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ID: 18

Protestantes, independência e liberdades

09/09/2009

“Pois o Ano da Libertação é sagrado para o povo” (Lv 25.12a)

Um dos nomes dados para os herdeiros da reforma, liderada por Lutero, entre outros, foi o de Protestantes. A expressão surge por causa do protesto dos príncipes governantes perante o Imperador Carlos V que buscava a unidade política pela unidade da fé cristã, segundo o rito romano. A partir desse momento o termo protestante foi vinculado à luta pelas liberdades essenciais para uma cidadania fundamentada na consciência iluminada pelas palavras de Deus. Mais tarde, essas liberdades serão complementadas pelos movimentos de independência e de criação das repúblicas, na Europa e nas Américas.

Contudo, esse núcleo do protestantismo já tinha sido manifestado por Lutero em 1521, em Worms, no discurso perante o mesmo Imperador Carlos V, que esperava escutar dele uma retratação. Nele, Lutero diz: “Minha consciência está presa nas palavras de Deus, não posso nem quero retratar-me de nada, porque agir contra a consciência não é prudente nem íntegro”. Desde então, em parte, o protestantismo ficou configurado como: resistência, protesto e proposta.

Agora, buscando vincular a herança protestante com a data cívica da Independência do Brasil, perguntamos: Será que o protestantismo no Brasil, na sua dimensão de resistência, protesto e proposta, acabou na Independência em 1822? Será que as liberdades conquistadas desde a Independência - passando pela Proclamação da República em 1889 - até hoje tornaram o protestantismo caduco? Será que os protestantes devem ser considerados peças de museu?

Lamentavelmente o trabalho pelas liberdades fundamentais ainda não acabou. Constantemente há novas situações que exigem novas liberdades a serem alcançadas. E há circunstâncias que ameaçam as liberdades já conquistadas. Como exemplo, podemos mencionar:

1 - O protestantismo precisa lutar a favor da liberdade diante das novas formas de opressão religiosa que vêm explorando as pessoas, enriquecendo e fortalecendo estruturas e organizações religiosas perversas. Nesses grupos religiosos, a fé da pessoa passou a ser medida pelos bens e a bênção de Deus é vendida. De maneira que a graça de Deus (o amor de Deus que perdoa e restaura) já não é de graça, custando à pessoa aflita e necessitada seus recursos e até a vida.

2 - O protestantismo necessita levantar a voz para alertar sobre a presente ameaça à separação da Igreja (religião) – do Estado, fundamento para um Estado Laico e Moderno. A violência a este princípio vem sendo realizada mediante vários atos. Um deles teve lugar nesta quarta-feira, dia 26 de agosto, no Plenário da Câmara de Deputados. Nele foi aprovado o Projeto de Decreto Legislativo 1736/09, acordo entre o Brasil e a Santa Sé, relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, chamado comumente de Concordata, e o Projeto de Lei 5598/09, dos evangélicos, que busca regulamentar o livre exercício de crença e cultos religiosos, chamado também de Lei Geral das Religiões.

3 – O protestantismo se encontra compelido a reafirmar que a liberdade religiosa faz parte dos fundamentos de todas as liberdades cidadãs. Toda vez que o Estado interfere nesse âmbito, seja para regular a prática e/ou conteúdo da fé, individual e institucionalizada, além das normas do convívio social estabelecidas nas leis, ou então para oferecer garantias, se trata de um intervencionismo que fere a liberdade cidadã e lesa a liberdade religiosa. Por isso, os projetos antes mencionados não podem ser legitimados sob o argumento de regulamentação do direito constitucional da liberdade religiosa.

4 – O protestantismo, defensor da liberdade de consciência, não pode permitir que a pluralidade cultural e religiosa do Brasil seja tolhida pelo falso cenário de polarização das forças religiosas, sugerido pelos projetos, antes mencionados, e que lutam pelo poder e controle religioso no âmbito social. O protestantismo entende que a diversidade religiosa só existe na sua máxima expressão de liberdade se o principio do Estado Laico, como onerosa tradição democrática do Brasil, é mantido.

5 – O protestantismo, defensor da liberdade de consciência, necessita acompanhar e/ou propiciar as discussões sobre bioética, saúde pública, planejamento familiar, gênero e meio ambiente, entre tantos outros temas, a fim de alcançar uma legislação que conserve a tensão entre a responsabilidade individual e coletiva que proteja as pessoas e a sociedade por meio das instâncias competentes.

6 – Para o protestantismo a liberdade de consciência não é fundamento para a liberdade irresponsável e muito menos para o convívio na indiferença. Liberdade de consciência significa voz profética, voz que não permite à pessoa se tornar refém de projetos que contrariem a consciência. Em virtude disso, o Protestantismo não pode silenciar perante as diversas situações de corrupção que dilaceram o tecido e o convívio social. Ele deveria ser o primeiro a exigir a verdade, a justiça e a honestidade, bases para a paz cidadã.

Enfim, para o protestantismo vir a ser, ou não, peça de museu, vai depender dos próprios protestantes. Você e eu, que desfrutamos das liberdades alcançadas pelos nossos antepassados temos um árduo caminho a ser percorrido. Que o Santo Espírito de Deus ilumine a nossa consciência com as palavras de Deus para podermos agir com discernimento, para que aquela Independência, iniciada em 1822, possa se tornar mais plena, alcançando os diversos cantos da nossa sociedade.

Pastor Pedro Puentes Reyes
Paróquia Ev. Lut. no Vale do Paraíba - SP


Autor(a): Pedro Puentes Reyes
Âmbito: IECLB / Sinodo: Sudeste
Área: Missão / Nível: Missão - Sociedade
Natureza do Texto: Artigo
ID: 6872

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