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Jesus nos faz olhar para fora do templo

25/08/2019

Lucas 13.10-17

Prezada Comunidade,

O Evangelho de hoje nos diz que Jesus veio para libertar as pessoas de qualquer cativeiro em que estiverem sendo mantidas. Nesse texto do Evangelho de Lucas, Jesus demonstra a importância de cada pessoa no reino de Deus.

Quando li esse texto me lembrei imediatamente dos indígenas do Equador, onde nós moramos durante 10 anos. Nas montanhas do Equador, era muito comum ver os indígenas carregando grandes volumes nas costas. Indígena lá é sinônimo de agricultor(a). E por conta do terreno inclinado, a maior parte do trabalho agrícola era manual e à medida que os indígenas iam ficando velhos, suas costas começavam a se encurvar. Uma pessoa indígena que andava encurvado, geralmente havia sido uma pessoa que carregou muito, mas muito peso na vida.

Mas, quem é essa mulher a quem Jesus liberta de seus males? Não sabemos seu nome, estado civil, idade. Sabemos que é mulher, e isso parece bastar para Lucas descrever o tamanho do peso que essa mulher já carregou em sua vida. É uma mulher doente que a deixa encurvada. As dificuldades da vida tornaram essa mulher uma pessoa com deficiência. Interessante que não foi a mulher que procurou por Jesus. Ela somente foi até a sinagoga. E ali ela é vista por Jesus. É Jesus quem vai ao encontro dela para ajudá-la.

Muitas pessoas sofrem a tanto tempo, que já se conformaram com o sofrimento. Não é assim também hoje? As pessoas sofrem com depressão, com problemas familiares, com violência doméstica, com a discriminação, com doenças que não tem condições financeiras para tratar, todas essas coisas fazem com que as pessoas se conformem com as dores e vão vivendo um dia após o outro, do jeito que for possível. Além disso, muitas vezes uma pessoa com depressão não quer nem sair de casa.

No entanto, mesmo sem pedir ajuda, a situação daquela mulher comove a Jesus e Jesus decide ajudá-la imediatamente. Era sábado e a Lei judaica proibia trabalhar no sábado. Mas essa mulher vem carregando um grande peso em sua vida há 18 anos. Quando se vê o sofrimento de alguém, não dá para esperar nenhum dia mais e nem haver impedimento de nenhum tipo para ir ao encontro dessa pessoa.

Com essa atitude, Jesus nos quer chamar a atenção para uma mudança de pensamento em relação a vontade de Deus e à fé. Jesus queria abrir os olhos de outras pessoas para que elas vissem os sofrimentos ao seu redor e não usassem a lei de Deus para justificar ou explicar o sofrimento das pessoas. Diante de uma pessoa doente, de uma pessoa com deficiência, quando alguém está sofrendo, essa pessoa não precisa ouvir discursos sobre o seu sofrimento. O que essa pessoa precisa é de gestos de solidariedade.

Vejam o que Jesus faz: Jesus olha para essa mulher, ele a vê, chama essa mulher, toca nela e ela se endireitou e louvou a Deus. Reconhecer o sofrimento de uma pessoa, chamá-la pelo nome, tocá-la é isso que Jesus espera de sua igreja, de cada um de nós.

No entanto, provavelmente a cura não foi algo mágico e que de repente tudo mudou na vida da mulher. Ela certamente ainda tinha muito ainda por lutar pela vida e para manter-se ereta, mas agora ela podia ver tudo por um outro ângulo, não mais o dos pés, mas olhando os problemas de frente.

Portanto, o que Jesus nos ensina hoje é que nós precisamos olhar a nossa volta e tratar de enxergar o sofrimento das pessoas que estão ao nosso redor.

Aqui no Brasil estamos no meio da Semana Nacional da Pessoa com Deficiência (21-28 de agosto). A mais de 20 anos a nossa igreja vem oferecendo material e incentivo para o trabalho com familiares e pessoas com deficiência em nossas comunidades. Por muito tempo as pessoas com deficiência eram escondidas dentro de casa. A sociedade tinha um preconceito contra a pessoa com deficiência e também contra a família. Esse preconceito também estava associado ao pecado e ao castigo de Deus. Esses 20 anos de incentivo ao trabalho com familiares pessoas com deficiência em nossa igreja tem derrubado muitos desses preconceitos. Mas ainda não devemos estar satisfeitos. Há muito ainda por fazer para integrar as crianças com deficiência no Culto Infantil, por exemplo.
Nesse ano de 2019, a nossa igreja nos chama a atenção para o Transtorno do Espectro do Autismo, que vem como uma demanda social sempre mais evidente também em nossas comunidades. Crianças com um desenvolvimento atípico e suas famílias estão nas nossas comunidades ou estão chegando nelas.

