Relatório para Assembleia Sinodal – 24-26.06.2012
Introdução
“Afinal de contas, quem é Apolo? E quem é Paulo? Somos somente
servidores de Deus... De modo que não importa nem o que planta
nem o que rega, mas sim Deus, que dá o crescimento... Porque nós
somos companheiros de trabalho no serviço de Deus, e vocês são
o terreno no qual Deus faz o seu trabalho” (1 Co 3.5,7,9).
O apóstolo Paulo, na sua primeira carta aos Coríntios, deixa claro o lugar que as pessoas ocupam quando se trata de dar testemunho da sua fé. Em resumo ele diz que os cristãos são meros instrumentos para cuidar da lavoura de Deus. Dizendo de outra maneira, somos, ao mesmo tempo, a roça de Deus e os encarregados de cuidar desta roça. Pouco importa a tarefa que desempenhamos, importa fazê-lo com amor, confiando que Deus fará a lavoura crescer e frutificar no devido tempo.
Nesta perspectiva escrevo este primeiro relatório como P. Sinodal do Sínodo MT, depois de estar nesta função por cerca de 5 meses. Isto implica lembrar que ao longo das últimas décadas muitas pessoas, ministros/as, lideranças e membros, zelaram da lavoura de Deus neste sínodo. E este trabalho foi feito com dedicação e com carinho. E, se hoje nos reunimos aqui em Assembleia, é porque Deus é fiel e porque a sua promessa não se prende nem mesmo às nossas limitações.
De antemão, agradeço a Deus pela oportunidade de estar e servir, como ministro da IECLB, no Sínodo MT. Entendo que a minha e a nossa tarefa, como lideranças, é a de termos a humildade, a sensibilidade e a sabedoria para perceber aquilo que Deus espera de nós no tempo em que vivemos e no lugar onde ele nos coloca. Com este olhar compartilho o que tenho visto, vivido e refletido neste primeiro semestre de 2011.
1.1 – “Um gigante de oportunidades”
É assim que o governador Silval Barbosa enxerga o Estado do MT. A frase está afixada em locais públicos, por ex., no Aeroporto de Várzea Grande. Difícil saber tudo o que um político quer dizer com uma frase dessas. Seja como for, é muito importante que tenhamos um olhar positivo em relação às pessoas e ao lugar onde vivemos. Isto vale também para a igreja cristã. Declarar o amor pelo lugar e pelas pessoas é o primeiro passo para sermos uma Igreja Missionária. Esta declaração de amor impede que olhemos para o lugar onde estamos apenas como espaço para ganhar dinheiro, mas como chão sagrado porque é obra e dádiva do Criador.
É principalmente no Mato Grosso que estão as comunidades do nosso sínodo. Mas, estão também no Pará, em Goiás e no Mato Grosso do Sul. Conforme o último censo, o MT possui 3.035.122 habitantes, sendo o estado com o 3º maior crescimento populacional do país nos últimos 10 anos. Por outro lado, conforme dados de 2010, o Sínodo MT possui 8.331 membros. Sem considerar que parte destes ainda está em outros estados, constata-se que somos menos de 0,3% da população.
Não creio que este dado deva nos deixar com complexo de inferioridade. Importa mesmo o bom cuidado com a porção da lavoura que nos cabe, seja de que tamanho for. Aliás, se o estado do MT é um dos que mais cresce no Brasil em percentual, deveríamos nos dar conta que isto também representa oportunidade natural de crescimento da IECLB nesta área. Aliás, o asfaltamento da BR 163 no estado do Pará (até Santarém), ora em execução, coloca também para o Sínodo a necessidade de ter um olhar atento para os desafios de implementação e crescimento de comunidades naquela região. Some-se a isto a provável criação do Estado do Tapajós, cujo trâmite avança no Congresso Nacional, com definição de realização de plebiscito. Além do desafio de sermos igreja missionária ali onde já estamos enraizados, não podemos perder de vista esta nova perspectiva que se coloca.
