Lembra-se da parábola de Jesus sobre o semeador? Sementes caíram em terra boa, na estrada, em meio às pedras e no espinheiro. Esta palavra de Jesus ainda hoje ajuda na leitura da vida de fé em comunidade. Ganhamos a dádiva do amor de Deus, a ação salvadora de Jesus nos foi dada. Mas esse tesouro está sempre ameaçado pelo espinheiro, pelas pedras, pela poeira do caminho quotidiano. Há pouco espaço para a manifestação dos sinais do reino de Deus.
Esta mesma palavra me inspira partilhar sentimentos e avaliações sobre as manifestações de rua nas grandes e médias cidades brasileiras. Jovens de classe média, estudantes, profissionais da educação, da comunicação e das artes, dentre muitos outros, arriscaram sistematizar descontentamentos e pautar reivindicações. A tarifa do transporte público em São Paulo foi a gota d água que faltava para desencadear a mobilização de rua. Os trabalhadores e trabalhadoras recebem o vale transporte, os idosos são isentos, mas, e os outros?: “Vem você também pra rua”... A mensagem era legítima. Mas, não tinha espaço para ela. As ruas estavam cheias, os espaços das praças não emitiam “eco”. Onde gritar? “Vem você também pra rua”...
Aquela manifestação pequena foi atacada. Chegou a violência: balas de borracha, pimenta depois vinagre, bombas de gás e truculências. De carona chegaram outras manifestações violentas: aquelas dos extremistas e iniciantes do crime, agentes do quebra-quebra; os ideólogos (extremamente perigosos) de segmentos dos aparelhos e sistemas da comunicação com a sutil linguagem da desestabilização política, econômica, social, usufruindo-se do método da fragmentação das informações; outros guardiões de causas vencidas tentaram hastear suas bandeiras. O descontentamento de uns absorveram a de muitos outros em todas as regiões do Brasil. A causa pequena tornou-se mensagem grande: corrupção, qualidade dos serviços de saúde, custeio da educação... Reforma do sistema de representação e gestão política do País... Um cenário novo e contundente surge de forma inesperada. “Vem você também pra rua”... A mensagem chega codificada. Ninguém consegue ler com segurança. Parece que não há bandeiras e causas definidas... Primeiro o silêncio. Os apressados queimaram bobagens. Governantes tentaram lavar as mãos, outros recuaram.
Nesta semana o cenário e sua mensagem estão ganhando novos contornos. As sementes estão em movimento, deslocando-se da rua, onde há muita poeira, pouco espaço, pressões, insegurança. Passam a fazer agenda nos diferentes espaços da gestão pública. A pauta mudou. Até São João foi esquecido!
Estamos no momento do medo, da passagem das estações – do inverno para a primavera – vem tempestade, ventania ou flores, nova vida? Para onde seguirá a mensagem semente? Esperamos que passe longe do espinheiro, que não se perca em meio às pedras, que encontre terra boa. Que não seja adulterada ou substituída por outra. Que os lobos mascarados de cordeiros sejam afogados pelo espinheiro. Esperamos sinais de paz, justiça e de graça.