A dependência química é um dos problemas mais complexos na atualidade pela dificuldade de compreensão das causas, de tratamento que sejam eficazes e pelo impacto quase irreversível causado na estrutura familiar e na sociedade.
Ninguém inicia o uso de drogas sendo dependente. Mas isso se dá de forma progressiva e, muitas vezes, fatal. Inicia-se o uso de substâncias psicoativas1
por curiosidade, por revolta, buscar algum tipo de alívio, seja para preocupações, problemas ou por dificuldade de enfrentar as adversidades com as quais precisa lidar.
Quando se fala do uso de substâncias psicoativas devemos levar em consideração que cada substância possui propriedades farmacológicas e circunstâncias sociais próprias, e essas particularidades é que vão definir o perfil do dependente químico. Cada usuário irá se identificar com um tipo de droga e seus efeitos, e até mesmo com locais e grupos de uso.
O álcool, por exemplo, surge como a solução para muitas dificuldades e resolução de problemas. Ele está intimamente ligado à ideia de relaxar, após um dia cansativo de trabalho. E isso não apenas aparece na mídia, mas é fato em muitas famílias. Em muitas famílias, o álcool é utilizado como principal recurso na mediação de conflitos ou interação social.
Quando uma família entende o processo de recuperação dela e de seu dependente ela tende a criar mecanismos para fortalecer suas relações ajudando desta forma o dependente. Para isso a família também necessita de apoio, informação e diálogo. Quando os vínculos sociais e familiares são desfeitos, podem acontecer emoções negativas, causando, muitas vezes, rompimento e esvaziamento de vínculos e, em consequência, a insignificância da própria vida. A família saudável não é isenta de problemas, mas tem potencial para encontrar alternativas na solução de conflitos, conseguindo reduzir os efeitos destrutivos e potencializar seus ganhos.
Qualquer pessoa que tenha convivido com um dependente de álcool ou drogas sabe, por experiência própria, como essa convivência é capaz de causar grande sofrimento. E esse convívio atinge uma dimensão tão patológica quanto o dos dependentes químicos. Para tanto, os grupos, sejam terapêuticos, de convívio ou de igrejas são fundamentais, tanto no tratamento dos dependentes em recuperação, quanto no tratamento da família.
Muitas vezes a Igreja não se envolve nos problemas relacionados à dependência química. Segundo Evans2 existe uma idéia de que problemas com álcool e com drogas estejam fora e não dentro das comunidades da igreja. A negação é implacável. Para ela a Igreja e seus líderes estão claramente entre os afligidos, quando não entre os dependentes. “Uma das tragédias da Igreja contemporânea é o mito de que, se sua vida está realmente arruinada, é melhor que você se mantenha longe da Igreja, porque ela é para as pessoas “boas”. A infelicidade é que frequentemente os cristãos desenvolvem uma atitude de julgamento em relação às outras pessoas, provocando nelas uma terrível sensação de culpa.
A igreja muitas vezes se omite do seu papel acolhedor e não dá a devida importância a sua função de ser terapêutica. Justamente por poder tratar do problema com imparcialidade e sob todos os aspectos, quer dizer, ver o ser humano como um ser integral, amado por Deus é que ela tem grande possibilidade, não apenas de ajudar o dependente, mas também de acolher e orientar a família com o problema da dependência. Só a igreja pode ter aceitação incondicional a partir do exemplo de amor e do evangelho de Jesus Cristo. O amor a Deus e de Deus possibilita o amor ao
próximo. Isso deve se refletir na ação diaconal e acolhedora da igreja.
Por outro lado, na maioria das vezes, a atuação da igreja frente à questão da dependência química fica limitada pela falta de conhecimento, em todos os sentidos. Conhecimento este sobre os aspectos pertinentes à dependência e sua consequências, seja no indivíduo, seja na sua família. Essa falta de conhecimento se reflete também nos membros, que têm medo de se envolver ou de falar de seu problema, ou mesmo de ajudar outros pelo preconceito que ainda existe.
A igreja é em primeira instância, espaço de perdão que possibilita a cura, principalmente das relações, seja familiares e sociais ela deve assumir essa
tarefa perante a sociedade oferecendo esse seu dom a serviço do ser humano e do Reino de Deus.
É da igreja, da família e da sociedade, a tarefa de colaborar na manutenção da sobriedade, bem como entender a dimensão do problema da dependência química e promover a prevenção proporcionando participação em grupos e um ambiente acolhedor. A dependência química não é um problema isolado, mas um problema social e de saúde pública. Portanto, responsabilidade de todos.
Que possamos ser uma igreja diaconal, que cuida, acolhe, partilha e caminha junto, como o fez e nos ensinou o próprio Cristo, conforme podemos ler em Lc 24.13-27. Que possamos aprender a sermos transparentes e acolhedores para sermos capaz de estender a mão para curarmos uns aos outros, e vivermos em comunhão com o nosso Deus.
Notas:
1 Termo usado para definir drogas as quais engloba todas as substâncias que quando usadas alteram o estado de funcionamento do organismo.
2 EVANS, Abigail Rian. O Ministério Terapêutico da Igreja: Programas práticos para Ministérios da Saúde. São Paulo: Edições Loyola. 2002. p. 190
Diácona Ms. Méris Gutjahr
Balneário Piçarras - SC