Sobre o ‘gigante de oportunidades” referido pelo governador, cabe-nos olhá-lo na perspectiva da Paz na Criação de Deus – Lema da IECLB para este ano. A esperança e o compromisso nos dão, a um só tempo, a alegria e a responsabilidade de apreciarmos e agradecermos pelo generosidade de Deus nesta porção do Brasil - Terra amada da qual muitos tiram o sustento para a sua família para muitas pessoas de outros lugares do Brasil e do mundo; Terra maltratada, que geme sob o lixo urbano e com a contaminação do solo com nada menos que 50 litros de agrotóxicos por habitante por ano – incluindo contaminação do leite materno, conforme pesquisa da Universidade Federal do MT em Lucas do Rio Verde. O nosso coração agradecido é instigado pelo mandamento do amor ao próximo a sermos ousados e criativos para que aqueles que vem depois de nós, possam usufruir da criação, que não nos pertence, mas que está aos nossos cuidados. Lembro aqui que a transformação no modo de cuidarmos do meio ambiente inicia com pequenos gestos. Se não conseguimos começar com pequenas coisas, também as grandes continuarão sendo apenas um sonho.
1.2 – Paróquias, comunidades, lideranças, ministros/as
Coloquei para mim mesmo o desafio de fazer-me presente em todas as paróquias do sínodo ao longo deste ano. O propósito é de conhecer melhor a realidade, passo imprescindível para dar conta a contento da tarefa de P. Sinodal. A presença nas paróquias é um desafio em termos de organização de agenda, uma vez que há outras demandas a serem atendidas, incluindo participação em conferências ministeriais, programações setoriais, reuniões de nível nacional e questões de ordem interna (escritório) que precisam de encaminhamento.
Até aqui, nestes primeiros meses do ano, pude estar presente em cerca de 50% das paróquias do Sínodo, em várias delas por ocasião da instalação e/ou ordenação de novos ministros/as. Coloquei o propósito de que estas visitas não sejam apenas “visitas relâmpago”, mas que se tenha dois ou três dias à disposição, priorizando presença pastoral junto aos/às ministros/as e suas famílias, além da presença em atividades comunitárias: cultos, reuniões de Conselho Paroquial, diálogo com lideranças, etc. Já há uma série de visitas agendadas para os próximos meses e creio ser possível cumprir o desafio de estar em todas as paróquias até o final do ano. Naturalmente, o desejo expresso por alguns de uma presença em todas as comunidades do Sínodo somente poderá ser alcançado a médio prazo.
Aquilo que pude observar nas visitas feitas e nas participações em programações até aqui deixa-me muito animado. Aproveito aqui para agradecer pelo carinho com que fui recebido nas comunidades e nas casas de ministros/as e lideranças. Aliás, temos motivos para agradecer a Deus pela entrega e dedicação dos nossos ministros/as. O mesmo vale para as lideranças. A disposição em servir se sobrepõe em muito aos lamentos e ao negativismo. Também os ministros recém-chegados, passado o impacto de serem enviados para longe da sua “parentela”, mostram gratidão pela oportunidade de servir em um contexto diferente daquele que conheciam até aqui.
Vejo como muito positiva a migração interna de ministros/as em nosso sínodo. Se o primeiro envio por parte da IECLB não coloca muita opção de escolha, a posterior candidatura a um Campo de Atividade no Sínodo MT é declaração de amor a este lugar a sua gente. Entendo esta permanência de ministros/as em nosso meio como fundamental para fortalecer a identidade do sínodo e para ocasionar a saudável e necessária mistura entre a juventude e a experiência. Cabe interpretar esta permanência de ministros no Sínodo MT como sinal de que é bom estar aqui. Eis um desafio continuado para o P. Sinodal e para todos nós: ajudarmos para que este seja um lugar onde as pessoas gostem de estar – isto é chama missionária!
