Jornal Evangélico Luterano

Ano 2021 | número 847

Quinta-feira, 21 de Novembro de 2024

Porto Alegre / RS - 08:53

Perspectiva - P. DR. Oneide Bobsin

Branco total, letal e estrutural...

Quando fomos para São Paulo cursar Pós-graduação, residimos em uma cidade da Zona Leste, para onde foram milhões de nordestinos e nordestinas. No Carnaval de 1982, presenciamos, da arquibancada, o desfile de escolas de samba e uma delas nos chamou a atenção pelo seu nome: Branco Total. Nessa escola, não era permitida a participação de pessoas negras, pardas ou amarelas. Era uma escola de pessoas brancas e pertencentes à classe média: o racismo desfilando na avenida!

Essa situação me fez lembrar passagens da minha infância. Há 60 anos, quando, portanto, eu tinha cinco anos de idade, vi o sal grosso ser substituído pelo sal branco refinado. Vi o açúcar mascavo ser substituído pelo açúcar branco. Também vi a farinha de trigo escura ser substituída pela farinha branca. A farinha e o açúcar precisavam ser comprados na ‘venda’, pois ainda não havia supermercados.

Assim, a ‘nova trindade’, que causa tanto mal à saúde, se tornou a ‘modernidade’ na colônia de pequenos agricultores, na maioria, mais brasileiros que teutos. Passamos a comprar veneno e a sermos ‘modernos’. Lembro que aquelas mesas para refeições eram feitas de tábuas e dispensavam toalhas, mas a ‘modernidade racista’ não poupou as madeiras escuras. Viraram lenha para o fogão e, no lugar, entraram mesas de fórmica. Quem aderiu à brancura total não sentia o estigma de ser ‘colono grosso’, atrasado. Tornamonos modernos... e envenenados.

Naqueles idos de 1962, em ItatiVale Três Forquilhas/RS, os meus pais aderiram ao plantio de fumo para a Souza Cruz, como mais 30 famílias. A Souza Cruz comprava a produção, dava assistência técnica e, ao final de cada safra, deixava os agricultores em dívidas para a próxima colheita, em função do fornecimento de adubos, agrotóxicos e outros implementos.

O meu avô era o mais politizado e associava a Souza Cruz ao imperialismo americano. Nós, crianças, cantávamos uma marchinha cuja autoria ignoro: O meu coração é de Jesus. O meu pulmão é da Souza Cruz. Uma década depois, chegaram 13 famílias de japoneses, das quais 12 se tornaram luteranas. Também trouxeram muito agrotóxico, que chamavam de ‘remédio para um bom plantio’.

Agora, éramos pessoas modernas, como a gente da cidade, comendo sal e açúcar refinados, bem como pão de trigo branco. Na cozinha da casa, herdada do pai e da mãe, preservamos uma mesa de madeira e alguns objetos rústicos, mas também a sala com mesa de fórmica, usada para receber as visitas aos domingos, permanece lá como lembrança do trio branco que prejudica a nossa saúde.

O tempo passou e o branco total ganhou mais força. Os velhos engenhos de produção de açúcar mascavo entraram no branco total ou deixaram de existir. É preciso branquejar tudo e comprar recipientes inoxidáveis para ferver o caldo de cana. Aqueles recipientes de cobre viraram coisa do passado ou ornamento em casas de parentes urbanos. As pessoas mais tradicionais deixam de produzir e plantam cana para o gado e os porcos. Outras se adaptaram diante das exigências dos órgãos públicos da Saúde e da Agricultura, subordinados ao ‘mercado salvador’.

O processamento dos alimentos, com o ônus de altos investimentos financeiros, também tem passado pela ‘branquização’ sob o pretexto da modernidade, da higiene e da saúde. Tudo precisa ser ‘100% puro’! A aplicação dessas exigências sanitárias é cara e rompe tradições. O pior é que esses esforços tiram apenas sujeiras que nunca nos fizeram mal e não extraem os venenos jogados na lavoura para evitar as pragas naturais.

Ao longo de 50 anos, as festas da Comunidade de Fé também entraram no branco total, a não ser em sinais recentes de uma alimentação que questiona a ‘trindade’ do branco letal: menos sal refinado e mais açúcar mascavo e pão integral. Na alimentação, podemos romper com o racismo estrutural e confessar uma fé com sinais de vida.

O branco total na alimentação é um veneno que está sob o controle do poder público. Seria essa uma metáfora para o racismo estrutural? 

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