Numa viagem recente, seguindo pela BR-101, sintonizei uma emissora FM de nossa área. Viagens ao som de música tornam-se mais agradáveis e menos monótonas. Em meio aos vários sucessos musicais, a emissora colocou uma no ar que se chamava: Tô nem aí! A partir do título, já era possível descobrir conteúdos da música. Através da letra, a cantora declarava que todas tentativas de reconciliação do ex-amante de nada adiantariam. Repetia cantando, sempre de novo: Tô nem aí!..
Embora a letra e a música não tivessem nenhuma particularidade cultural especial, nenhuma profundidade que merecesse atenção maior, aquela canção popular passou alguns recados críticos, mais involuntários do que calculados.
Lembrei-me da realidade humana marcada por tantas pessoas insensíveis, indispostas face ao desespero alheio, ensimesmadas por causa de seu egoísmo. A sociedade moderna produz inúmeras pessoas assim. Seres humanos centrados na ânsia da razão própria, humanos tentados a assegurar seus direitos e privilégios. Tô nem aí, uma expressão de aparência simplista, mas sobretudo de efeito julgador, capaz de provocar rupturas, quebrar relacionamentos e de prejudicar vidas. Tô nem aí: uma manifestação pesada a serviço da desgraça e da frustração de outros. Gente construindo vidas sob a lógica do consumo, pessoas atraídas pelos bens descartáveis e embriagadas com a beleza e a saúde perfeitas, alimentando sonhos de autonomia plena, somam suas vozes no grande coral que entoa a uma só voz: Tô nem aí!
Cristãos apostam num mundo novo: mais irmão, igualitário, mais unido.
A proposta da novidade de vida anunciada por Jesus Cristo e encarnada através dos gestos amorosos e sinais concretos vivenciados pelo Filho de Deus, em particular, no evento da cruz e da ressurreição, é realidade muito diferente. O Cristo de Deus veio ao mundo para conviver como Deus Conosco, o Deus Emanuel. Sua oferta é de aceitação, a reconciliação é sua bandeira, sua vontade é promover a recuperação de vidas quebradas. O presente do Deus Conosco se presta a desenvolver um novo modelo de vida e estabelece novos critérios para o relacionamento fraterno. O Deus Emanuel fundamenta novas relações determinadas pelo espírito de comunhão e de solidariedade. É o Deus Conosco que gera novo gosto pela vida. Tô nem aí, uma tentação humana que expressa juízo alimentada pelo egoísmo. Revela indisposição para aceitar o próximo em suas qualidades e potencialidades diferentes. O risco assumido é a vida vazia, sem sentido, incapaz de servir e de se doar.
O perfil das pessoas integradas na família de Jesus Cristo é desenhado na perspectiva de vida aberta à soberania de Deus. É existência nova que acontece sob a graça e a misericórdia do Deus, Deus amigo que nos abraça na pessoa humana de Jesus Cristo.
Eis aí a chave para sermos agraciados(as) com nova mentalidade e experimentarmos nova possibilidade de fortalecer a vida, que é vida de verdade!
Certeza de acolhimento e fonte para o resgate de novas forças..... Quem ousará abrir mão destas ofertas ?
Manfredo Siegle
pastor sinodal do Sínodo Norte-catarinense
da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB)
em Joinville - SC
Jornal ANotícia - 15/08/2003