Nos últimos anos parece que os informes presentam um aumento dos casos de autismo no mundo. No Brasil, não existem pesquisas quantitativas da prevalência de autismo, mas elas são projetadas a partir dos dados nos Estados Unidos.
Na década de 80, por exemplo, se falava em um caso para cinco mil crianças nascidas.
Na década de 90, já se falava em um caso para cada 2.500 crianças nascidas.
No ano 2000, as estatísticas já falam em um caso para cada 500 crianças nascidas.
No ano 2010, se falava em uma criança com autismo entre 110 crianças nascidas.
Atualmente (2019) se fala em uma criança com autismo em cada 68 crianças nascidas.

O que aconteceu? Esses dados querem dizer que aumentou o número de crianças com autismo? Os profissionais envolvidos com o trabalho com crianças com autismo dizem que o que aumentou foi o conceito de autismo. Até 1994 o autismo era considerado uma doença mental. Desde 2013 o autismo passou a ser definido como um Transtorno do Espectro do Autismo.

“Meu filho não olha nos meus olhos, será que ele tem autismo? Minha filha tem comportamentos repetitivos, ela balança as mãos repetidamente na altura do rosto, será que ela tem autismo? Meu filho se agride quando é contrariado, ... é autismo?”

O pastor Marcos Armange, um dos meus colegas pastores na IECLB, que tem um filho autista e que estudou a fundo esse transtorno. Ele escreve dizendo  que esses são sinais importantes, mas o que determina se uma criança pertence ou não ao espectro do autismo é a socialização. A maioria das crianças com autismo consegue se socializar. E o que é importante para essa socialização é o diagnóstico precoce. Quanto mais cedo é detectado o autismo, melhor será a resposta da criança ao tratamento terapêutico. Uma criança que começa a receber tratamento clínico aos dois anos tem mais chance de desenvolver o sentido de autonomia, do que uma criança que começa a receber aos seis anos. E, infelizmente, a média de idade de diagnóstico no Brasil está em torno de cinco anos, diz o Pastor Marcos Armange.

Portanto, assim como Jesus viu a mulher encurvada e foi ao encontro dela, também nós somos chamados a olhar para as crianças com autismo ou crianças com qualquer outra dificiência e ir ao encontro delas e de seus familiares. Precisamos aprender a conviver e a nos alegrar com a possibilidade de aprender coisas que ainda não sabemos. Os profissionais que trabalham com crianças autistas também ensinam técnicas aos pais/mães, cuidadores e cuidadoras que podem ser aplicadas durante os outros dias da semana em casa, no dia a dia da família e também na igreja, no culto infantil. Por isso, precisamos que os pais tragam as crianças autistas ou com qualquer outra deficiência para o culto infantil e nos ensinem como podemos ajudar. O aprendizado é mútuo. Certamente a convivência com outras crianças ajudará a derrubar preconceitos e também terá um grande efeito terapêutico nas crianças com deficiência.

Jesus nos desafia hoje para que olhemos a nossa volta e tenhamos olhos e coração abertos para ver diversidade nas pessoas e no que acontece a nossa volta. Como igreja, nós somos o Corpo de Cristo que atua nesse mundo a serviço dele. Essa é a nossa vocação também como igreja luterana. Queremos ser cada dia mais uma igreja inclusiva, que consegue conviver e contribuir com esse mundo, abençoadamente diverso.

Que a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus nosso Pai e a comunhão do Espírito Santo. Amém.
 


Autor(a): Nilton Giese
Âmbito: IECLB / Sinodo: Sudeste / Paróquia: Belo Horizonte (MG)
Área: Confessionalidade / Nível: Confessionalidade - Prédicas e Meditações
Área: Comunicação / Nível: Comunicação - Programas de Rádio
Testamento: Novo / Livro: Lucas / Capitulo: 13 / Versículo Inicial: 10 / Versículo Final: 17
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 52930
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