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ID: 2751

Luterano, luterana. Que bicho é esse?

07/11/2016

 

Lado PALAVRA

LUTERANO, LUTERANA. QUE BICHO É ESSE?

Catequista Joni Roloff Schneider

A Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) é igreja de Jesus Cristo no Brasil que tem por fim e missão propagar o Evangelho de Jesus Cristo, estimular a vivência evangélica pessoal, familiar e comunitária, promover a paz, a justiça e o amor na sociedade e participar do testemunho do Evangelho no país e no mundo.

Essa afirmação integra a atual Constituição da IECLB, aprovada no XXVII Concílio da Igreja, ocorrido nos dias 20 a 24 de outubro 2010 em Foz do Iguaçu/PR. A presença luterana no país, contudo, começou em 1824, com a vinda das primeiras levas de imigrantes alemães para Nova Friburgo/RJ e São Leopoldo/RS.

Não usem “luterano”

“Antes de tudo, peço que se silencie do meu nome e não se chame de luterano. Quem é Lutero? A doutrina não é minha... Vamos eliminar os nomes partidários e nos chamarmos de cristãos. Eu não sou e nem quero ser mestre de ninguém.” Apesar do desejo expresso do reformador Martim Lutero (1483-1546) de não ligar a sua pregação ao termo luterano, o termo acabou sendo usado para definir as igrejas que surgiram a partir da Reforma.

Na verdade, somente a partir de 1580 se aceitou o termo “luterano”. Ela foi introduzida por teólogos contemporâneos de Roma no intuito de qualificar de herético e sectário o movimento da Reforma. Foi uma autodeterminação ativa, mas sempre com a adição de “aqueles que escutam a Cristo” ou “os seguidores do Evangelho”.

Três séculos depois, a igreja “das pessoas que escutam a Cristo”, ou a igreja “dos seguidores e das seguidoras do Evangelho” no Brasil era batizada com esse nome, por estar vinculada pela fé às igrejas do mundo que confessam Jesus como Senhor e Salvador.

Um dia tinha que chegar ao Brasil

A história da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) tem relação com a miséria de grandes populações europeias ao longo do século XIX. (...) O êxodo rural, a industrialização, as reformas agrárias fracassadas, o crescimento desenfreado dos centros urbanos, o colapso da agricultura em consequência da importação de produtos produzidos a custos bem inferiores na Austrália, na Argentina e nos Estados Unidos da América do Norte – tudo isso levaram famílias europeias a refazerem a sua vida em outros continentes. O sonho por um pedaço de terra nas Américas foi a mola propulsora que levou milhões de pessoas a migrar.

A crise e a situação social na Europa trouxeram ao Brasil as pessoas mais pobres, motivadas e auxiliadas pelos próprios países. Dessa forma, a Europa procurou “livrar-se” de um problema que não sabia como resolver. Vieram, então, pessoas oriundas da Alemanha, Suíça, Holanda, Dinamarca, Noruega, Suécia, Áustria, Itália, Polônia, Rússia, Espanha, Portugal, entre outros países. Entre elas, estavam protestantes, luteranas, unidas, reformadas, valdenses, anabatistas.

A terra tão esperada não era o paraíso prometido. Assentados mato adentro, os grupos de imigrantes ficaram abandonados, sem recursos para o plantio, sem estradas, sem infraestrutura para necessidades como saúde, educação e expressão da vida religiosa. Devido à sua estrutura frágil, o sistema passou a usar a imigração para diversas finalidades: política de branqueamento de raça, estratégia de defesa de fronteiras, formação do exército nacional, construção e conservação de estradas, apoio a núcleos urbanos, mão de obra barata e criação de uma classe média.

Graças a acontecimentos mundiais, as famílias imigrantes puderam iniciar a sua própria vida religiosa no Brasil. Com o Padroado Régio, direito dado ao rei pelo papa, o Estado tinha o poder temporal e espiritual das terras conquistadas. No caso do Brasil, com a independência em 1822, foi mantido o antigo padroado português. Assim, quem mandava nas questões religiosas do país era o rei de Portugal. Em comum acordo com o rei da Inglaterra, no início do século XIX, a Constituição Imperial determinou que a religião oficial fosse a Católica Apostólica Romana, mas as demais igrejas seriam toleradas. Isso permitiu a entrada de outros credos no país, desde que não construíssem templos com torres e respeitassem o credo católico.

