História do povo evangélico luterano


ID: 2927

O Jubileu da Reforma - um evento de alcance mundial - fachos de luz a 2017

Declaração do CMI no Concílio da Igreja Evangélica da Alemanha

05/11/2012

CONCÍLIO da IGREJA EVANGÉLICA NA ALEMANHA
(Timmendorfer Strand, 05 de novembro de 2012)

O Jubileu da Reforma – um evento de alcance mundial – fachos de luz a 2017

Declaração em nome do Conselho Mundial de Igrejas

Walter Altmann
(Porto Alegre, Brasil)
Moderador do Comitê Central

Muito distinguida Senhora Chanceler,
muito distinguido Senhor Presidente do Conselho,
muito distinguida Senhora Presidenta do Concílio,
supremo Concílio,
prezados conciliares,
estimadas irmãs e estimados irmãos:

Há acontecimentos na história que, por suas repercussões e desdobramentos, ultrapassam em muito o alcance intencionado quando foram protagonizados. E isso tanto no sentido geográfico quanto social e político. Já o Reformador Martim Lutero ficou deveras surpreso com a repercussão quase imediata que suas 95 Teses, destinadas a um pretendido debate acadêmico, obtiveram. 

Os acontecimentos mais significativos também ultrapassam as limitações de seu próprio tempo e se transformam em referenciais permanentes. Ancorados no contexto de circunstâncias muito específicas, qual seja, por exemplo, o comércio de indulgências, adquirem uma dimensão, diríamos hoje, global, tendo a capacidade de replicar-se das mais diferentes formas, nos contextos mais variados. 

Agradeço pelo convite a mim formulado a dar testemunho desse alcance global da Reforma 1517, em nome do Conselho Mundial de Igrejas. Pois a data dos 500 anos da Reforma, que se aproxima, é de altíssima relevância, para a comunhão de igrejas que o CMI representa. Ainda mais, para toda a cristandade no mundo. A imagem de Lutero pregando as 95 teses à porta da Igreja do Castelo em Wittenberg, independente de quão fiel ela é ao acontecimento histórico, é ainda assim um símbolo poderoso para um evento e todo um processo histórico de redescoberta teológica da maravilhosa graça de Deus a ser recebida em fé para nossa salvação (solus Christus, sola gratia, sola fide). Foi um evento verdadeiramente libertador, e essa mensagem o é ainda hoje.

Ocorreu há alguns anos, no Chile, chamado de “terra no fim do mundo” com uma população tradicional e majoritariamente católica. A comunidade evangélica, porém, constituída de pequenas igrejas protestantes históricas, mas de muitas e maiores igrejas pentecostais recentes, reivindicou o estabelecimento de um feriado nacional que fosse representativo da comunidade evangélica. Não lhes foi difícil identificar o dia 31 de outubro como a data a ser celebrada. Quando da votação final, no Senado chileno, as galerias estavam tomadas por membros dessas igrejas. Ao ser proclamado o resultado da votação, aprovando o estabelecimento do feriado, esses membros se levantaram espontaneamente e entoaram em uníssono o hino Castelo Forte.

Naturalmente, por justas razões, a recordação e a comemoração dos 500 anos da Reforma se dá de uma forma bastante intensa na Alemanha e em especial por empenho da EKD, já na caminhada regressiva em direção a 2017. A comunidade cristã global acompanha essa programação com interesse e também em comunhão espiritual. Há menos de dois meses participei de um “dia da igreja” em minha igreja, a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil – IECLB. O evento teve lugar num ginásio de esportes. Não havia nenhuma torre com sinos por perto. Mas em tempos de modernos recursos de comunicação, a necessidade se transforma em oportunidade. O culto celebrativo teve início e fim com o soar dos sinos da Igreja da Cidade de Wittenberg. E durante o culto foi recolhida uma oferta para a restauração da mesma, como parte de uma campanha da Obra Gustavo Adolf brasileira. Não são somas extraordinárias, por certo, mas atestam a vinculação espiritual dessa igreja com a Reforma encetada em Wittenberg. (E jardins de Lutero, sob inspiração do Jardim de Lutero em Wittenberg, existem, entrementes, vários no Brasil.)

