Amados irmãos, amadas irmãs,
Jesus se sente apertado, são muitas as pessoas que desejam ouvir suas palavras. Não houve outra maneira senão adentrar no simples barco de um pescador e fazer do barco um púlpito, o lugar de seu ensino.
Os discípulos, por sua vez, cansados e frustrados por lançarem redes por toda a noite e não pegarem nada param para ouvir o seu ensino, inclusive Pedro oferece seu barco. Mal sabiam eles que muito lhes iria acontecer naquele dia, fatos que mudaram suas vidas bem como toda a história. Este é o cenário onde nosso texto se encontra. Um cenário de barcos, barulho, o som das ondas do mar etc.
Mas, o que havia de tão especial neste Jesus para que tantas pessoas o seguissem até ali? O que havia de tão especial e novo em seu ensino? Quem realmente é Jesus e quem realmente são os pescadores? Que tipo de pessoas Jesus chama ao seu seguimento?
Podemos encontrar vários tipos de pessoas neste texto, vamos nos atentar para algumas delas.
1 PESSOAS SIMPLES
Encontramos no texto pessoas simples. Possivelmente muitas pessoas seguiam a Jesus, ricas e pobres. No evangelho, isso pode ser notado em várias passagens, como por exemplo, Lc 19.1-10 onde nos é relatada a história de Zaqueu, um publicano e rico. Porém, o texto lido refere-se a um tipo específico de pessoas: as simples. Estas pessoas são pescadores, trabalhadores braçais e pessoas que provavelmente não possuíam uma renda salarial muito alta. Tudo o que recebiam vinha da pesca, seus salários e o sustento familiar dependia disso.
Este tipo de pessoas m discriminadas em sua época, e como se diria hoje, são da classe social baixa. Lidar com o mar todos os dias não é tarefa fácil, é preciso preparar as redes, entrar no mar, com o detalhe de que não havia motores para os barcos nesta época, mas estes eram impulsionados a mão.
Porém, pescar não é tão fácil assim, pois se precisa esperar o que? Que um peixe morda a isca ou caia na rede. Às vezes “o mar não está para peixe” e o sustento das famílias dos pescadores acaba os preocupando, pois, se não pescam os peixes, não tem sustento para o lar. São pessoas com uma economia baixa, porém, que lutavam no seu dia a dia para o sustento familiar e para a administração da casa.
Jesus, ao contrário de muitos, não rejeitou os simples, mas é com eles que Jesus começa a sua história. Jesus não apanha apenas grandes e bem-sucedidos, mas justamente escolhe os que nunca eram escolhidos, aqueles que se encontravam a margem da sociedade. Jesus estava sempre ao lado daqueles que realmente necessitavam de seu auxílio: o povo que sofria.
Para os simples ele compartilha o seu ensino e a estes famintos fornece sua palavra. Não pede ele grandes altares ou púlpitos, porém, um barco basta para que possa ali anunciar sua mensagem, o simples barco de um pescador.
Jesus não faz exclusão, mas, todos são chamados a ouvir seu ensino e a segui-lo. Não importa o quanto o indivíduo tem e o que ela faz, todos são convidados a aceitar o seu convite, a se achegar a sua praia e ouvir aquilo que ele possui para dizer. Ele mesmo foi filho de um carpinteiro, não nasceu em uma família real com muitos bens, mas, em um simples rancho na cidade de Belém, de uma mulher simples e de um carpinteiro. Este Deus carpinteiro se compadece das dores dos que sofrem e da preocupação dos simples e estes simples também podem seguir a Jesus, também recebem o convite onde estão. Por nascer em um contexto simples Jesus compreende a verdadeira situação dos simples.
2 PESSOAS QUE EXPERIMENTARAM FRACASSOS
O mundo hoje é essencialmente religioso, porém, o próprio mundo não sabe disso. O sistema religioso se encontra impregnado no modelo de sociedade vivido na atualidade. Isto pode ser notado muito facilmente.
Escuta-se falar muito na atualidade de sucesso. As pessoas precisam “se dar” bem na vida, caso contrário, experimentarão o fracasso, a solidão e serão facilmente descartadas por não serem úteis. Salvação é céu hoje em dia não são mais no sentido da eternidade contada na Bíblia, mas chegar ao céu é subir na vida, ser bem-sucedido, ter um bom emprego e ser bem-visto pela sociedade. Inferno, por sua vez, é o fracasso. Quando o indivíduo não consegue alcançar seus objetivos ele é imerso no inferno social. Já não existe graça, não existe perdão. Chegar primeiro se tornou mais importante que chegar junto dos outros. O religioso está presente na sociedade mais do que podemos imaginar. As pessoas procuram vida eterna aqui e a medicina cada vez mais parece tentar dar esta esperança: aquela de matar a morte!
