Prédica: Eclesiastes 10.12-18
Leituras: Lucas 14.1,7-14 e Hebreus 13.1-8,15-16
Autoria: Joel Haroldo Baade e Aline Danielle Stüewer
Data Litúrgica: 12º. Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 1 de setembro de 2019
Proclamar Libertação - Volume: XLIII
A verdadeira sabedoria
1. Introdução
Os textos previstos para leitura apontam para a importância da sabedoria. No texto de Eclesiastes 10.12-18 faz-se uma justaposição da tolice e da sabedoria. Em determinado momento da leitura, não se sabe ao certo quem é o sábio e quem é o tolo. No texto também se fazem referências a contextos de mesa, de comer, para que se possam recuperar as forças como ação digna de louvor e a refeição como ação de bebedice ou banquetear-se.
O texto do evangelho, por sua vez, tem como lócus um contexto de mesa. Jesus chega à casa de “um dos principais dos fariseus” e observa as pessoas tomando os primeiros lugares. Diante disso, propõe-lhes uma parábola. De alguma forma, tanto em Eclesiastes como no evangelho, tolice e sabedoria são colocadas lado a lado, com a diferença de que no evangelho fica explícito em que reside a verdadeira sabedoria, qual seja, de ouvir o ensinamento de Cristo. O texto do evangelho destaca a humildade e a hospitalidade como atitudes sábias.
Em Hebreus 13.1-8,15-16 há uma exortação à verdadeira sabedoria, que está em nosso Senhor Jesus Cristo. As pessoas cristãs são exortadas para o exercício constante do amor fraternal e que dos seus “lábios” frutifiquem sacrifícios de louvor.
2. Exegese
Uma questão fundamental em Eclesiastes e que também se evidencia no texto indicado para pregação é a justaposição de tolice e sabedoria. Há momentos em que não se sabe o que é uma ou outra. Eclesiastes, aliás, conforme Schmidt (2004, p. 416), radicaliza a questão da limitação do conhecimento humano e, finalmente, a transforma em dúvida (6.12). Interessante observar que no livro de Eclesiastes o nome de Deus não é referido, ficando em segundo plano. De qualquer forma, Schmidt (2002, p. 314) propõe um questionamento que Eclesiastes estaria propondo a seus leitores: “a profissão de fé no Deus que atua, mata e vivifica na história (1Sm 2.6), essa profissão de fé se mantém firme diante da experiência individual do mundo e da vida?”.
Na comparação entre as diferentes versões do texto, encontram-se diferenças substanciais. O texto de Almeida (Almeida Revista e Atualizada – ARA), por fazer uma tradução mais literal do texto original, emprega vocabulário não mais tão acessível ao ouvinte contemporâneo. Uma análise versículo a versículo é necessária para subsidiar uma recomendação de leitura no culto da comunidade. Três versões foram levadas em consideração: ARA, Nova Tradução na Linguagem de Hoje (NTLH) e Jerusalém (JER).
V. 12 – Na primeira parte do versículo, ressalta-se o sábio e o que ele recebe pelas palavras que profere. ARA destaca que nelas “há favor”; NTLH enfatiza os elogios recebidos; e JER acentua o agrado que elas proporcionam aos ouvintes. Na segunda parte, em contraposição, coloca-se o tolo (ARA e NTLH) ou o insensato (JER) e a destruição (NTLH) e ruína (JER) que ele prova a si mesmo pelas palavras que profere (NTLH). ARA e JER preferem empregar o termo “lábios” e ARA ainda acentua que o tolo é “devorado” pela própria boca. Embora a leitura de ARA não seja fluida ao nosso ouvinte, essa imagem pode ser explorada na mensagem. Observe-se que na leitura da epístola também há uma referência aos lábios das pessoas cristãs, pelos quais se propagam sacrifícios de louvor e não proferem tolices.
V. 13 – Neste versículo se acentuam a “estultícia”, a “loucura perversa” (ARA), as “tolices”, as “coisas absurdas e más” (NTLH), a “insensatez” e a “tolice perversa” (JER) que há nas palavras da pessoa tola e/ou insensata. De qualquer forma, prevalece a ideia de que nada se aproveita do início ao fim do que sai de sua boca.
V. 14 – Segundo o texto, o “estulto” (ARA), o “tolo” (NTLH) ou o “néscio” (JER) “multiplicam as palavras” (ARA e JER) ou “não para de falar” (NTLH), mesmo que não se saiba “o que vai acontecer amanhã” (NTLH). ARA e JER empregam o termo “homem” aqui, para explicitar o sujeito da ação. NTLH prefere apenas o pronome “ninguém”. Por fim, conclui-se com uma pergunta: quem sabe o que virá depois? JER e ARA apenas empregam “depois dele” e NTLH interpreta o texto como uma referência à morte.
