Nos últimos anos o tema da diversidade religiosa tem ocupado muitos espaços de discussão, reflexão e pesquisa. Uma das razões para isso é o aumento da violência baseada na fé, ou, em outras palavras, da violência religiosa. Este tipo de violência se caracteriza por qualquer atitude desrespeitosa contra a religião, como por exemplo, ironizar, debochar, ridicularizar a crença religiosa da outra pessoa. Ela também pode se manifestar como violência física. Em alguns casos, a violência religiosa se expressa no desrespeito ao espaço sagrado do outro e da outra, através de pichações das casas de culto e destruição de símbolos religiosos.
A intolerância religiosa acompanha o Brasil desde sempre. Nos primeiros anos de colonização, a intolerância religiosa foi contra as diferentes culturas indígenas. As reduções indígenas foram uma maneira encontrada para conduzir as populações indígenas na fé correta, no caso, a fé cristã.
Posteriormente, com a chegada dos povos africanos, a intolerância religiosa se manifestou contra as religiões de matriz africanas, vistas como demoníacas. Mais tarde, com a chegada de imigrantes protestantes, entre eles luteranos e luteranas, a intolerância religiosa novamente se fez presente. São conhecidos os relatos de luteranos e luteranas que descrevem as discriminações que sofriam por causa da fé.
Estamos acostumados e acostumadas a ouvir e ver a utilização da bíblia como forma de afirmações de verdades absolutas. Geralmente, as pessoas procuram utilizar a Bíblia para desmerecer a crença da outra pessoa e para afirmar a sua como a única e verdadeira forma de crer em Deus. No entanto, a Bíblia é o livro que nos aponta para um projeto de humanidade em que é possível a convivência com as diferentes formas e expressões de vida, de culturas e de fé.
Já no Antigo Testamento é possível identificar textos que indicam que Deus não pretendia um mundo uniformizado, dominado por um único poder e por uma única cultura ou por uma única expressão religiosa. Este é o caso do Texto de Gêneses 11.1-9.
Outra história que aponta para um projeto de diversidade é a história de Noé. Ao final do dilúvio, Deus estabelece uma aliança com todos os seres vivos da terra. Ao estabelecer a Aliança, Deus não estabelece um modo de vida específico. Ao contrário, reafirma apenas que a Aliança vale para todos os seres que vivem sobre a terra.
No Livro do Profeta Isaías 56.7 Deus anuncia: A minha casa será casa de oração de todos os povos.
Muitos textos bíblicos do Novo Testamento apontam o diálogo como a ponte que contribui para que as pessoas se compreendam mutuamente.
Um dos discursos mais conhecidos de Jesus é o Sermão do Monte, onde encontramos as Bem-aventuranças (Mateus 5.1-12). Neste discurso, Jesus não fala da exclusividade de uma fé em relação a outra. Ao contrário, Jesus remete à coerência na aliança com Deus: prática da justiça, misericórdia, mansidão.
Em Mateus 28.19, Jesus conclama os discípulos a viver e testemunhar o Evangelho para todos os povos. É tarefa dos discípulos e discípulas compartilhar o que Jesus ensinou. A partilha da mensagem não acontece por meio da dominação e nem através da conversão à força, mas acontece através da postura da prática do amor ao próximo. A postura de como relacionar-se com pessoas de outras expressões de fé e de outras culturas é indicada pelo próprio Jesus: João 4.5-42 e 14.2.
O diálogo com outras expressões de fé é uma ameaça à nossa própria fé?
Muitas pessoas dizem que sim. Algumas são contra o diálogo entre diferentes religiões por acreditarem que este diálogo poderia afastá-las de sua crença. É o medo que faz com que essas pessoas se fechem para o diferente. Entretanto, apenas estará pronta para o diálogo aquela pessoa que tiver abertura para conhecer a sua própria religião. O diálogo é uma forma de nos conhecermos melhor enquanto Igreja. O diálogo não nos afasta de nossa fé, ao contrário, ele nos aproxima. Quanto mais abertura tivermos para conhecer a diversidade que nos rodeia, mais nos conheceremos. Experimente fazer essa aventura.
Pa. Romi Márcia Bencke Secretária Geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC)
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