O BICHO
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa
Não examinava, nem cheirava
Engolia com voracidade.
O bicho não era cão
Não gato
Não era rato. O bicho, meu Deus, era um homem!
Manuel Bandeira
A poesia de Manuel Bandeira retrata a realidade de milhares e milhares de pessoas. Em todas as cidades e em todas as praças nos deparamos com a triste cena de pobreza e miséria. Em pleno século XXI, ainda há pessoas que em praças ou lixões disputam o pão de cada dia com ratos, gatos, cachorros e urubus. Um mundo que prega o progresso e o desenvolvimento amarga em seu meio pessoas que vivem em condições semelhantes a animais. São nas praças ou nos lixões, cartões postais das cidades, que encontramos o lucro do desenvolvimento deste século: imagens tristes, lamentáveis, mas infelizmente, reais: homem e bicho partilhando o mesmo resto.
Será que nos transformamos em bichos? Somente um bicho não se importa com a situação degradante de seu semelhante. Apenas um animal é capaz de ver um dos seus dividindo o prato do dia com os urubus. Vemos isto!? Não, somos cegos! Somos bichos!? Certo é que o poeta não está distante da realidade quando confundiu um homem com um bicho. Pelo contrário, está bem próximo de nosso cotidiano, pois tais cenas se repetem diariamente ao nosso redor. São pessoas, reais, famintas, filhas de Deus que catam comida entre os detritos e quando encontram, não examinam, nem cheiram, mas engolem com voracidade.
A barriga vazia é uma doença sentida na pele por milhões de pessoas. A indiferença é a doença- irmã que não quer ser curada. A tristeza é saber que ela tem cura, mas porque saná-la? Afinal, apenas a primeira mata. Jesus certo dia encontrou uma multidão faminta (Mateus 14.13-21). Enquanto os discípulos sugeriram mandar embora com fome aquelas pessoas, Ele, Jesus, enfatizou: “Dêem vocês mesmos comida a eles”. (v. 16). Com pães e peixes colhidos entre os presentes, nos ensinou o milagre da partilha. Ele não as deixou ir com fome, mas as saciou.
O que falta para nós saciarmos os famintos de hoje? O milagre da partilha. O remédio está gratuitamente à disposição de todos; Jesus o pagou com sua própria vida. Vamos usá-lo? Só ele é capaz de apagar a triste imagem que o poeta insiste em nos revelar: a falta de amor.
P. Edilson Tetzner – Pastor da IECLB em Guarulhos/SP