Quando Jesus termina a sua prédica, pede a Simão que retorne ao mar para a pesca. Simão, juntamente com os outros pescadores encontravam-se no abismo do fracasso. Haviam pescado toda a noite sem fisgar um peixe sequer. Sabiam eles que o trabalho fora em vão, poderiam estar cansados, mas ainda trabalhavam para compensar a perda que tiveram.
Jesus se compadece de tal situação, ele se importa com eles como um irmão. Não vê o fracasso que tiveram, mas vê trabalhadores frustrados e necessitados de ajuda. O Deus cristão não rejeita os fracassados da vida, mas os acompanha de perto. Aliás, isto é exatamente o que Deus faz conosco. Deus é Emanuel, o Deus conosco, sim, conosco em nossas aflições, prejuízos, angústias, frustrações, estresse e tudo mais que o ser humano caído possa sentir. Talvez não financeiramente ou socialmente, mas, somos também fracassados porque sempre pecamos e mesmo que tentemos não pecar, quando nos damos conta já estamos pecando. Mesmo em nossos pecados, o Pai amoroso se compadece de nós e envia seu Filho Jesus Cristo para morrer por nós e nos livrar de nossos pecados. Jesus assume o fracasso humano na cruz para que nós pudéssemos ser tornados justos. O justo sofre a condenação para que o condenado se torne justo. Jesus entra no barco da nossa vida, no barco fracassado e procura saciar o triste com sua misericórdia. Este Deus não exige méritos e obras humanas para que seja salvo, mas o acompanha justamente naquilo que deixa de fazer. Deus ama o ser humano por aquilo que é e também por aquilo que não é.
Porém, isto não significa permanecer no pecado. O ser humano é convidado ao arrependimento e conversão e Deus promete nova vida. É com fracassados e loucos que Deus quer fazer sua história, com aqueles que admitem seu fracasso dizendo que não podem se salvar sozinhos, mas que precisam de Jesus Cristo. Dietrich Bonhoeffer, pastor alemão morto na 2ª Guerra Mundial falou em “Graça Barata” que é o pecar consciente de que Deus perdoa, ou seja, pode-se pecar porque de qualquer forma o ser é perdoado. Isto é baratear a graça de Deus paga na cruz. Arrependimento significa fazer de tudo para não cometer mais o mesmo pecado, graça barata, porém, significa pedir perdão pelo pecado de amanhã.
Deus chama também os fracassados, eles não são rejeitados. Embora o modelo de sociedade atual se chame de democrático, evidencia-se que tem utilizado úteis e descartados inúteis. Mas, o ser humano é apenas aquilo que pode produzir? Não, o ser humano é um ser criado a imagem e semelhança de Deus, caído, porém, redimido em Jesus Cristo. Os descartados e fracassados também podem seguir a Jesus, mesmo que a vida não lhes pareça oferecer mais nada de bom. A estes, Jesus chama a tentar mais uma vez, a entrar no mar e pescar mais uma vez. Jesus as incentiva a não desistirem e nem se entregarem ao fracasso, mas, a lutarem por uma vida digna e melhor. Esta luta não se faz sozinho, mas, como já diz um ditado popular: a união faz a força. Cristãos unidos podem fazer a diferença, são chamados a ver os fracassados do mundo e falar-lhes de Jesus.
3 PESSOAS OBEDIENTES E ENGAJADAS
Embora o fracasso e o cansaço, os pescadores eram trabalhadores e decidem obedecer àquilo que Jesus os havia ordenado. Sabemos que a fé vem pela pregação e, com certeza, aqui já brotava a fé nos corações dos discípulos de modo que creem e obedecem às palavras que Jesus ordenara. Não olharam para o cansaço, para o mar, mas sim para a última esperança de ter ainda um bom proveito do trabalho naquele dia. A ordem de Jesus.
Não havia por que obedecer. Jesus era carpinteiro e não um pescador. O que um carpinteiro poderia saber sobre a pesca? Algo diferente acontece com Pedro que a partir da ordem dada por Jesus decide lançar as redes. Por que não tentar outra vez? Aliás, Pedro poderia saber quem é Jesus, pois, alguns versículos antes do nosso relato, a sogra de Pedro fora curada. Pedro sabe que existe algo de diferente neste Jesus que pode ser a única chance de levar alimento para casa naquele dia.
Jesus chama pessoas obedientes a sua voz. Ele deseja que os seres humanos o obedeçam, embora que o ser humano nem sempre consiga obedecer totalmente a Deus. Quando ele ordena algo, ele deseja que o ser humano cumpra conforme ele diz. Deus não ordena as coisas por ser arbitrário e Justo Juiz poderoso pronto a castigar o ser humano quando o ser humano não lhe obedece. Quando Deus fornece leis ao ser humano, deseja antes de tudo a boa organização da sociedade e é por isso que existem as leis, para que o mundo não se torne o caos, para impedir os roubos, furtos, adultérios e quantas outras coisas. A lei e a ordem de Deus são fornecidas em amor ao ser humano, para que possa viver bem sobre a terra.