V. 15 – Da mesma forma, como as palavras “tolo” e “insensato” são vãs, é também o seu trabalho. Ele não sabe ir à cidade (ARA e JER) ou “nem consegue encontrar o caminho de casa” (NTLH). E, assim, seu trabalho também resulta em “fatiga” (ARA e JER) ou “esgotamento” (NTLH). Literalmente, NTLH aponta a direção oposta em relação ao percurso do tolo, mas o sentido do texto está preservado. A questão é “não saber o caminho” e, como diz o ditado, para quem não sabe aonde quer ir, qualquer caminho serve.
V. 16 – Nos v. 16 e 17 há uma mudança da terceira para a segunda pessoa no discurso. As palavras agora são dirigidas diretamente ao ouvinte. Apenas ARA e JER preservam essa mudança. O texto inicia com a ênfase: “ai de ti”. E, então, explicita-se o alvo do alerta: o “país” (JER e NTLH) ou “terra” (ARA). O alerta é para que não se deixe governar por “rei” (ARA) ou “governo” (NTLH e JER), que é “criança” (ARA), “jovem” (JER) ou, então, que “se deixa levar pela opinião dos outros” (NTLH); de igual modo, são um risco os governantes que se “banqueteiam” (ARA), que “comem” (JER) ou “se divertem” (NTLH) desde o amanhecer. Deve-se aqui ter o cuidado para não identificar a tolice de que se fala nos primeiros versículos com a criança ou jovem presentes no culto. Eles são parte importante da comunidade e associar a eles, às vezes, o mau andamento da comunidade ou até mesmo do país constitui um grande erro. NTLH parece ter sido feliz em sua interpretação, pois dá a ideia de que o verdadeiro perigo é a pessoa que não tem opinião própria, que se deixa levar por qualquer falácia. O verdadeiro tolo não é o que profere palavras sem sentido, mas o que acredita nelas e as leva adiante.
V. 17 – Aqui, por sua vez, é elogiada a terra governada por “filho de nobres” (ARA e JER) ou “por quem toma as suas próprias decisões” (NTLH); cujos “príncipes” (ARA e JER) ou “autoridades” (NTLH) se sentam à mesa no tempo certo e não para “bebedice” (ARA), “beber demais” (NTLH) ou para se “banquetearem” (JER).
V. 18 – O texto finda com um ditado. A “preguiça” (ARA e NTLH) ou as “mãos preguiçosas” (JER) fazem desabar o teto (ARA e JER) ou não consertam o telhado (NTLH). Pela frouxidão das mãos (ARA) ou braços (JER) goteja a casa. Ela produz “goteiras” e a “casa cai” (NTLH).
Com base na análise, sugere-se a leitura de NTLH para a comunidade, mas retomando termos e expressões das outras versões durante a alocução, de modo a explicitar e enfatizar expressões que possam auxiliar na melhor compreensão do texto.
Quanto à temática, depois da análise versículo a versículo, pode-se retomar a pergunta proposta por Schmidt: A fé em Deus subsiste à realidade de incertezas? O que é a sabedoria? O que é a vida? Quem sabe o que há de vir? Uma vez que os outros textos bíblicos enfatizam a questão da sabedoria, sugere-se focar a prédica no tema “sabedoria”. O que é ser uma pessoa sábia conforme o texto de Eclesiastes?
3. Meditação
Vivemos num mundo dominado pelas mídias sociais. Toda pessoa hoje tem a liberdade e a facilidade de tornar pública a sua opinião. Podemos facilmente nos comunicar com pessoas do mundo inteiro. Infelizmente, muitas pessoas usam essa facilidade para falar de assuntos que desconhecem, jogando nas redes sociais palavras tolas, sem conhecimento e sabedoria. O texto de Eclesiastes ressalta que “a pessoa tola diz tolices, e acaba falando coisas absurdas e más”. Quantas pessoas já foram machucadas por terem suas vidas difamadas e expostas nas redes sociais.
A palavra de Deus lembra que as palavras podem ser usadas para exaltar ou machucar. A pessoa sábia, aquela que segue os ensinamentos de Deus, prefere permanecer em silêncio a deixar que da sua boca saiam palavras de ódio, rancor, racismo, discórdia, maldade. Como diz o ditado: “Deus nos deu dois ouvidos e somente uma boca para ouvir mais e falar menos”. A pessoa tola sempre responde antes de ouvir. Ela não para de falar. Ela sabe de tudo, mas na verdade não sabe nada.
