Vós sois o sal da terra. ... Vós sois a luz do mundo. ... Assim também brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos céus. (Mateus 5.13-16)
Você já fez memória de momentos tristes da sua vida? qual sentimento resulta disso? Qual compromisso de vida renasce?
Hoje, 27 de janeiro, é o dia criado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como Dia Internacional em Memória do Holocausto. Para lembrar a data a Confederação Israelita do Brasil (CONIB), Federação Israelita de São Paulo (FISESP) e a Congregação Israelita Paulista (CIP) organizam evento em São Paulo. O Sínodo Sudeste recebe convite e, sim, participará.
Enquanto preparo-me para o evento, vem-me à memória as duas visitas que fiz a campos de concentração nazistas. Em 1995, como jovem estudante intercambista, visitei Dachau e em 2016 visitei com um grupo de colegas o campo de concentração em Buchenwald, ambos na Alemanha.
Foram visitas difíceis. Passar pelos corredores do campo de concentração e imaginar a saga de vida e morte daquelas pessoas gera um sentimento horrível. As celas apertadas, os alojamentos amontoados, as escassas refeições, os trabalhos forçados, as câmeras de gás, os fuzilamentos, os crematórios ... Indescritível o sentimento. Uma dor imensa toma conta do coração.
Mas também questionamentos e leituras críticas da história são feitos. Surgem perguntas como: por quais razões a humanidade demorou tanto para dar-se conta do que estava acontecendo? O que aconteceu para que ouvidos não ouvissem e as bocas não gritassem pela vida e liberdade das pessoas? Por quais motivos o Evangelho não foi suficiente para oferecer resistência contundente à situação vivida e silenciaram as pessoas de fé? Nunca pudemos, suficientemente, oferecer respostas.
Fato é que a humanidade deu-se conta tardiamente do que realmente estava acontecendo. A Igreja também – exceção para a voz da Igreja Confessante, um pequeno grupo do qual fazia parte, entre outros, Dietrich Bonhoeffer, morto no campo de concentração de Flossenbürg. A consequência do silêncio paralisante e de um governo nazista autoritário são os mais de 6 milhões de pessoas mortas, sobretudo judeus e minorias.
A situação da Europa não ficou distante do Brasil. Chegou até nós por cartas, radiodifusão, símbolos, livros, ... Também aqui as pessoas se dividiram em manifestações de encantamento com a força do governo nazista e a tragédia humanitária que estava se instalando. Este é tema que deve continuar sendo refletido em nosso meio.
Ajuda nesta reflexão perceber que o mundo criou estratégias no pós guerra para evitar a repetição dos fatos. Entre as respostas oferecidas destaco duas: a criação da ONU e movimentos para manter viva a memória.
Entre as tarefas da ONU estava a de alimentar diálogos para que houvessem governos mais democráticos e menos autoritários em todo o mundo. Surge desta reflexão um modelo de Constituição que resguarda os direitos das pessoas como fundamentais. Muitos países acolheram estas constituições como forma de organizar seu governo. O Brasil a acolheu com a constituição cidadã de 1988. A premissa evangélica da defesa da vida está agora também nas Constituição Federal de nosso país.
O evento de hoje na Congregação Israelita de São Paulo está inserido na segunda estratégia. O holocausto acontecido não deve se repetir. Com nenhum povo. Isso quer ser um compromisso da humanidade e especialmente o deverá ser da Igreja. “Nie Wieder” (nunca mais) é o mote impulsionador desta ideia. Lembrar para não esquecer.
Não repetir os pensamentos de que há diferenciações entre vidas humanas que se justifiquem; que uma raça é superior a outra; que uma cor de pele é mais importante do que a outra; o pensamento de que se algo deu errado é porque precisa existir um culpado e então mata-lo; não sustentar governos autoritários; não divulgar notícias falsas; não usar a religião e a fé das pessoas como fonte de discriminação; ... Mas ser comprometido com a vida de todas as pessoas, com a verdade, com a justiça, com o perdão, com a democracia, com a paz...
Deus nos guarde, como Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, na missão de cuidar da vida de todas as pessoas (João 10.10) e ser sal e luz no mundo (Mt 5.13-16). Deus nos conceda reflexões honestas, autocríticas e a fé evangélica capaz de reafirmar “nunca mais”.