Pela fé, advinda da pregação, somos todos convidados a obedecer a Jesus, deixar que ele conduza o barco de nossa vida, guie o nosso navegar sendo ele mesmo o Senhor. Quando ele chama, ele mesmo é quem conduz. Assim, Jesus quer pessoas obedientes ao sua ordem: tentamos mais uma vez e também ao seu chamado. Em meio ao fracasso, Jesus fala ao ser humano que este deve tentar mais uma vez, que não deve se deixar intimidar, mas, que deve lutar.
4 PECADORES E INDIGNOS
Nós merecemos a graça de Deus? Não. A partir do número elevado de peixes que pegaram ao ponto de terem de chamar outros barcos para ajudarem no recolhimento de todos aqueles peixes, Pedro sabe quem é Jesus e olhando para si mesmo, não tem dúvida, se reconhece como pecador. Pedro pede: Senhor, afasta-te de mim porque sou pecador. Em outras palavras, não sou eu digno de andar contigo, não porque sou simples, não por que fracassei, mas, afasta-te de mim por que sou pecador.
Pedro sabe de sua culpa, sabe que nada merece e que é pecador. Pedro entendeu que é indigno perante o seu Senhor. Ele não procura se auto justificar tentando mostrar uma imagem boa perante Jesus sendo ele pecador, mas, se reconhece como imerecido da graça e dos favores de Deus.
Ele se prostra aos pés de Jesus como exemplo de humilhação: aquele que está na sua frente é maior que ele. Sim, Deus e homem conversam dentro de um barco e de frente a Deus todo pecado aparece ao ser humano, todo pecado é revelado.
Jesus rejeitou a Pedro? Não, pelo contrário, Jesus é o Deus que desce ao mundo para resgatar o pecador de seus pecados e realizar por ele a obra da salvação. Não veio Jesus procurar entendidos na lei e exemplos a serem seguidos, pelo contrário, buscou aqueles que se reconheciam como pecadores, aliás, todos pecam, mas, nem todos admitem.
Jesus deve ter olhado a Pedro para lhe afirmar. Não tenha medo, pois estou te escolhendo para ser meu pescador. Mas que pesca? Homens. Assim, o Pedro simples, fracassado, obediente e pecador é chamado para auxiliar Jesus em seu ministério. Ele merecia? De forma alguma, assim como nós também não merecemos.
Quando arrastaram os barcos para a praia, largaram as redes e os barcos e seguiram a Jesus, este que convidou indignos ao seu seguimento. Agora já não há mais preocupação com o sustento da família e já não há mais frustração quanto ao trabalho, mas, entregam-se completamente ao seu Senhor que não possui casa nem cama, mas que ganha seu sustento na rua. Os pescadores largam tudo para seguir um mendigo e era exatamente isto que Jesus foi, um mendigo a andar pelas ruas, esperar que as pessoas lhe dessem o que comer e beber de forma a anunciar a eles a mensagem do reino de Deus. Nos quadros, é fácil vermos a imagem de um Jesus limpinho, assim também nas imagens acerca da crucificação, porém, Jesus andava pelas ruas e por ser humano possuía tais necessidades também. Deus se faz mendigo e se faz homem simples para resgatar o ser humano pecador, indigno e fracassado de seus fracassos, indignação e pecados.
Amados irmãos, amadas irmãs,
Deus não está alheio ao pecador, não está longe e indiferente ao ser humano na sua condição de pecador e fraco, mas, é justamente com estes que Deus começa a sua história e são justamente estes simples que mais tarde escrevem o que viram para que tenhamos isto hoje em mãos.
O chamado de Jesus não olha o pecador, mas olha o pescador, o simples e necessitado, o considerado inútil e pobre. Com estes é Jesus inicia seu ministério. Por serem humanos, os discípulos por muitas vezes passaram medos e angústias, mas, não deixaram de seguir a Jesus, apenas Judas se afastou.
Estes que eram considerados pobres e indignos mais tarde defenderam o evangelho com força e se engajaram em levar a mensagem de Jesus aos povos ao seu redor. São estes mesmos que edificaram as igrejas, escreveram cartas e que hoje são lembrados por todos nós.
Nós também somos chamados. Não somos dignos, mas, somos também pecadores e possuímos nossas dores e tristezas diárias, porém, saiba que Deus olha pra ti e se compadece, quer fazer de ti um seguidor seu para proclamar sua palavra. Jesus te convida na situação exata em que você se encontra e quer estar ao seu lado para continuar a sua história. Jesus te convida a segui-lo, aliás, ele já fez tudo por ti, a graça é de graça. Que Deus em seu Espírito Santo te conduza ao reconhecimento do pecado e a necessidade de Jesus. Amém.
5º DOMINGO APÓS EPIFANIA | VERDE | CICLO DO NATAL | ANO C
06 de Fevereiro de 2022
P. William Felipe Zacarias