Auxílios Homiléticos - Proclamar Libertação



ID: 2911

Tiago 3.1-12

Auxílio Homilético

12/09/2021

 

Prédica: Tiago 3.1-12
Leituras: Isaías 50.4-9a e Marcos 8.27-38
Autoria: Claudete Beise Ulrich
Data Litúrgica: 16° Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 12/09/2021
Proclamar Libertação - Volume: XLV

Use sua língua corretamente:
falar e agir com responsabilidade e solidariedade

1. Introdução

Os textos para o 16º Domingo após Pentecostes apresentam reflexões sobre o poder da língua, um membro do corpo humano que articula a fala, a comunicação. A língua tem várias funções, além de expressar pensamentos, posições, reflexões. É um órgão sensorial que percebe a conformação, a dimensão, a textura, a temperatura e o sabor dos alimentos. Além de ser um órgão muscular que auxilia o movimento dos alimentos dentro da cavidade bucal, inicia a deglutição e participa da linguagem, articulando as palavras durante a fala. Ela é, portanto, um órgão do corpo humano muito importante.

O texto de Isaías 50.4-9a nos diz que Deus deu ao profeta língua de eruditos, para que saiba dizer boa palavra ao cansado. A finalidade de ter língua de eruditos é dirigir palavras às pessoas que estão cansadas, sofridas e sobrecarregadas.

A narrativa de Marcos 8.27-38 nos conta da confissão de Pedro, quando ele responde à pergunta que Jesus dirige a seus discípulos: Quem dizem que sou eu? Depois de várias respostas, Jesus pergunta novamente: Mas vós, quem dizeis que eu sou? Pedro confessa: Tu és o Cristo. Jesus os advertiu de que a ninguém dissessem tal cousa a seu respeito. Jesus deixa claro aos discípulos que será preso, torturado e morto devido ao anúncio e à prática da Palavra. Falar do reino de Deus é perigoso. Jesus colocou-se ao lado das pessoas cansadas, anunciou boa palavra a elas e isso significou perseguição e morte de cruz. Qual é o projeto que anunciamos? Ao lado de quem nos colocamos?

O texto da Carta de Tiago 3.1-12 é o previsto para a prédica. Ele fala do poder da língua e como ela necessita ser controlada. A pergunta que se faz: como será que a fala/a língua estava sendo utilizada na comunidade para a qual Tiago se dirige? Por que Tiago se refere à língua como pequeno órgão, se gaba de grandes cousas. Vede como uma fagulha põe em brasas tão grande selva! (Tg 3.5)? O que estava se passando na comunidade para a qual Tiago se dirige?

2. O texto de prédica

2.1 Destinatários da Carta de Tiago

O autor da carta dirige-se aos destinatários como irmãos e com alegria. Tiago, servo de Deus e do Senhor Jesus Cristo, às dozes tribos que se encontram na dispersão, saudações. Meus irmãos, tende por motivo de toda alegria o passardes por várias provações, sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança. Ora a perseverança deve ter ação completa, para que sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes (Tg 1.1-3). A carta foi escrita, possivelmente, ao final do primeiro ou princípio do segundo século. Ela se destina às 12 tribos que se encontram na diáspora (1.1), isto é, se dirige a migrantes. O autor se coloca ao lado desses irmãos que se encontram na diáspora, pois diz: Meus irmãos. É um sinal de solidariedade. O autor se solidariza com esses migrantes que são, em sua grande maioria, pobres ou muito pobres (TAMEZ, 1985, p. 49).

Ele também é o único que saúda a comunidade e utiliza a palavra chairein na saudação. Tiago escolhe a saudação comum do mundo grego, a qual se traduz por “ser feliz, ter alegria”. O autor abarca em sua carta – Deus e Jesus Cristo – como que mostrando essa continuidade do Antigo Testamento (referências ao Êxodo, Gênesis, Isaías) e do Novo Testamento (especialmente Mateus, Marcos, Atos). Isso indica que ele era judeu que conhece o Antigo Testamento e a tradução rabínica e era um cristão (cita vários dizeres de Jesus, e fala das práticas da igreja primitiva; TAMEZ, 1985, p. 22). Importante destacar que ele não se apresenta como apóstolo (Paulo assim se apresenta), mas sim como servo/escravo de Deus e do Senhor Jesus Cristo (TAMEZ, 1985, p. 49) e com alegria e perseverança quer servir “a comunidades cristãs que sofrem marginalidade e desprezo nas sociedades onde vivem” (TAMEZ, 1985, p. 49). Entender a saudação é fundamental para entender também o texto para a pregação neste domingo.