Quais palavras sua boca tem pronunciado? Você tem escolhido com sabedoria as suas palavras? Alguma vez nessa semana você mentiu? Você fez alguma fofoca? Você rebaixou alguém? Você falou algum palavrão? Você falou mal de alguém? Você gritou com alguém? Você falou com alguém de forma arrogante, achando-se o dono da verdade? Lembre-se: a verdadeira sabedoria está no ouvir. A pessoa sábia é humilde diante de Deus. E a humildade impede a arrogância. Somente a pessoa tola usa as palavras para falar coisas absurdas e más. Ou será que alguma vez nessa semana você agradeceu alguma gentileza, pediu desculpas, falou o quanto gosta de uma pessoa, falou da sua fé em Jesus, orou por quem precisa? Falou palavras de bênção?
O ser humano tem diante de si o caminho da sabedoria ou da tolice. A pessoa tola é tola em suas palavras e em suas atitudes. Não tem bom senso. Fala e faz aquilo que a sabedoria humana prega. Jesus Cristo é a sabedoria encarnada de Deus. Ele nos ensina que a boca fala do que o coração está cheio. Um coração sábio é humilde, verdadeiro, gentil e amoroso. Uma pessoa sábia ouve e pratica os ensinamentos de Jesus, e suas palavras são um louvor a Deus, conforme o texto de Hebreus.
As palavras da pessoa sábia são de bênção. Elas produzem vida através daquilo que transmitem. O mundo pode achar tola a pessoa que, mesmo diante de uma ofensa, prefere se calar; o mundo pode achar tola a pessoa que devolve o ódio com palavras de amor; o mundo pode achar tola a pessoa que pede perdão. Mas tola é a pessoa que age de forma contrária à palavra de Deus e se afasta dos seus ensinamentos. A verdadeira sabedoria está em praticar e viver o evangelho de Jesus Cristo.
4. Imagens para a prédica
A história das três peneiras pode ser usada para destacar que a pessoa sábia não fala tudo aquilo que lhe vem à mente, mas guarda a sua boca para falar somente palavras que edificam e geram amor e bondade.
As três peneiras
Um rapaz procurou Sócrates, o filósofo, e disse-lhe que precisava contar-lhe algo sobre alguém. Sócrates ergueu os olhos do livro que estava lendo e perguntou:
– O que você vai me contar já passou pelas três peneiras?
– Três peneiras?, indagou o rapaz.
– Sim! A primeira peneira é a verdade. O que você quer me contar dos outros é um fato? Caso tenha ouvido falar, a coisa deve morrer aqui mesmo. Suponhamos que seja verdade. Deve, então, passar pela segunda peneira: a bondade. O que você vai contar é uma coisa boa? Ajuda a construir ou destruir o caminho, a fama do próximo? Se o que você quer contar é verdade e é coisa boa, deverá passar ainda pela terceira peneira: a necessidade. Convém contar? Resolve alguma coisa? Ajuda a comunidade? Pode melhorar o planeta?
Arremata Sócrates:
– Se passou pelas três peneiras, conte! Tanto eu como você e seu irmão iremos nos beneficiar. Caso contrário, esqueça e enterre tudo. Será uma fofoca a menos para envenenar o ambiente e fomentar a discórdia entre irmãos, colegas do planeta.
5. Subsídios litúrgicos
Oração
Ó Senhor, faze de mim um instrumento de tua paz: que eu pratique o amor onde as pessoas se odeiam; que eu perdoe onde elas se ofendem; que eu apazígue onde há inimizade; que eu diga a verdade onde domina o engano; que eu leve a fé para onde a dúvida pressiona; que eu suscite esperança onde o desespero faz sofrer; que eu acenda uma luz onde a escuridão domina” (Da Normandia, cf. Senhas Diárias de 27/06/2018).
Sugestão de hinos
Livro de Canto da IECLB: 609: Palavra não foi feita; 87: A lei do Senhor é perfeita; 170: Meu irmão, tu precisas falar com Jesus.
Bibliografia
SCHMIDT, Werner H. Introdução ao Antigo Testamento. São Leopoldo: Sinodal; EST, 2002.
SCHMIDT, Werner H. A fé do Antigo Testamento. São Leopoldo: Sinodal; EST, 2004.
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