várias têm sido, entrementes, as manifestações respectivas dentro e fora da IECLB.

Menciono em especial o trabalho do Conselho de Missão entre índios (COMIN) da IECLB, além de pronunciamentos, pesquisas e publicações de Distritos, Instituições e outros órgãos, entre eles o posicionamento de igrejas evangélicas e evangélico-luteranas da América do Sul e da Igreja Evangélica na Alemanha sob o título “Quinhentos anos após Colombo”. Da mesma forma, cabe destaque às iniciativas do Conselho Latino-Americano de Igrejas (CLAI) e do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC), bem como ao material por eles enviado. Espero que as reflexões em torno desta comemoração tenham alcançado todo o povo evangélico e contribuído para uma conscientização do profundo significado de que esta data se reveste.

2.2. É uma lástima que os descobridores do continente não estivessem orientados pelo espírito em pauta no tema da IECLB. Talvez a história da América Latina nestes últimos 500 anos tivesse tido um curso diferente. De qualquer forma, o retrospecto nos confronta com pecado humano, incluindo o pecado da Igreja. O juízo sobre o passado, aliás, depende essencialmente da perspectiva que se adota. A Comunidade de Jesus Cristo não pode deixar de tentar olhar pelos olhos dos outros, dos índios massacrados, dos negros escravizados, dos imigrantes sacrificados e de muitos outros que, em vez de fazer a história, antes a sofreram. Que aconteceu com a vida neste Continente, depois de sua descoberta? Ela foi “servida”, promovida, respeitada? Retrospectos históricos podem ser dolorosos, provocar a vergonha, evidenciar a necessidade do perdão. É bom não fugir do ato de penitência que acontecimentos do passado requerem.

2.3. No entanto, também a ação de Deus deve ser vista, apesar das arbitrariedades e dos crimes humanos. Quem tem a coragem de negar que nestes 500 anos foi vivida também fé autêntica nesta América Latina? Que o Evangelho tem sido força e consolo para milhares de pessoas, na vida e na morte? Que Deus operou milagres neste Continente? Nós deploramos e milhões os pecados, confessamos também a nossa culpa. Simultaneamente, porém, glorificamos o nome de Deus por não ter deixado de revelar o seu poder e a sua graça e por ter sido o esteio de inúmeras pessoas, incluindo as Comunidades da IECLB.

2.4. O retrospecto histórico é salutar. Despertará, a um só tempo, a humildade e a gratidão. Ademais, nos motiva para uma nova solidariedade exatamente com os injustiçados do passado. Colocamo-nos a serviço da vida do índio com todas as implicações que isto tem. Os povos indígenas são criaturas de Deus, assim como nós. E para outros grupos marginalizados vale o mesmo. Se a sociedade assim fizer, e a Igreja nisto insistir, dando o bom exemplo, um novo período histórico poderá iniciar. Em lugar da rivalidade e do extermínio, convivência fraternal haverá de instalar-se, exercitando autêntica parceria em respeito mútuo da identidade alheia. A Comunidade de Jesus Cristo deve ao povo o Evangelho que salva vida em todas as suas dimensões. Portanto, depois de contemplado o passado, voltemos a atenção ao futuro e nos empenhemos numa evangelização integral. Esta não vai privilegiar a salvação da alma em detrimento da do corpo, assim como também não vai esquecer, por sobre as necessidades físicas das pessoas, as de ordem espiritual. A partir dos 500 anos de descobrimento, colonização, invasão, conquista, evangelização e resistência da América, somos chamados a repensar e reativar a nossa missão evangélica.

2.5. São numerosas as programações ecumênicas relativas ao evento, especialmente no mês de outubro. Propomos aos membros da IECLB que, dentro das possibilidades, delas participem. A parte disto, o Conselho Diretor resolveu solicitar às Comunidades que o culto do dia 11 de outubro seja celebrado como culto comemorativo em toda a IECLB. Para tanto, está sendo elaborado, pela Comissão de Liturgia, um formulário litúrgico especial. Rogamos que as Comunidades se unam em torno desta proposta, expressando assim a sua participação engajada no evento. Ademais, será sugerida ao Concílio Geral uma manifestação alusiva à data. Isto, não para permanecermos presos ao passado, mas para descobrirmos o rumo devido para nossa trajetória de comunidade evangélica de confissão luterana hoje, enviada para servir à vida.

Porto Alegre, 19 de maio de 1992

Dr. Gottfried Brakemeier

Pastor Presidente
 


Autor(a): Gottfried Brakemeier
Âmbito: IECLB / Instância Nacional: Presidência
Natureza do Texto: Manifestação
Perfil do Texto: Manifestação oficial
ID: 12563

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