Qual o maior desafio das pessoas hoje? Observando, ouvindo e acompanhando as pessoas ao meu redor, cheguei a uma resposta muito simples também: Viver. O maior desafio das pessoas hoje é viver. Muitos dirão que se trata de uma resposta banal. E é! Viver é o maior desafio da humanidade desde sempre. É possível até mesmo ampliar a formulação. Viver e permanecer vivendo é o maior desafio da humanidade e de toda a natureza. Nos cardumes com milhões de peixes que vêm à superfície de um rio poluído em busca de oxigênio momentos antes de morrer; nas famílias que, inseguras, se encerram atrás de grades, nas próprias casas, temendo a violência; nas pessoas enfermas que varam a madrugada nas filas de postos de saúde à espera da ficha para a imprescindível consulta médica; nas crianças e nos adultos que reviram a lixeira à frente de nossas casas atrás de restos; nos idosos que fazem exercícios e cuidam da alimentação em benefício de sua saúde; na pesquisadora que dedica a maior parte do seu tempo e o melhor de si para descobrir o medicamento que beneficiará tantas vítimas de doenças graves. Nessas pessoas, animais e circunstâncias temos somente alguns exemplos de que viver é o maior desafio. Lutero teve uma existência profundamente marcada por essa questão. O temor de perder a própria vida foi grande em sua juventude, a exemplo de muitos contemporâneos seus, a ponto de levá-lo ao mosteiro, dando as costas ao mundo, como tentativa de garantir a vida eterna. Sem encontrar consolo nos próprios esforços, em meio à angústia, tentação e aos conflitos de consciência, descobriu no evangelho que a vida pela qual tanto ansiava estava ali, diante dele, como dádiva graciosa de Deus. Descobriu a vida plena na justiça de Deus, não uma justiça produzida meritoriamente pelas pessoas, mas uma justiça obtida por Cristo em sua vida, morte na cruz e ressurreição e atribuída por Deus graciosamente por meio da fé: O justo viverá pela fé! O desafio de viver, a angústia, a tentação e os temores seguiram marcando a existência de Lutero. Mas agora tudo isso assume outra dimensão. A justiça de Cristo, tal qual luz brilhante, dissipa renovadamente as sombras e mantêm viva a esperança certa de vida plena. A justiça de Cristo, à qual a pessoa se agarra na fé, dá novo sentido ao viver. O que Lutero fez, disse e escreveu está impregnado dessa profunda experiência de fé, que pautou sua trajetória de teólogo, professor, pregador, cura d’almas e reformador da igreja e da sociedade. Talvez seja por isso que, há séculos, gerações de pessoas de diversas nacionalidades, línguas, culturas e tradições religiosas busquem em seus escritos inspiração para sua existência na fé em meio ao desafio de viver. As meditações a seguir correspondem a trechos selecionados de escritos de Lutero. Foram retirados de seu contexto maior, abreviados e adaptados para enfatizar uma determinada temática e adequar-se aos objetivos desta publicação. É importante ressalvar, porém, que, para uma compreensão plena do pensamento de Lutero, é imprescindível a leitura na íntegra do escrito. Ao pé da respectiva página, encontra-se apenas uma referência ao escrito de Lutero e na página 118 há a completa referência bibliográfica. Logo após cada palavra de Lutero, seguem breves reflexões. Ou seja, misturei minha água ao vinho de Lutero. Os objetivos de tais reflexões são acentuar determinado aspecto do que Lutero escreve, trazer alguma informação da circunstância histórica específica ou destacar algum vínculo possível com nossa época hoje, quase meio milênio posterior à do reformador. Que as meditações a seguir sejam um verdadeiro amparo a todos e todas, que a cada dia assumem esse, algumas vezes angustiante, mas, pela graça de Deus, muitas vezes maravilhoso desafio de viver.
Pastor Dr.Ricardo W. Rieth na apresentação do livro Martim Lutero – Discípulo, Testemunha, Reformados, Editora Sinodal