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ID: 18

O Natal e a escolha dos presentes

Meditação

04/01/2010

Na época de Natal, as pessoas deparam-se com a necessidade ou com o desejo de presentear amigos e familiares. Quando se trata de desejo, tudo é mais fácil: procurar, selecionar e comprar. Às vezes o desejo não cabe no bolso e é preciso conformar-se em dar menos.

Os presentes são símbolos de carinho desde sempre. Estão na história do Natal, pelas mãos dos Reis Magos que vieram de muito longe, trazendo ouro, incenso e mirra para o Menino Jesus. Não há, portanto, porque condená-los, dizendo que não fazem parte do espírito natalino cristão.

O presente não precisa ser caro. Mas também não precisa ser necessariamente barato, se quem dá vive uma situação segura e confortável. Por que não caprichar e dar algo realmente bom? O “bom presente” é uma forma de demonstrar reconhecimento e afeição. Afinal, não se escolhe o preço, e sim o presente. Eu gosto? O presenteado vai gostar? Está dentro do meu orçamento? Então não importa o preço, e sim a vontade de agradar. Só não vale endividar-se além da conta para satisfazer desejos – próprios ou dos outros - maiores do que o orçamento efetivamente permita.

O presente não precisa ser grande. Mas também não precisa ser necessariamente pequeno, pois para a questão do tamanho, vale raciocínio análogo. Não se escolhe o tamanho, e sim o conteúdo. Às vezes o tamanho conta, porque quem presenteia quer ver um certo brilho no olhar, principalmente se o presenteado for uma criança.

Muitas vezes o presente é escolhido em função da reação que se pretende ver na face de quem recebe: sorriso, risada, surpresa, enternecimento... até desnudamento – há presentes que revelam o desejo de ver o que não se mostra por aí... Enfim, o que se dá de presente, revela muito mais da personalidade de quem dá do que daquele que recebe.

O presente revela a bem-querença... ou a mal-querença, ou até a indiferença. Há os que definitivamente não gostam de presentear. Gastar para outros aquilo que poderíamos gastar ou guardar para nós mesmos? A saída é buscar o mais barato, pois quem dá não está nem aí para quem vai receber. Revela-se aí a indiferença. O verdadeiro valor do presente para quem deu é o que se deixou de gastar, o que se poupou. Cumpre-se a obrigação social e economiza-se para si mesmo.

Há os que curtem fazer compras. Para quem tem orçamento folgado e tempo pode ser um lazer e tanto. Essas pessoas divertem-se escolhendo, pesquisamendo, comprando. Curtem ir às compras, participar do movimento, tomar café no shopping e antever a alegria de quem vai receber o presente. A antevisão da alegria do outro faz parte da diversão.

Há os que usam a inteligência e a sensibilidade para ser originais. Neste caso, quando a alma de quem presenteia e de quem é presenteado estão em sintonia o resultado é o melhor possível. Revelam-se sentimentos compartilhados e acontece a verdadeira confraternização!

Uma forma de agradar é perguntar antes o que o outro quer ganhar. O acerto é mais garantido, mas não há surpresa, a menos que se consiga ser sutil na pergunta, e não se deixe o outro perceber onde se quer chegar. Difícil, nesta época do ano!

A excursão às compras pode ser compartilhada entre quem presenteia e quem recebe. Anula-se o fator surpresa, mas explora-se a cumplicidade. Nada mais gratificante do que experimentar um vestido e ver o brilho nos olhos do companheiro, dizendo “você fica linda nele. Será o meu presente de Natal para você”.

Há pessoas muito generosas. Compram mais para os outros do que para si mesmas. Custo a entender. Acho que não sou tão generosa. Mas essas pessoas existem sim: são felizes por dar, no mínimo tanto quanto por receber.

Há pessoas que foram agraciadas com criatividade e dons, de forma que podem oferecer presentes feitos por elas mesmas. Algumas dão com alegria. Mas há também, as que sofrem profundamente se percebem que o produto de sua habilidade não fez o sucesso esperado. Preferem não dar para não padecer da mágoa do artista não reconhecido. Van Gogh, que foi um mestre da arte, também não foi reconhecido em sua época e morreu pobre sem vender nada. O artista precisa conviver com o olhar nem sempre aprovador sobre sua arte. Até para rimar... faz parte!

Há os práticos. Compram presentes como quem vai ao supermercado fazer a compras do mês. Lista na mão e objetos óbvios ao alcance dos olhos. Criatividade zero. Praticidade, indiferença, falta absolutra de tempo. Talvez de tudo um pouco.

Fico pensando que presentear é uma arte. É doar tempo, acender a imaginação, deixar de preocupar-se consigo mesmo para preocupar-se com os outros. Procurar satisfazer expectativas, caprichos alheios e lidar ao mesmo tempo com dinheiro e com afeto. Coisa, no mínimo, “cabulosa”, como dizia meu padrinho. Coisa até perigosa, pois desta lida pode-se sair ferido e ferir, tanto quanto compreendido, reconhecido e amado.

Se partirmos do pressuposto que não conhecemos, de fato, o desejo dos outros e nem o nosso (Freud explica isso), talvez uma boa medida seja mesmo pensar em nós próprios e não no outro, tendo em mente que o presente revela, afinal, muito mais a face de quem dá do que a de quem recebe. Que face queremos mostrar aos nossos familiares e amigos?

Que a face do nosso presente seja até onde saibamos, a nossa face para o presenteado. Que o presente revele o nosso sentimento e o nosso desejo, mas que seja um desejo e um sentimento bom. Talvez não consigamos acertar totalmente. Mas, pelo menos, que o presente diga aquilo que diz o nosso coração e que o nosso coração diga somente coisas boas!

Há também uma sabedoria para receber. Talvez o presente não nos agrade de imediato, mas ele nos abre a perspectiva do novo, da mudança de hábitos, de gostos, de possibilidades. Uma vez ganhei uma malha preta de minha filha que eu jamais teria comprado para mim. Pois foi um dos melhores presentes que já recebi. Usei muito e todo mundo me dizia que eu ficava bem de preto! Assim pode ser com o livro que eu não compraria (e que, justamente por isso vai me ajudar a ampliar meu pensamento e minha compreensão), com a louça que foge ao meu estilo, com o creme para o corpo que me induz a um auto-cuidado que normalmente eu não tenho. Enfim, depois do Natal, vem o Ano Novo, tempo de descobrir o novo dentro de nós, como sabiamente poetizou o Carlos Drumont de Andrade.

Uma idéia para o Ano Novo talvez seja aperfeiçoar-se na arte de receber e de presentear, para que o nosso presente diga, de coração, “Te desejo um Feliz Natal!”. Ainda que não seja do agrado do outro, mas que reflita sempre bem-querença, respeito, sinceridade – a melhor face de nós mesmos!

Cristina Boog - Membro da IECLB na Comunidade em Valinhos/SP

 


Autor(a): Cristina Boog
Âmbito: IECLB / Sinodo: Sudeste
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo do Natal
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Meditação
ID: 7416

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