Já estava tudo preparado, tanto a liturgia, quanto a prédica para o culto comunitário do final de semana. Em tal rodada de cultos celebraria cinco vezes a mesma liturgia e faria a mesma mensagem em cultos com Assembleias de Comunidade. Mas, na noite de sexta-feira, percebi que a mensagem precisava mudar.
O primeiro culto celebramos como havia organizado. Fui para o interior e celebrei com a Comunidade Cristo Redentor, na Linha P. 26, a comunidade mais distante da Paróquia. Nessa comunidade, em culto, refletimos sobre o texto de Hebreus 10. 11-25 que contrasta a antiga oferta sacrificial, que precisava ser constantemente repetida, e a oferta sacrificial de Cristo em nosso favor que é a aliança feita uma vez somente e válida para todo o sempre. Para tanto devemos permanecer fieis e congregantes na vida comunitária, visto que tanto mais se aproxima o Dia do Senhor (Hb 10.25).
Juntos, igualmente, lemos o Evangelho de Marcos 13. 1-13 no qual Jesus faz seu sermão profético acerca do fim deste tempo, o fim deste “mundo”. Em tal texto, Jesus alerta para que seus discípulos e discípulas não sejam enganados e ludibriados com falsos sinais. Guerras, mortes, tragédias, fome e peste não são o sinal do fim. Pelo contrário, testemunham simplesmente o princípio das dores. Segundo o Evangelho, para que chegue o fim “é necessário que primeiro o Evangelho seja pregado a todas as nações.” (Mc 13.10).
Tanto a Epístola aos Hebreus, quando o Evangelho de Marcos apontam que é fundamental viver a fé em Comunidade. Permanecer nas bases que alicerçam nossa esperança por uma realidade mais justa e fraterna. Por isso Jesus afirma: “aquele, porém, que perseverar até ao fim, esse será salvo.” (Mc 13.13b)
Com base nestes dois textos bíblicos, tendo em vista que os cinco (5) cultos que celebramos este final de semana são com Assembleias de Comunidade, a mensagem central do texto direciona os membros das comunidades a permanecer fieis no testemunho da fé, vivendo em comunidade e colocando seus dons (capacidades, habilidades e atitudes) em prol da proclamação do evangelho. Exercer cargos e funções na comunidade é um modo de prestar este testemunho de proclamação do evangelho.
Esta mensagem continua central e, com a graça de Deus, permanecerá nos ouvidos, mentes e corações das pessoas presentes nos cultos. Isso esperamos e que assim Deus nos conduza em paz e amor. Porém, um elemento precisa ser incrementado. Vamos voltar ao relato com o qual iniciei o texto:
Celebrei o primeiro culto da maneira como narrei anteriormente. Depois disto, ao retornar à cidade, sendo mais de 23 horas, fui comprar um lanche no centro. Enquanto esperava ficar pronto meu jantar, fiquei atordoado ao ver o boletim de notícias na rede televisiva. Naquela noite, na França, vários atentados (creio que nove) foram responsáveis por mais de 128 mortes, 250 feridos e toda uma comoção social. O mundo voltou os olhar para o terror contra a vida humana.
Ainda assustado, comecei a pesquisar pelo smartphone (G1, Folha, Uol, etc) mais informações acerca do triste e lamentável evento. Foi então que uma senhora se aproximou, olhou para a tela da TV, fitou-me com espanto e afirmou, com segurança: “Em nome de Jesus, realmente, está perto do fim.”
Meditando nas passagens bíblicas que estão previstas no lecionário dominical para esta semana, e conhecendo um pouco do testemunho evangélico, sou obrigado a discordar. Não! Não está perto do fim. Pelo contrário. Está muito longe do fim!
Caso estivesse perto do fim do mundo, então não teríamos mais guerras, nem atentados, nem crises, nem pestes, nem desastres, nem coisa alguma que nos faça viver com tanto horror diante da vida. Algo que precisamos compreender é que Deus não deseja fazer com o que o mundo sofra para que Cristo esteja entre nós.
Conforme o testemunho bíblico estes não são sinais do “fim do mundo”, mas do “princípio das dores”. Recordemos que o “fim do mundo” significa o “Reinado de Deus em Cristo”. Jesus e o mundo são duas potências antagônicas.
Jesus Cristo disse que seu Reino não é deste mundo (Jo 18.36). Para Jesus o planeta não precisa desaparecer. Ele não vai destruir a terra. Após o Dilúvio Deus fez uma aliança com a humanidade, afirmando que jamais iria novamente mandar tal destruição (Gn 9.9-17). O que, sim, precisa desaparecer é o “mundo”, isto é, esta realidade maldosa, pecaminosa, violenta, cruel e desumana na qual estamos inseridos e com a qual nos contaminamos constantemente por meio do pecado que avilta nossa dignidade.
Jesus afirmou que nós estamos neste mundo (nesta triste realidade), mas nós não somos deste mundo, não pertencemos a esta realidade. Jesus nos resgatou para uma nova realidade de vida (Jo 15.18-19). Para tanto precisamos afiançar nossa labuta diária contra o pecado, afirmando-nos na graça misericordiosa do Todo-Poderoso, pois só Ele pode nos redimir. Por isso Jesus nos assegurou: “No mundo passais por aflições; mas tende bom ânimo, eu venci o mundo.” (Jo 16.33).
Com base nisto, olho para a triste realidade dos atentados terroristas ocorridos na França; igualmente, volto meu olhar para a desoladora situação das pessoas que vivem no entorno das barragens de Mariana, em Minas Gerais, vítimas da imprudência e da má gestão com o meio ambiente. Também abro os olhos para as pessoas que sofrem violência e desrespeito diariamente em vários âmbitos do Brasil e do mundo. Assim, percebo que, realmente, não estamos perto do “fim do mundo”. Pelo contrário, o mundo está poderoso e dominador. Nós estamos deixando o mundo nos dominar, quando na verdade deveríamos deixar que Cristo e seu Reinado exercessem a Glória, a força e o poder (Rm 11.36).
Parece que ainda não aprendemos que é necessário que o mundo perca o poder e Jesus possa reinar. Foi João Batista quem afirmou: “Convém que Ele cresça e que eu diminua.” (Jo 3.30). Paulo nos ensinou que para o mundo deixe de nos dominar, a vida e tudo sejam de Deus é necessário que eu não mais tenhamos poder, mas sim Cristo (Gl 2.20).
Como isso vai acontecer? Deixando Marcos 13.10 ser implementado em nossa realidade: “é necessário que primeiro o Evangelho seja pregado a todas as nações.” E, para isto ser uma realidade não podemos abdicar da vida comunitária da fé, como nos orienta o autor da Carta aos Hebreus, ao afirmar “Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais vedes que o Dia se aproxima (Hb 10.25).
Inspirados pelo Evangelho de Cristo, indignados com a dura e cruel realidade que presenciamos, “Não vos conformeis com este ‘mundo’, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.” (Rm 12.2).
Marcelo Peter
Pastor em Alta Floresta-RO
Sínodo da Amazônia-IECLB