“Não tenham medo! Sei que vocês estão procurando Jesus, que foi crucificado, mas ele não está aqui... venham ver o lugar onde ele foi posto!” Mateus 28,5-6
Desconfio!
Vocês que hoje aqui estão, não vieram em primeiro lugar em busca da ressurreição ou da vida eterna. O que mais nos afeta, num primeiro momento, não é o fato de vivermos e depois morrermos. Um jogo que termina no zero a zero.
O que mais nos atinge são as situações em que ‘faltou vida’ pra que o jogo pudesse, pelo menos, terminar no zero a zero. Isto sim nos incomoda.
Herbert Marcuse, filósofo europeu, constatou: - Existem duas formas de morrer:
1. Morrer por um motivo natural. Isto nós aceitamos com certa naturalidade.
2. O segundo tipo de morte é mais complicado: quando morremos sem que nossos filhos/as tenham um futuro assegurado. Esta morte é muito dura para um pai, para uma mãe.
Podemos ir além:
Quando pessoas se lançam ou são lançadas em dívidas que vão além das condições objetivas para poder pagá-las. Temos o exemplo atual dos que estão perdendo suas casas nos EUA e Inglaterra. São tiradas de suas casas, alugam uma casa menor, e ainda continuam com dívidas que não conseguirão pagar. No Brasil tivemos algo parecido por ocasião das indenizações dos agricultores que perderam suas terras em função do formação do lago de Itaipu. O volor dos empréstimos contraidos nos bancos para o custeio da lavoura, em muitos casos, eram superiores ao das indenizações efetivamente recebidas. Foram lançados para o outro lado, deixaram de ser brasileiros. Não são paraguaios. Hoje são ‘brasilguaios’. Tiveram que abrir mão de sua cidadania.
Casos em que a extensão de uma vida não é mais suficiente. ‘Falta vida’ para saldar a dívida.
Podemos aprofundar ainda mais a questão:
Um senhor pobre, que morava nas imediações do Programa Comunitário da Reconciliação, faleceu. A família recebia ajuda regular. Seu sepultamento, o caixão, as flores, tudo foi muito digno. Chamou atenção. Mais tarde soubemos que havia doado partes do seu corpo. ( Observação! Não somos contra a doação de órgãos. ) Queremos ressaltar apenas o seguinte: o sepultamento digno foi viabilizado mediante um certo ‘pedágio’ pago com partes de seu corpo.
Fico até constrangido em abordar a questão neste contexto. Este fato, no entanto, aponta para aspectos da nossa realidade em que a cobrança que sobrevém não só lesa os contornos da vida, mas também, a própria circunscrição da morte.
Quantos processos judiciais vão muito além da vida e da morto dos implicados? Nestes casos não há mais reparação possível. Resta o silêncio, as pilhas de documentos empoeirados e a vergonha. E os processos que se avolumam continuam presentes! Não há reparação de fato.
Jesus também foi lesado! Justamente ele padeceu e sucumbiu sob o peso de uma enorme cobrança. Ela lesou a sua vida e a sua morte.
Deus quebrou o silêncio. Deus interveio.
Por que Deus intervém?
Porque as cobranças aqui na Terra extrapolaram os limites dos túmulos que deveriam demarcar, com dignidade, a morte de uma pessoa.
Ressurreição representa uma grande e abrangente anistia geral e ilimitada!
Ninguém mais vai, aos olhos de Deus, viver e morrer lesado, ferido ou prejudicado física e ou, moralmente.
O túmulo vazio representa um ‘espaço livre’, um ‘espaço diplomático’ do céu. Neste espaço vazio as artimanhas e armadilhas da realidade nua e crua não encontram mais base legal ( sustentação ) para se apoiarem. Elas não pegam mais, não funcionam mais!
Quem foi ao túmulo, logo cedo, caiu no vazio?
Não!
Ao contrário, deparou-se com um estado de graça. Foi como se uma grande pedra tivesse sido tirado dos ombros, do coração e da mente...
Havia medo, sim! Havia espanto!
Mas, sobretudo, um grande alívio!
E, diferente do momento da execução, em que todos se afastaram com náuseas e em silêncio, elas agora se sentiam bem, com vontade... com uma imensa vontade de falar e contar o acontecido a quem quer que lhes cruzasse o caminho!
Alí onde só poderia haver um túmulo com restos mortais,
havia um vazio,
um espaço livre.
Quem se deparasse com ele, não seria engolido, ao contrário, devolvido...
Aquelas e aqueles que haviam programado a vida como uma eterna peregrinação ao túmulo, foram devolvidos à vida, a uma vida sob novas condições.
Que condições novas eram essas?
- As condições que levavam a um beco sem saída haviam sido desfeitas.
- A equação de pouca vida para muita morte não mais seria uma regra.
A realidade, tantas vezes perversa, não conseguiria mais cobrar a sua fatura.
Evento da páscoa: zona livre, zona franca... um ‘espaço diplomático’ no qual impera a soberania de Deus. O poder da ressurreição aqui na Terra!
A partir da páscoa existe a noção de um poder isento de cobrança. Um poder eterno, leal e bom... eternamente bom.
P. Hermann Wille - Pastor da IECLB em Santo Amaro, São Paulo/SP