Foi assim que imigrantes luteranos e luteranas, basicamente oriundos e oriundas da Alemanha, trouxeram consigo pastores e criaram suas primeiras comunidades. Essas famílias foram assentadas principalmente no interior do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, dando origem às primeiras comunidades (Nova Friburgo/RJ e São Leopoldo/RS, em 1824). Por necessitarem organizar sua vida social praticamente a partir do nada, celebravam seus
cultos inicialmente em cabanas. Mais tarde, construíram as primeiras escolas, onde aos domingos também celebravam os cultos. Ao lado da escola arrumaram o espaço para o cemitério, já que não podiam fazer uso do cemitério público ou católico. Escolheram pessoas da comunidade para tarefas importantes, como educação e saúde. Prioritariamente, as comunidades voltavam-se para dentro de si mesmas, integrando também algumas pessoas de outros credos que ficavam mais isoladas.

Botando ordem na Igreja

Devido à sua história, a IECLB tem sido uma igreja de comunidades. Inicialmente, elas formaram o Sínodo Riograndense (1886). Mais tarde, outros sínodos surgiram: Sínodo Evangélico-Luterano de Santa Catarina, Paraná e outros Estados da América do Sul (1905), Associação de Comunidades Evangélicas de Santa Catarina e Paraná (1911) e Sínodo Evangélico Brasil Central (1912).

A principal função dos sínodos era representar a instituição religiosa perante as autoridades, criar mais unidade entre as diversas comunidades, desenvolver o trabalho entre crianças, jovens e mulheres, criar uma imprensa eclesiástica e acompanhar os novos grupos imigrantes. As comunidades luteranas não chegaram a ter presença majoritária no cenário político brasileiro, mas contribuíram fortemente com a educação, sendo o analfabetismo praticamente nulo entre as famílias de imigração luterana até a Segunda Guerra Mundial.

A partir das duas grandes guerras, as pessoas evangélicas de confissão luterana foram obrigadas a terem sua própria vida religiosa cada vez mais independente da Alemanha, que até então era seu escudo em todos os sentidos. Foi assim que o primeiro Concílio Geral, em 1950 em São Leopoldo/RS, decidiu pela criação da Federação Sinodal que, em 1968, constituiu a IECLB. Por meio do Concílio, a IECLB elegeu seu primeiro pastor presidente, Hermann G. Dohms, e esboçou seu plano e autocompreensão de igreja na seguinte declaração:

A Federação Sinodal é Igreja de Jesus Cristo no Brasil em todas as consequências que daí resultarem para a pregação do Evangelho neste país e a corresponsabilidade para a formação da vida política, cultural e econômica de seu povo. Esta Igreja é confessionalmente determinada pela Confissão de Augsburgo e Pequeno Catecismo de Luther, pertence à família das Igrejas moldadas pela Reforma de Martim Luther, e quando adotará em lugar de ‘Federação Sinodal’ a denominação de Igreja, o que esperamos para breve, exprimi-lo-á nesta mesma denominação. Como Igreja assim determinada confessionalmente, a Federação Sinodal se encontra na comunhão das Igrejas representadas no Conselho Ecumênico, as quais admitem o Evangelho de Jesus Cristo, que nos transmite a Sagrada Escritura como única regra diretriz da sua obra evangélica e de sua doutrina.

Com essa declaração, a IECLB passou a ser definitivamente uma igreja em continente latino-americano, com uma teologia voltada para sua realidade.

É claro que a transformação não aconteceu como um passe de mágica. As dificuldades que o país passou nos anos subsequentes, 1970 e 1980, com a ditadura militar, afetaram também a vida da igreja. Ela foi desafiada a resistir e a se pronunciar perante a realidade. Nesses anos, membros da IECLB se espalharam para outros estados, para as chamadas Novas Áreas de Colonização. Outros, à procura de emprego, migraram para as cidades maiores. Consciente de que o Evangelho acarreta consequências proféticas também para a política e a economia, a IECLB passou a formular posicionamentos e a criar trabalhos alternativos e missionários, como, por exemplo, com famílias agricultoras, povos indígenas e voltados à pastoral urbana.

Em 1997, a igreja optou por suprimir as unidades regionais e distritais e instituiu uma estrutura com 18 sínodos. De lá para cada cá, busca cumprir com sua missão por meio de aproximadamente 700 mil membros. Possui cerca de 900 ministros e ministras, entre pastores, pastoras, catequistas, diáconos, diáconas, diaconisas, missionários e missionárias, que exercem seu ministério ordenado de forma compartilhada. A igreja conta com diversos departamentos, coordenações e instituições em âmbito nacional. A grande parte dos trabalhos que desenvolve é realizada voluntariamente por membros das comunidades, de jovens a pessoas idosas.

