Prédica: João 1.29-42
Leituras: Isaías 49.1-7 e 1 Coríntios 1.1-9
Autoria: Joel Haroldo Baade e Aline Danielle Stüewer
Data Litúrgica: 2º. Domingo após Epifania
Data da Pregação: 15/01/2017
Proclamar Libertação - Volume: XLI
Fé, testemunho e vida em Jesus
1. Introdução
Estamos no 2º Domingo após Epifania. Celebramos a revelação de Jesus como Filho de Deus. Jesus dá-se a conhecer. Essa sua revelação acontece em diferentes situações. Jesus revela-se como Filho de Deus ao profeta João Batista. Ao encontrar Jesus, João Batista reconhece-o como o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo. Ao reconhecer o Filho de Deus, João Batista testemunha a todas as pessoas que Jesus é aquele que batiza com o Espírito Santo. Seu testemunho faz com que pessoas comecem a seguir Jesus.
O texto de Isaías fala da escolha do Servo do Senhor e da sua tarefa de testemunhar a glória de Deus a todos os povos, para que esses reconheçam seu nome e poder. No texto de 1 Coríntios, o apóstolo Paulo escreve às pessoas que adoram Jesus como Senhor. Ele explica que foi chamado pelo próprio Deus para ser apóstolo de Cristo. Ainda ressalta que, por estarem unidos com Cristo, a mensagem do evangelho tem sido anunciada por intermédio de suas vidas.
Os três textos enfatizam o compromisso que temos de testemunhar, em palavras e ações, nossa fé em Jesus ao reconhecê-lo como o Messias, Filho de Deus. Ao reconhecer Jesus como tal, nossa missão é espalhar essa notícia para que mais pessoas possam segui-lo.
2. Exegese
O Evangelho de João destina-se, em sua forma final, a uma comunidade gentílico-cristã, mas cuja origem está em uma comunidade judaico-cristã. A explicação detalhada de costumes judeus e a tradução de nomes são evidência disso (veja, por exemplo, Jo 1.41,42). Diferentemente dos sinóticos, que apresentam uma narrativa mais histórica, João tem uma organização mais temática e possui uma redação com reflexões mais elaboradas. A data de redação deve ser situada entre os anos 100 e 110. O local de origem deve ser localizado na Ásia Menor (especialmente Éfeso) ou na Síria (BULL, 2009).
O Evangelho de João tem a seguinte estrutura básica:
1.1-18: Prólogo (hino do Logos)
1.19-51: O Batista como testemunha do revelador, vocações dos discípulos
2.1-12.50: A revelação de Jesus diante do mundo
13.1-17-26: A revelação de Jesus diante dos seus
18.1-20.29: A elevação e glorificação do revelador (paixão e ressurreição)
20.30s: O propósito do evangelho
21.1-25: Capítulo acrescido pela redação (BULL, 2009, p. 47).
Quanto à teologia, João “faz uso constante de afirmações dualistas. Luz e trevas, em cima e embaixo, o ‘mundo’ distante de Deus e o enviado e revelador de Deus e ‘os seus’ são confrontados entre si” (BULL, 2009, p. 48). É preocupação central do evangelho a correta compreensão de Cristo frente às interpretações errôneas, sendo que a vida eterna depende de um relacionamento coerente com Jesus Cristo (LADD, 2003, p. 356).
O texto da prédica deste domingo está inserido no bloco que trata do Batista como testemunha do revelador e das vocações dos discípulos. O propósito dessa parte é estabelecer a relação entre Jesus e João Batista, mas, ao mesmo tempo, diferenciar ambos. Afirma-se expressamente que João Batista não é o Messias (1.20). Ao contrário, o Batista é precursor e subalterno daquele que vem. Jesus é apresentado como o “Cordeiro de Deus” (1.29,36) e como aquele que tem o Espírito Santo (1.32). O Batista batiza com água, mas Jesus batiza com o Espírito Santo (v. 33) (BULL, 2009).
João 1.29-42 retrata duas cenas distintas do testemunho de João Batista a respeito de Jesus. Na primeira (v. 29-34), João esclarece a respeito do propósito de seu próprio trabalho, que é preparar o caminho do Senhor, batizando com água; depois sinaliza para o caráter próprio do trabalho do Jesus, o Cordeiro de Deus, que já caminha diante dele, que batizará com o Espírito Santo. Na segunda parte do texto da prédica (v. 35-42), fala-se de outro encontro de João e Jesus, em que André e Pedro, dois dos discípulos de João, passam a seguir Jesus.
