Lema da Semana: Os discípulos de Emaús disseram um ao outro: Porventura, não nos ardia o coração, quando ele, pelo caminho, nos falava, quando nos expunha as Escrituras? (Lucas 24.32)
Como a Igreja pode ser relevante no acompanhamento às pessoas enlutadas?
Duas pessoas enlutadas estavam voltando para casa. Eram discípulas de Jesus. Percorriam a pé um trajeto de 11 Km entre Jerusalém e Emaús, uma pequena aldeia onde residiam. Carregavam consigo sentimentos de tristeza, frustração, culpa, medo e revolta. A razão de tamanhas dores era a terrível crucificação e morte do amigo e mestre, Jesus. Por causa dele, elas tinham se deslocado à Jerusalém na expectativa de presenciarem algo bem diferente: a sua exaltação como rei de Israel e não a sua humilhação como um criminoso numa cruz.
Não é difícil compreender a frustração e total desorientação destas duas pessoas, uma vez que a pessoa que amavam e seguiam foi cruelmente assassinada. Estavam, pois, completamente confusas e atordoadas. Planos, sonhos, esperanças foram interrompidos.
Em meio a esses muitos sentimentos que se misturavam, aconteceu algo inusitado: o próprio Jesus, o Ressurreto, aproximou-se e começou a caminhar com elas. Demonstrou compaixão ao querer saber sobre o que as inquietava; solidariedade ao escutar atentamente as suas aflições. Mas, os impactos da morte foram tão fortes, que elas não o reconheceram. Seus olhos estavam como que impedidos de ver.
Tentemos imaginar-nos no lugar delas: fomos num certo dia ao enterro de nosso melhor amigo, vimos tudo; em seguida, voltamos para casa tristes, mas três dias depois aparece alguém muito parecido com o nosso amigo. Logicamente iríamos dizer que não poderia ser ele, pois afinal o avistamos baixar morto na sepultura.
Mesmo assim, Jesus foi ouvindo-as pelo caminho, dialogando, e fazendo memória das Escrituras e fortalecendo-as na fé. Convidado para uma refeição, ele, agora sim, é reconhecido por elas no partir do pão. E imediatamente Jesus desapareceu. A alegria da ressurreição, então, tomou conta e a tristeza saiu de cena. E mais, entenderam que precisavam novamente se mover a caminho de Jerusalém a fim de anunciarem o que viram e ouviram.
Essa postura de Jesus compromete a Igreja com as pessoas enlutadas, em seus caminhos de dor e tristeza; a não apenas sepultar pessoas, mas em criar espaços de escuta para que familiares e amigos/as enlutados/as vivenciem e expressem à sua dor à sua maneira, sem julgamentos ou pressão para que retomem rapidamente sua rotina. Pensemos e articulemos, por exemplo, grupos para enlutados/as e redes de apoio em que se possa falar sobre a morte, que é encarada como um grande tabu em nossa sociedade.
Quando ocorre o luto, é comum que os sentimentos fiquem confusos como os de extrema tristeza, raiva, solidão, culpa etc. Diante dessa situação, todo o apoio da Igreja, dos familiares, dos amigos é importantíssimo para aliviar essa sensação de desamparo. Que nossas Comunidades e Instituições diaconais sejam espaços reais de partilha e de comunhão em que as pessoas enlutadas possam ser ouvidas, expressar a sua dor, chorar, dialogar, encontrar sentido, partilhar fraquezas e reconhecer potencialidades. Não as pressionemos jamais para que sejam “mais fortes”. Estejamos por perto. Sejamos companhia. Acolhamos pacientemente as reações extremas. Não usemos frases como “foi melhor assim” ou “esta foi a vontade de Deus”, pois são tentativas muito infelizes e rasas de se levar consolo.
Em suma, é dessa maneira que reafirmaremos a nossa fé na ressurreição em Cristo e poderemos ser ainda mais relevantes no acompanhamento às pessoas enlutadas, criando espaços comunitários de vida e redes de acolhimento e cuidado. Que Deus nos ajude. Amém.
Pastor vice-sinodal Alberi Neumann
Leia ainda o Boletim Sinodal na íntegra: https://mailchi.mp/159ec5a89d7d/boletim-semanal-snodo-sudeste-ieclb-n-861-23-a-29042023