“Ah! Que coisa mais linda, tão cheia de graça”

O símbolo da IECLB foi criado em 1969, para ser lançado na 5ª. Assembleia da Federação Luterana Mundial. A Assembleia da FLM deveria ter sido realizada em Porto Alegre/RS, em 1970, mas por causa da difícil situação sócio-política brasileira, ela foi transferida para Evian, na França. Somente a partir de 1972, o símbolo passou a ser oficial na IECLB. Veja o seu significado:

A CRUZ, colocada sobre o globo, quer lembrar que Cristo é o Senhor do mundo. Ele está acima de tudo e de todos. Todos e todas lhe devem obediência. A cruz vazia lembra que Cristo morreu por cada um e cada uma de nós, mas está vivo e seus ensinamentos querem ser vividos no dia a dia.

O GLOBO mostra que os ensinamentos de Cristo devem ser divulgados em todos os lugares da terra. Nós fazemos parte desse mundo e, assim, também somos responsáveis pelo que acontece de bom e de ruim.

O CONTORNO imitando as colunas do Palácio da Alvorada em Brasília, que envolve o globo e a cruz, aponta que a mensagem de Cristo quer ser vivida no Brasil e quer nos ajudar a enfrentar, diariamente, os problemas nacionais.

O símbolo da IECLB ajuda a identificar os locais onde a igreja de confissão luterana está presente no Brasil.

Quem são nossos irmãos luteranos e nossas irmãs luteranas?

O crescimento das igrejas luteranas nos anos posteriores ao período da Reforma foi muito grande. Um dos motivos foi que, em 1817, o governo na Alemanha impôs a união de comunidades luteranas e reformadas calvinistas. Muitas não aceitaram essa imposição, formando igrejas independentes, de cunho marcadamente confessional, em outros países. Entre os séculos XVI e XVII, o luteranismo já estava presente em países como a Dinamarca, a Noruega, a Suécia, a Finlândia, entre outros.

Na metade do século XIX (cerca de 1840), um grupo de imigração alemã, da Saxônia, foi para a América do Norte. Sendo luterano, logo se preocupou em fundar uma igreja na nova terra. Assim, em 1847 foi constituída a Igreja Luterana – Sínodo de Missouri, fundada no estado de Missouri, nos Estados Unidos. Esta igreja cresceu rapidamente e logo desenvolveu atividades missionárias em outros países, como Canadá, México, Índia Coreia, Japão, Nigéria e Brasil.
No início do século XX, chegou ao Brasil o pastor Christian J. Broders, enviado pela Igreja Luterana – Sínodo de Missouri. Ele fundou, no dia 1º de junho de 1900, com 17 famílias, a Comunidade Evangélica Luterana São João, na Colônia São Pedro, em Morro Redondo, a 40 km de Pelotas/RS.

Luteranos e luteranas da Igreja Luterana – Sínodo de Missouri deram assistência às famílias imigrantes alemãs. Estas, por sua vez, formaram outra organização eclesiástica, que seguiria caminhos próprios e que hoje leva o nome de Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB). Em 1904, no dia 24 de junho, foi fundada, em São Pedro do Sul/RS, com a presença de 14 pastores, um professor e dez pessoas leigas, representando dez congregações com aproximadamente três mil membros, a Igreja Evangélica Luterana do Brasil.

A IELB se desenvolveu e ampliou suas atividades para todos os estados do Brasil. Além disso, a IELB iniciou a missão no Paraguai (hoje já igreja-irmã) e em Portugal.

Apesar das divergências doutrinárias, tanto a IECLB quanto a IELB têm em comum o mesmo povo de imigrantes e seus e suas descendentes.

Referências

FISCHER, Joaquim. Ensaios luteranos: dos primórdios aos tempos atuais do luteranismo no Brasil. 3.ed. São Leopoldo: Sinodal, 1986.
ESCOLA SUPERIOR DE TEOLOGIA. Instituto Ecumênico de Pós-Graduação. Estudos Teológicos, nº 1, 1994, ano 34.
BRAKEMEIER, Gottfried (Ed.). Presença luterana - 1990. São Leopoldo: Sinodal, 1989.
DREHER, Martin N (Coord.). Reflexões em torno de Lutero. vol.2. São Leopoldo: Sinodal, 1984.
Portal da IECLB


Esse estudo é parte integrante do volume 3 da Coleção Palavração denominado “Graça e Fé: temperos para a vida”, publicado originalmente em 2003 pelo Departamento Nacional para Assuntos da Juventude da IECLB – DNAJ, sob a coordenação de Cláudio Giovani Becker e impresso por Contexto Gráfica e Editora (ISBN 85-89000-14-1).


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