2.2 Reflexões exegéticas

O pastor Günter Adolf Wolff refletiu o presente texto, no volume 36 de Proclamar Libertação, também para o 16º Domingo após Pentecostes, no ano de 2012. Ele sugeriu a seguinte divisão, a qual reproduzo aqui, pois nos ajuda a entender como ele foi construído:

v. 1-2 – só quem é um verdadeiro mestre não tropeça no falar;
v. 3-5 – exemplificações sobre pequenas coisas que se tornam grandes catástrofes ou grandes bens;
v. 6-8 – a língua é fogo;
v. 9-10 – com a língua bendizemos e amaldiçoamos;
v. 11-12 – a língua como contradição entre fé e vida.

O texto de Tiago 3.1-12 está intimamente ligado a uma fé ativa no amor (Gl 5.6). Tiago 2.26 diz: [...] assim como o corpo sem espírito é morto, assim também a fé sem obras é morta. Tiago não se autodenomina nem apóstolo nem mestre. Em 3.1-2, ele diz: Meus irmãos, não vos torneis, muitos de vós, mestres, sabendo que havemos de receber maior juízo. Porque todos tropeçamos em muitas cousas. Se alguém não tropeça no falar, torna-se perfeito homem, capaz de refrear todo o corpo. Tiago aponta para a interligação de todos os membros. Todo o falar necessita ser coerente com o agir. A língua necessita ser domada, freada, pois também ela pode se tornar um mal mortífero. Isso porque, dependendo do que falamos, podemos produzir uma fogueira, isto é, criar confusão, divisão. A questão toda é: conseguimos ser responsáveis com as nossas falas? A sabedoria está no equilíbrio entre o falar e agir, em assumir responsabilidade com aquilo que é dito. Os falsos mestres fazem uso da língua sem sabedoria, sem compromisso, sem solidariedade, sem responsabilidade, utilizando-se de falsas notícias para dividir a comunidade. Como já anotamos, Tiago está na continuidade da mensagem do evangelho: Porque a boca fala do que o coração está cheio (Mt 12.34b). A pergunta que nos é colocada é: do que o nosso coração está cheio? Como cristãos e cristãs, somos chamados e chamadas a construir a paz, a justiça social, relações amorosas, e a romper com as estruturas da mentira, desigualdade social e morte.

Os v. 3-5 falam dos freios que são colocados na boca dos cavalos para obedecerem, e assim também o corpo é dirigido. Assim também os navios, mesmo sendo grandes e batidos por fortes ventos, são dirigidos por um pequeno leme para onde queira o impulso do timoneiro. A língua é colocada como um pequeno órgão que se gaba de grandes coisas. O autor então faz a comparação: Vede como uma fagulha põe em brasas tão grande selva! (v. 5). Portanto palavras mal ditas podem levar ao desastre, a um incêndio, a uma devastação da vida, assim como também uma fagulha pode incendiar uma grande floresta.

A língua é fogo, diz o v. 6, é mundo da iniquidade, a língua está situada entre os membros de nosso corpo, e contamina o corpo inteiro, e não só põe em chamas toda a carreira da existência humana, como também é posta ela mesma em chamas pelo inferno. Portanto a língua é como o fogo que pode contaminar toda ação e existência do ser humano. Nos versículos seguintes, v. 7-8, o autor diz que todas as espécies de feras, de aves, de répteis e de seres marinhos têm sido domadas pelos seres humanos. A língua, porém, nenhum ser humano tem sido capaz de domar. É um mal incontido, carregado de veneno mortífero.