Ainda não tenho a clara dimensão dos trabalhos realizados em cada paróquia/comunidade nos diferentes segmentos: crianças, jovens, etc. No entanto, pude participar: de um encontro setorial de jovens em Sorriso, com expressiva participação; de um encontro setorial de famílias; da Assembleia Sinodal da OASE e de um trabalho específico com casais na Paróquia de Sinop. Todos estes encontros foram espaços de intensa comunhão, de trabalho conjunto entre ministros/as e lideranças – atividades das quais os participantes saem animados porque foram alimentadas em sua fé. Em alguns encontros não pude estar presente, como a “Semana da Criatividade” em Sinop, que prepara principalmente orientadores/as do Culto Infantil. Não por último, expresso a minha alegria pela implementação do Projeto de Capelania Hospitalar em Cuiabá. Mesmo com pouco tempo de atuação, os ecos recebidos dão conta do quanto este serviço pastoral/diaconal é importante. Não deveríamos nos cansar de agradecer a Deus por todos estes belos sinais de vida comunitária e de testemunho de fé.
3. Desafios
Para esta Assembleia as paróquias foram convidadas a responder algumas perguntas, cujas respostas servirão de diagnóstico daquilo que temos de precioso nas comunidades e no sínodo, além de refletir sobre as nossas lacunas e desafios. Pude fazer a leitura deste material, além de um levantamento similar feito junto aos/as ministros/as. Trata-se de um material riquíssimo e a minha oração é no sentido de que sejamos inspirados para ensaiar planejamento missionário, com ousadia e com os pés em nossa realidade. Para contribuir nesta reflexão, proponho-me a colocar alguns desafios que, do meu ponto de vista, merecem ser considerados.
3.1 – Planejamento missionário
Os dados mostram que no período de 18 meses, entre julho de 2010 e janeiro de 2012, mais da metade das paróquias do sínodo terá trocado de ministro/a. Ao lado disso, percebo que o planejamento missionário nas paróquias e comunidades dificilmente vai além do ano em curso. Se somarmos estes dois fatos não é difícil concluir o que isto representa em termos de perspectiva de edificação de comunidade. A nossa cultura de planejamento continua, em grande parte, atrelada a um plano de atividades anual. Não precisamos logo sentir culpa diante desta realidade, pois fazemos as coisas assim como aprendemos. Por outro lado, hoje temos a oportunidade de dar um passo adiante. O desenvolvimento de uma cultura de planejamento de médio e longo prazos é muito bem vinda. Para tanto, o Plano de Ação Missionária da IECLB – PAMI é instrumento especial e que está à nossa disposição. Cabe-nos o esforço para que o planejamento sinodal, a ser ensaiado nesta Assembleia, sirva de estímulo para o planejamento local. Pessoalmente não tenho dúvidas que o estabelecimento de um foco e de metas, com prazos e atribuições, ajuda, e muito, para sermos igreja de Jesus Cristo em nosso tempo.
3.2 – Diversidade teológica
O Sínodo Mato Grosso possui uma bela diversidade teológica. Isto pode ser percebido em acentos específicos dados por ministros/as e pela maneira diversa com que as comunidades expressam a sua fé. Em princípio, a diversidade de acentos teológicos enriquece o corpo de Cristo. Os relatórios de várias paróquias saúdam o respeito a esta diversidade como um dos aspectos preciosos do Sínodo MT. No geral, esta realidade também é visível entre os ministros/as.
Contudo, para assegurar a unidade do corpo, este assunto requer atenção continuada por parte de todos nós. Os sinais de alerta acendem quando alguém se considera melhor do que o outro ou quando achamos que já não temos a aprender com aquele que, em alguns aspectos, pensa diferente. Neste sentido, um dos assuntos que tem provocado tensão em algumas comunidades é o uso ou não de bebida alcoólica nas promoções. Não é possível entrar aqui neste assunto com mais profundidade. Tampouco ajuda simplesmente declarar-se a favor ou contra. Importa ponderar entre um simples legalismo e aquilo que contribui ou atrapalha o fortalecimento da comunidade.
3.3 – Formação de lideranças
Na Assembleia passada, quando da minha apresentação, sublinhei três pontos que na minha percepção são essenciais para sermos igreja de Jesus Cristo em nosso tempo: sacerdócio de todos, planejamento e aprendizado contínuo e conjunto.
