“Palavra não foi feita para dominar, destino da palavra é dialogar. Palavra não foi feita para opressão, destino da palavra é a união”. Trata-se de um texto do nosso hinário. Faço uma associação deste poema cantado com o lema que norteia as atividades da IECLB neste ano de 2006: “Sirvam uns aos outros conforme o dom que recebeu”. Anunciar, falar, comunicar-se é serviço; aos olhos da fé é serviço realizado em nome de Deus. Tudo que fazemos, em razão da fé não é obra humana, nem virtude nossa. Somos administradores da graça de Deus. E ela não tem limites, também o “dom da palavra” é presente imerecido de Deus.
A sociedade moderna nos brinda com uma crescente ampliação dos veículos de comunicação a serviço das palavras humanas. O mercado da comunicação, em especial a televisiva, é amplo e procura satisfazer a diversidade de gostos e os anseios pessoais. Em data recente, constatou-se que a criança brasileira é aquela que mais horas soma à frente do aparelho de TV. Comunicar-se é um excelente exercício a serviço da formação e da informação. A linguagem comunicativa aprofunda conhecimentos, favorece o lazer, reconstrói pontes de relacionamentos, assim como aproxima pessoas e agiliza a veiculação dos fatos na aldeia global.
Até parece um contra senso, mas a comunicação verbal passa por um sério processo de deterioração. Basta uma análise crítica do que se veicula nas telinhas em nossos lares. A sociedade humana é levada a pensar pequeno, apesar dos enormes desafios que procedem da realidade ambiental, econômica, social e política. É da competência da ciência da comunicação fazer uso do seu poder, canalizando a sua influência às sombras do globo terrestre, em busca de mudanças profundas. O lado sombrio da arte da comunicação cria pessoas humanas “coisificadas”; criaturas alienadas. O homem, quando tratado como um número na massa, torna-se um ser desrespeitado. Palavras e jargões somados às imagens da comunicação, transformam a pessoa em escravo do sensacionalismo ou do consumo, em conseqüência, ela perde a sua dignidade. Muitos vivem no abandono, “como ovelhas sem pastor”. No contexto da religião judaica, o teólogo Martin Buber assinalou que a comunicação ao ignorar o eixo central visando à união e à construção de um mundo mais unido e irmão, “perde a consciência de que comunicar é viver o amor-ação”.
A Igreja cristã, por causa da sua característica missionária, precisa sair da sua casa. Desde os primeiros tempos, as comunidades sentiram o compromisso de veicular a Boa Notícia da Salvação. Jesus Cristo, o Salvador, é a Palavra de Deus encarnada, o melhor presente doado a este mundo amado por Deus. É oferta que abraça e alcança a amplitude do Universo. A tarefa da teologia e da ciência de interpretação é decodificar o Evangelho, fazê-lo compreensível. A fé das pessoas cristãs nasce da comunicação da Palavra de Deus. O apóstolo Paulo afirma que toda vida em comunidade decorre da pregação da Boa Notícia de Jesus Cristo, o crucificado e ressuscitado. Em meio à enxurrada de palavras humanas, tantas vezes, vazias e rasas, “a Palavra de Deus é como martelo que esmiúça a rocha”, conforme o profeta Jeremias, mas também “Palavra doce ao paladar! Mais que o mel à minha boca”, segundo a confissão do salmista.
O Evangelho, comunicação verbal ou traduzido através de gestos e símbolos, prioriza a liberdade da pessoa humana pautada no amor e aponta à leveza da graça de Deus. A Verdade do Evangelho promove a transformação da mente e se engaja na transformação do mundo. O universo na qualidade de criação de Deus é casa (=oikos) de Deus, que compromete ao respeito mútuo e à co-responsabilidade dos que nela habitam.
A comunicação da Palavra de Deus, a Boa Notícia sugere rupturas com sistemas de vida passados e redefine o sentido de vida no presente. O acolhimento do Evangelho transforma a vida no deserto em paraíso, o caos em ordem, as sombras em luz, o desespero em esperança e o desejo de dominar em disposição ao serviço.
Pastor Sinodal Manfredo Siegle