Tiago também aponta para a incoerência na vida das pessoas e das comunidades e mostra como a língua é mal usada: Com ela, bendizemos ao Senhor e Pai, também com ela, amaldiçoamos os seres humanos, feitos à semelhança de Deus. Não é possível bendizer a Deus e amaldiçoar a pessoa próxima. 1 João 4.21 lembra o mandamento que temos por parte de Jesus Cristo: [...] aquele que ama a Deus ame também a seu irmão.

O v. 10 diz que de uma só boca procede bênção e maldição. Meus irmãos, não é conveniente que estas cousas sejam assim. Tiago então faz uso de elementos da natureza para afirmar que isso não é possível. Nos v. 11 e 12 são utilizados como exemplos a água e árvores frutíferas. O v. 11 assim diz: Acaso, pode a fonte jorrar do mesmo lugar o que é doce e o que é amargoso? Já no v. 12 temos o seguinte: Acaso, meus irmãos, pode a figueira produzir azeitonas ou a videira, figos? Tampouco fonte de água salgada pode dar água doce. É difícil uma mesma fonte jorrar água doce e amarga, da mesma forma que uma figueira não pode produzir azeitonas, da mesma forma que uma videira produz uvas e não figos.

O tema do falar já tinha aparecido anteriormente a este texto em Tiago 1.19: Todo ser humano, pois, seja pronto para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar. Em 1.26, o autor deixa claro o significado da religião e o uso da língua: Se alguém supõe ser religioso, deixando de refrear a língua, antes, enganando o próprio coração, a sua religião é vã. Religião tem a ver com o religar, isto é, religação com Deus e Jesus Cristo e inclui a religação com a pessoa próxima e a natureza. A língua é um membro fundamental do nosso corpo para verbalizar, expressar os pensamentos, para a comunicação e necessita ser usada para uma vivência correta da religião. O uso correto da língua/da fala encontra-se no âmbito da práxis da fé cristã (TAMEZ, 1985, p. 83). Falar mal uns dos outros é pecado. É necessário coerência entre o falar e agir na vida de fé. O apóstolo expressa o verdadeiro sentido da religião em Tiago 1.27: A religião pura e sem mácula, para com o nosso Deus e Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo.

3. Meditação

Trago inicialmente uma poesia de Mario Quintana e uma frase de Nelson Mandela.

Fere de leve a frase... E esquece... Nada
Convém que se repita...
Só em linguagem amorosa agrada
A mesma coisa cem mil vezes dita.
(Mario Quintana)

Se você falar com um homem numa linguagem que ele compreende, isso entra na cabeça dele. Se você falar com ele em sua própria linguagem, você atinge seu coração. (Nelson Mandela)

O texto de Tiago 3.1-12, no tempo histórico que estamos vivendo, com tanta desinformação, mentiras/fake news, questiona a cada um de nós pessoal e comunitariamente. Como nós irmãos e irmãs em Cristo estamos nos comunicando? O que a nossa língua tem expressado? Temos coragem para combater as fake news? Temos pesquisado para ver se as notícias que são transmitidas pelas mídias são verdadeiras? Como temos usado a nossa língua? O que falamos está a favor de qual projeto? Da paz e da justiça, das pessoas pobres, dos povos negros, dos indígenas, das mulheres, das crianças, das pessoas necessitadas, dos e das migrantes, das pessoas excluídas? Como temos educado a nossa língua e o nosso falar? 

A reflexão do texto de Tiago 3.1-12 torna-se fundamental numa época marcada por fake news. O que são fake news? São notícias falsas. Nós as reproduzimos com a nossa fala, bem como as enviamos via mídias sociais, especialmente, WhatsApp e Facebook. O que está acontecendo conosco, pessoas cristãs? Não temos mais o cuidado de verificar que aquilo que estamos transmitindo é verdadeiro ou falso?

O falar e o agir necessitam estar em coerência, em equilíbrio. Para podermos falar a verdade, precisamos ler, estudar, pesquisar, buscar conhecimento além da simples informação. Importante deixar claro que precisamos ser responsabilizados pelo nosso falar. Para evitar fake news/mentiras, necessitamos investir na formação/educação.