As grandes distâncias do Sínodo MT impõem limitações para a realização de muitos encontros sinodais. Por outro lado, a necessidade de investir em formação de lideranças perpassa os relatórios das paróquias. Não dar conta desta lacuna compromete a visão luterana de ser igreja, onde todos servem com os seus dons. Entretanto, para que possam servir com os seus dons, as pessoas precisam ser preparadas. Isto significa investimento em formação. Como podemos superar as distâncias? Encontros setoriais ou agrupando paróquias próximas seriam uma alternativa!? Mesmo assim, de que tempo as pessoas dispõem para participar um encontro de formação!? Se, por outro lado, o encontro for muito breve, alcançará o seu objetivo?!
As perguntas acima somente podem ser respondidas em conjunto. Pessoalmente creio que há alternativas possíveis. Deus haverá de ajudar a encontrá-las e a nos comprometermos com a execução dos programas que definirmos.
4. Questões pessoais
A nossa mudança para Cuiabá veio acompanhada da convicção de que estávamos sendo chamados a servir com os nossos dons no Sínodo MT. Esta convicção é minha e também da Marise. Isto, porém, ainda não significa que a nossa vida e também uma mudança desta ordem ocorra sem sobressaltos. Os problemas de saúde do nosso filho mais novo (fato não relacionado à mudança) no início do ano mexeram profundamente conosco. Estivemos muito angustiados. Neste momento, o Cassiano está bem melhor, mesmo que continue sob cuidados médicos. Agradeço a compreensão de vocês, a solidariedade e as orações. Agora, nas últimas semanas, tive dengue, incluindo dois dias de internação. Ficar doente é tudo o que a gente não quer. Mas, também ali e, talvez, especialmente ali aprendemos a nos entregar por inteiro.
Um segundo aspecto diz respeito a acolhida que recebemos na Comunidade de Cuiabá e ao acompanhamento dado pela Diretoria do Sínodo. Aliás, tenho sentido as nossas reuniões como momentos de intensa comunhão. É gratificante ver a forma como os integrantes da diretoria do sínodo assumem as suas tarefas. Percebo que há comprometimento, diálogo, disponibilidade e apoio. O uso do skype tem permitido momentos de diálogo com o Presidente do Sínodo quase que diariamente. O que ajuda muito na busca por sintonia e no encaminhamento conjunto de diversos assuntos. Nesta fase de adaptação à realidade do Sínodo esta proximidade tem significado especial. Agradeço a Dimuht, Pastora Vice-Sinodal pelo apoio e pelas tarefas assumidas – um exemplo de responsabilidade! Agradeço a Ema pelo incansável apoio para a efetivação da permuta da Marise como professora entre o PR e o MT. Mesmo que seja um direito, esta permuta tornou-se a primeira para o estado do PR depois de 8 anos. Agradeço também a Creusa que, neste início de ano, teve a difícil tarefa de adaptar-se um novo P. Sinodal, com jeito diferente, com muitas perguntas e dúvidas. Obrigado pela paciência.
Agradeço a Marise, minha esposa, companheira fiel e corajosa. Ela tem sido suporte na minha presença e na minha ausência. Acima de tudo, agradeço a Deus que me carregou até aqui, concedendo, muitas vezes, tempos de paz, alegria e comunhão. Agradeço também pelos momentos de apreensão e inquietação. Com eles aprendo diariamente a deixar de lado a vaidade e a autossuficiência para reconhecer que em tudo e por todo o tempo dependo, única e exclusivamente da misericórdia e do amor de Deus.
5. Para concluir
No ano em que comemoramos os 20 da parceria entre o Kirchenkreis Syke-Hoya, cujos representantes estão conosco nesta Assembleia, concluo este relatório desejando que tenhamos uma Assembleia alegre e significativa sob todos os aspectos. Que Deus, que nos trouxe até aqui, nos conceda inspiração, sabedoria e ousadia na partilha e nos encaminhamentos que vierem a ser feitos. Confiemos na promessa contida na palavra do Antigo Testamento das Senhas Diárias para este dia: “Os olhos do Senhor passam por toda a terra, para mostrar-se forte para com aqueles cujo coração é totalmente dele” (2 Cr 16.9). Que os olhos Deus nos encontrem e que saiamos daqui fortalecidos.