“Eu vim ao mundo como luz para que quem crê em mim não fique na escuridão. Se alguém ouvir a minha mensagem e não a praticar, eu não o julgo. Pois eu vim para salvar o mundo e não para julgá-lo” (João 12 46-47).
Uma leitura das catástrofes, através da lente da solidariedade, indica fortes indícios de que pessoas e comunidades são condenadas. Verificamos que em algumas catástrofes a comoção em massa e a consequente solidariedade são maiores. As notícias sobre os eventos estendem-se a todos a versão e a visão, que rapidamente torna-se consenso, de que as vítimas foram inocentes. Igrejas, entidades, empresas, pessoas de várias culturas envolvem-se no movimento de solidariedade e de busca por amenizar o sofrimento. Já em outras catástrofes o impacto vem marcado por dúvidas. A notícia já chega marcada. Pergunta-se imediatamente sobre os “culpados”. Levantam de forma sutil dúvidas, e perguntam se as vítimas deveriam ou não estar ali à beira do Rio ou habitando lixões, morros e várzeas. Também se os habitantes das vilas e cidades inundadas pelos temporais do norte e nordeste merecem ajuda. Em dimensão global, o aprofundamento dessa leitura pode levar á loucura, ao ponto de perguntar se os habitantes na África, no Paquistão, na Palestina, no Iraque, no Irã, na Índia são ou não seres humanos.
O fato, no entanto, é que milhares de vítimas de catástrofes são absolvidas e outros milhares são suspeitos do merecimento da solidariedade, da graça. Mesmo após a reconciliação de Deus realizada na cruz, também os cristãos continuam condenando pessoas e comunidades, sem medo da cumplicidade com a indiferença, com a violência e com os mecanismos da morte.
As pessoas e comunidades cristãs, através dos relatos bíblicos e do exercício da fé, são admoestadas para não julgarem (1 Coríntios 5.12). São chamadas para viverem em comunhão com o Cristo de Deus, que veio trazer ao mundo a salvação e não a condenação (João 12.47). Porém todos estão expostos a condição humana que facilita a prática do julgamento, também a sedução e influencia dos valores fundamentalistas e absolutistas que inspiram o exercício da purificação e da condenação.
Se os indícios dessa leitura das catástrofes conferem resta-nos lamentar profundamente que pessoas e comunidades cristãs, que buscam comunhão com o Deus da vida, e de outras religiões façam acepção de pessoas, exercem a condenação das vítimas do sofrimento e de poderes e fenômenos naturais que matam.