Cada pessoa tem a sua língua e necessita fazer uso respeitoso, responsável, ético, articulando palavras e pensamentos que conduzam para um projeto de vida que objetive a paz, a igualdade, o amor e a justiça social. É necessário ficar claro que o cristianismo, como religião, promove a vida em sua integridade: todas as vidas importam.

4. Subsídios litúrgicos

Confissão de pecados

Confissão pessoal e comunitária do mau uso da língua, do acreditar e espalhar fake news/mentiras, ou fazer fofocas.

Confissão pessoal e comunitária da falta de estudo, de pesquisa e de conhecimento sobre determinados temas. Mesmo assim, sem o devido conhecimento, emitimos opiniões sobre os mesmos.

Confissão pessoal e comunitária da falta da vivência de uma fé cristã que religa, que produz frutos de paz e justiça.

Perdão por todos os pecados que cometemos pelo mau uso da língua por meio do nosso falar.

Canto
Palavra não foi feita – LCI 609

Absolvição
Jesus Cristo diz: Bem-aventurados são os que ouvem a palavra de Deus e a guardam! (Lucas 11.28)

Kyrie eleison
Clamar por todas as pessoas que sofrem devido a fofocas, mentiras. Clamar por todas as pessoas trabalhadoras que não são consideradas nos projetos dos governos. Clamar pela natureza que geme de dores, sendo explorada sem dó nem piedade. Clamar por todas as pessoas que sofrem com violências, especialmente mulheres, crianças, pessoas negras e povos indígenas. 

Canto
Kyrie – Pelas dores deste mundo – LCI 56

Gloria in excelsis
Glorificamos a Deus por Jesus Cristo, que sempre anunciou o reino de Deus como proposta de uma nova sociedade de paz e justiça social. Glorificamos a Deus por todas as pessoas que “se emprenham” e colocam sinais do reino de Deus.

Canto

Glória

Oração geral da igreja
Intercedemos para que nossas palavras sejam verdadeiras e que nossa língua articule pensamentos e palavras que objetivem a construção de um mundo de amor, paz e justiça.
Intercedemos por todas as pessoas que sofrem, doentes. Intercedemos por todas as pessoas enlutadas, que sofrem porque tiveram que se despedir de uma pessoa querida.
Intercedemos pelos cientistas para que tenham sabedoria na criação de vacinas e remédios para a manutenção da saúde.
Intercedemos por todas as pessoas que trabalham na área da saúde.
Intercedemos pelas professoras e pelos professores.
Intercedemos pelas autoridades de nosso país, do estado e do município.
Intercedemos pelo cuidado de todas as famílias, para que eduquem seus filhos e suas filhas, para que falem a verdade e respondam por seus atos.
Intercedemos por nossa comunidade, para que dê testemunho do evangelho do reino de Deus e que todas as pessoas possam viver coerentemente no falar e no fazer.

Oração do Pai-Nosso

Bênção

Deus da vida, abençoa meu pensar e meu falar.
Jesus Cristo, companheiro de vida, abençoa meu agir em retidão.
Espírito Santo, ajuda-me a falar verdades e não mentiras,
a espalhar, em palavras e ações, a solidariedade e a misericórdia. Amém.

Sugestão de hinos
Arde a voz em meu peito – LCI 591
Palavra não foi feita – LCI 609
Ó que mil línguas eu tivesse – LCI 611

Bibliografia

TAMEZ, Elsa. A Carta de Tiago. São Bernardo do Campo: Imprensa Metodista, 1985.
WOLFF, Günter Adolf. 16º. Domingo após Pentecostes: Prédica: Tiago 3.1-12;
Leituras: Isaías 50.4-9a e Marcos 8.27-38. In: HOEFELMANN, Verner (Coord.). Proclamar Libertação 36. São Leopoldo: EST; Sinodal, 2012.
Disponível em: . Acesso em: 30 ago. 2020.


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Autor(a): Claudete Beise Ulrich
Âmbito: IECLB
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo do Tempo Comum
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 16º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Tiago / Capitulo: 3 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 12
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2020 / Volume: 45
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 64880

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