A música na IECLB e o canto no culto
P. Ms. Evandro Jair Meurer
O canto na TV Brasileira
Com a ascensão dos meios de comunicação de massa nas últimas décadas, a música e o canto passaram a estar cada vez mais presentes. A era do rádio inaugura esta fase com seus musicais e shows. Mas com a chegada da TV, a simultaneidade de sons, músicas, cantos e imagens levam a uma espécie de encantamento descontrolado, por um lado e encantamento controlador, por outro. A(s) I(i)greja(s) não demorou(aram) muito para fazer uso da música e da TV para dar o seu recado ou aplicar semelhante encantamento.
Fato que poucos sabem, mas a TV no Brasil teve sua pré-estreia (em 3/4/50) com uma apresentação de um padre cantor mexicano. Igreja e canto juntos abençoando o novo meio. O binômio TV-Música se estabeleceu com os festivais de MPB (1965) televisionados e se fortaleceu com o uso e abuso da música nos comerciais.
Repetida milhões de vezes e criada para influenciar, a propaganda usa artifícios de caráter, no mínimo, duvidosos para deixar o telespectador vulnerável. E a música, se torna o artifício, com seus refrões estrategicamente criados para isso. Seus jingles têm como objetivo principal levar a uma ação: a compra. Eles criam desejos e passam falsos valores. São raras as propagandas que cantam efetivamente as qualidades do produto. Elas na verdade mais encantam...
Por outro lado, a presença da música e do canto nas diferentes práticas religiosas contemporâneas, se dá, por vezes, também de modo semelhante. Servem para alienar a pessoa, afastá-la de toda e qualquer ação coletiva e social, além de nublar a inteligência e de criar uma obediência acrítica. Nada fora dos propósitos da globalização pós-moderna. Exemplos evidentes do uso abusivo da música pela Religião na TV é o aparecimento midiático do Padre Marcelo Rossi e todo o crescimento dos cultos evangélicos televisivos, recheados de cantos. Verdadeiras aeoróbicas do Senhor, com seus hits religiosos, conduzindo a uma espiritualidade gospel alienante. São cantos fazendo com que o povo, mesmo diante de tantas injustiças e sofrimentos, fique quietinho no seu canto. Uma religiosidade das emoções que cresce na carona da TV e do canto.
Mas e a IECLB, como se comporta neste contexto?
O canto na IECLB
Orgulhamo-nos em destacar que os primeiros imigrantes luteranos alemães chegados ao Brasil há 187 anos trouxeram, entre seus poucos pertences, a Bíblia, o Catecismo, o Livro de Orações e o HINÁRIO. De lá para cá esta prática milenar tem deixado suas marcas também na IECLB (recomendo a leitura de Música e Igreja — reflexões contemporâneas para uma prática milenar de Werner Ewald (org.), Editora Sinodal/ IECLB, 2010). Sabemos dos esforços na tradução destes hinos, na edição de cancioneiros e hinários próprios (o HPD 1, em 1981 e o HPD 2 em 2001) e na compilação — em K7s, LPs e CDs - de nossas composições tupiniquins-luteranas. Além de Seminários, MUSISACRAs, FECs e FLMs (siglas de alguns festivais na IECLB). Tudo isso, fruto de mutirões locais ou ações isoladas, muitas vezes silenciosas e anônimas, mas todas Memórias Vivas (20 anos Seminário de Música em Rodeio 12, por Cladis Erzinger Steuernagel, Editora Otto Kuhr, 2010). Contudo, até hoje, enquanto IECLB, pelo que me consta, ainda não chegamos, pelo menos de forma significativa, com nosso canto na TV.
Enquanto escrevo este artigo (maio de 2011) — não coincidentemente — escuto, a recém lançada, RádioWebEST (http:/ /www.est.edu.br/radio_web/). Que alegria, emoção, orgulho e esperança! Temos tanto a compartilhar com o Brasil e o mundo do nosso canto. E podemos ser extremamente gratos a Deus que, como igreja e parte da Igreja de Cristo, não nos vendemos ao mercantilismo musical cristão-evangélico de nosso tempo. Mas continuamos primando por um canto paixão. Paixão como amor ardente, entusiasmado; Paixão como sofrimento, sacrifício; e Paixão como PAI-CHÃO = CANTO QUE CANTA POR TODOS OS CANTOS O AMOR DE DEUS FEITO GENTE EM CADA CANTO (CONTEXTO) DE NOSSA VIDA (parafraseando fundamentação do PAMI da IECLB). Um canto cruzcêntrico: loucura para uns, poder de Deus para nós... (1 Co 1. 23-24). Que talvez, bem por isso, ainda não alcançou, nem che-gou perto da telinha.
Culto sem canto: que desencanto! Mas que canto?
Quando de meu mestrado em teologia no IEPG da EST (97-99), dissertei sobre O canto como recurso na educação cristã de infanto-juvenis. Ali, propus (e efetivamente apliquei em 7 Cancioneiros) a CRUZ como critério de análise, seleção e avaliação do conteúdo, da letra, do que cantamos com este público. Porque, então, não usá-la também como critério de análise do que cantamos nos cultos, do conteúdo de nossos hinários, cancioneiros, pastas de coral, em fim, de todas estas tesselas deste multiforme mosaico sonoro (Werner Ewald, Música e Igreja, p. 175-192) da e na IECLB?!
Assim, concluindo, convido você a se engajar nesta tarefa de, com um instrumento concreto - a CRUZ - olhar e analisar o conteúdo do canto no culto na sua IECLB local. Refletir sobre o que (nós), ministros/as e musicistas, (estamos) estão pregando em nossos cultos luteranos, já que concordamos que A música é uma forma privilegiada de pregar a palavra de Deus. (Mauro Batista de Souza, Música e Igreja, p. 43). E que, culto sem canto seria um desencanto.
A CRUZ nos oferece, por um lado, uma ênfase teológica - pilar de nossa teologia luterana — e por outro, uma ênfase visual, simbólica. A Cruz, como critério de análise do conteúdo do canto no culto, tem duas partes — a vertical e a horizontal. À perspectiva vertical, podem ser identificados os cantos relacionados a temas que tratam do amor de Deus e a Deus. À perspectiva horizontal, os cantos relacionados a temas que tratam do amor ao próximo. No braço vertical da cruz, que ilustra a relação de Deus para com a pessoa/o mundo/a sociedade em geral, enquadramos os cantos que fazem referência à história de Deus com o ser humano e vice-versa, do ser humano a Deus, incluindo a glória e o louvor. No braço horizontal, que ilustra a relação dos seres humanos entre si, se enquadram os cantos que fazem referência à relação pessoa-pessoa. São aqui considerados os cantos que fazem menção ao irmão, à irmã, à igreja, à comunidade, à comunhão, ao amigo, à amiga, ao próximo, à natureza, à sociedade e suas muitas relações. Desta forma passaremos a identificar se o canto cantado no culto é um canto centrado na cruz ou desafinado com ela. Reconheceremos um hinário mais vertical, outro um tanto horizontal e preferiremos, quem sabe, aquele equilibradamente cruzcêntrico. Ajudaremos a especificar se o repertório de nosso coral ou grupo de canto tem tendências verticalistas, horizontalistas ou está equilibrado e firmado na CRUZ.
Buscaremos afinar o canto no culto pelas sete notas/figuras:
Deste modo estaremos cantando a Deus e testemunhando ao mundo a nova canção reclamada pelo salmista: Cantem uma nova canção a Deus, o Senhor (Sl 96.1a).
O autor é pastor da IECLB e atua em Curitiba/PR
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