No entanto, como responder aos desafios espirituais e diaconais que a realidade global hoje nos coloca, de forma fiel ao legado evangélico dos 500 anos da Reforma?

Trata-se de: 

              busca da unidade em meio à crescente fragmentação e competitividade religiosa, qual mercado global; 

              afirmação da liberdade evangélica em face de sistemas e mecanismos de exclusão; 

              serviço ao próximo necessitado em resposta de gratidão ao dom gratuito de Deus.

Trata-se de:

             respeito pleno à dignidade de cada pessoa, criada à imagem de Deus, em face da violência que a tantos vitimiza;

             louvor a Deus – pensemos no tema do ano na Igreja Evangélica na Alemanha, “A Reforma e a Música” –, em vez de adoração ao ídolo Mâmon na  vida pessoal e nos estruturas econômicas do mundo globalizado;

             seguimento nas pegadas de um Senhor que veio a ser crucificado, em meio a tantas promessas de prosperidade fácil;

             cuidado da boa criação de Deus, em que há o suficiente para todos viverem dignamente, mas sem espaço para concentração de bens e para a ganância pessoal.

Relembrar o legado da Reforma é saber-se comprometido com essa causa. E ela não é exclusiva das Igrejas da Reforma, mas comum às igrejas engajadas no movimento ecumênico. Em seu relatório ao Comitê Central, em recente reunião realizada em Kolympari, na Ilha de Creta, Grécia, o Secretário Geral do CMI, Olav Fykse Tveit dizia: “Em todo caso, deveríamos celebrar conjuntamente a renovação e a descoberta do Evangelho. Deveríamos celebrar que o movimento ecumênico e os diálogos ecumênicos nos auxiliaram a entender os desenvolvimentos como tesouro para nós todos, independentemente de a qual tradição eclesiástica pertencemos ou qual identidade eclesial temos.” Fykse Tveit exortava ainda a que comemorássemos a data com humildade, em face das divisões que experimentamos e como renovação do compromisso que temos no jornadear ecumênico em direção à unidade que nos é dom de Deus e compromisso para nosso ser Igreja a serviço de Deus e da humanidade. 

Uma renovação da vida e a serviço da vida implica também uma renovação constante das próprias igrejas. O Conselho Mundial de Igrejas examina neste momento, a possibilidade de realizar em 2017, precisamente com o tema da “renovação”, uma nova Conferência de Fé e Ordem, que seria a sexta da história, a quarta desde 1948 quando o CMI foi criado. “Renovação” é uma necessidade prática, uma experiência e uma realidade. “Renovação” é também um solo fértil para a reflexão teológica, profundamente vinculada à missão e à eclesiologia. Uma reflexão teológica multilateral e global seria um presente às igrejas. Nesse sentido, os 500 anos da Reforma poderão ser ensejo para um novo significativo impulso ao movimento ecumênico como um todo. 

Termino esse depoimento com um gesto simbólico da comunhão espiritual que nos une, e o faço relembrando a importância fundamental que teve a Bíblia para Lutero e para o movimento da Reforma. Sim, “no princípio era o Verbo”. [Obs.: Uma referência ao tema do Concílio.] Lutero quis que todas as pessoas tivessem acesso à Escritura. Com uma tradução genial colocou a Bíblia nas mãos do povo, para que este dela se nutrisse com a mensagem da liberdade e da salvação (sola Scriptura). Ao longo da história e também hoje, a volta à Escritura tem sido fonte de renovação das igrejas e inspiração para o caminhar ecumênico. 

Como parte integrante do caminhar rumo a 2017, a Sociedade Bíblica do Brasil, com a colaboração das igrejas luteranas do país, preparou e lançou há poucos dias uma edição especial da Bíblia com textos interpretativos selecionados de Lutero. É um testemunho vigoroso de que a palavra da Escritura adquiriu vida nova no tempo de Lutero e se torna uma viva voz do Evangelho em todos os tempos e lugares. Como sinal dessa comunhão espiritual, tenho o prazer de entregar uma cópia desta edição à excelentíssima Senhora Chanceler alemã e à Presidenta deste excelso Concílio.

Muito obrigado.
 

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