Para uma análise mais detalhada do texto, faz-se a seguir uma comparação entre as versões Almeida Revista e Atualizada com comentários de Lutero (ARA), Nova Tradução na Linguagem de Hoje (NTLH), Pastoral e Jerusalém. ARA subdivide a perícope de João 1.29-42 em três partes: v. 29-31 (João Batista torna a repetir seu testemunho); v. 32-34 (O batismo de Jesus); v. 35-42 (Dois discípulos de João Batista seguem Jesus). NTLH prefere v. 29-34 (O Cordeiro de Deus) e v. 35-42 (Os primeiros discípulos de Jesus). A versão Pastoral adota v. 29-34 (A testemunha reconhece o Salvador) e v. 35-51 (As testemunhas apontam o Salvador). A versão de Jerusalém, por sua vez, emprega apenas v. 19-34 (O testemunho de João) e v. 35-51 (Os primeiros discípulos). As diferenças evidenciam as ênfases teológicas subjacentes a cada versão, mas parece claro que os v. 29-34 constituem uma unidade, em que se apresenta o testemunho de João Batista a respeito de Jesus como Cordeiro de Deus (v. 29), o primogênito (v. 30), o que possui o Espírito Santo (v. 33), ou seja, o próprio Filho de Deus (v. 34) em contraposição a João, que é apenas uma testemunha do que vem (v. 30-31). A referência ao batismo de Jesus por ARA (v. 32-34) pretende mais um paralelo com os sinóticos (Mt 3.13-17; Mc 1.9-11; Lc 3.21-22), pois não se menciona explicitamente o batismo, apenas a presença do Espírito Santo expressa pela pomba. A partir do v. 35, por sua vez, a ênfase recai sobre o chamado dos primeiros discípulos de Jesus.
V. 29-34: Deste bloco do texto pode-se destacar alguns elementos importantes para a construção da mensagem da prédica. Jesus é apresentado no v. 29 (e também depois no v. 36) como o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo. É Cristo quem carrega o pecado e purifica o ser humano para a nova vida. O dualismo joanino está presente aqui quando se contrapõe o mundo sem Jesus ao mundo com Jesus. Cristo representa uma ruptura entre o antes e o depois. Da mesma forma, João Batista coloca-se em posição distinta daquela que ocupa Jesus. Ele se compreende como o que falou a respeito do que virá, mas o Cordeiro (v. 29 e 36) é o próprio Jesus. Ele é o Filho de Deus (na versão de Jerusalém, fala--se no Eleito de Deus) e o Messias. Jesus é apresentado no v. 30 como o varão, segundo a versão ARA, ao passo que nas demais traduções fala-se em “homem” apenas. Ou seja, ele é o que já existia antes de João (v. 30b) como Logos ou Verbo (Jo 1.1) e, portanto, primogênito e herdeiro, o que tem mais direito. Lutero, em seu comentário sobre essa passagem, também acentua a importância central de Cristo como redentor, pois não apenas uma parte do ser humano careceria de salvação, mas ele completo. Dessa forma, a contraposição do rito com água como sinal do batismo e o batismo no Espírito Santo, ou seja, a vivência efetiva do batismo, constitui elemento central no texto.
V. 35-42: Neste trecho, apresenta-se a vocação dos primeiros discípulos. Face ao testemunho de João, dois de seus discípulos o deixaram e passaram a seguir Jesus. Primeiramente, eles o chamam de mestre (Rabi) (v. 38), mas o convívio, mesmo que breve (v. 39), logo os fez mudar sua concepção, pois quando André encontra seu irmão Simão, já se refere a Jesus como Messias. Esta é uma informação preciosa para a mensagem: o reconhecimento de Jesus como o Cristo não acontece como que por um passe de mágica, mas se dá pelo convívio com ele. Por fim, ocorre o primeiro encontro de Jesus com Simão, a quem passa a chamar de Cefas, que é a versão em aramaico da palavra grega petra, de onde vem Pedro.
3. Meditação
Hoje somos lembrados de que Jesus é o Filho de Deus, o Messias, nosso Salvador. O profeta João Batista reconhece e testemunha que Jesus é o “Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”. Jesus Cristo é o prometido de Deus, que veio ao mundo para nos mostrar quem é Deus e aproximar-nos dele.
Ao reconhecer quem era esse simples carpinteiro que veio a seu encontro, João Batista fala a todas as pessoas a respeito desse homem que veio mudar a história do mundo e a nossa história. João Batista não pode simplesmente guardar para si a alegria dessa descoberta. O mundo precisa saber. As pessoas precisam conhecer o Filho de Deus.
Quando reconhecemos Jesus como Senhor e Salvador de nossas vidas, não conseguimos guardar essa alegria, mas nos sentimos impulsionados a testemunhar essa verdade. A alegria em reconhecer em Jesus aquele que batiza com o Espírito Santo e transforma nossas vidas é tão grande, que sentimos a necessidade de compartilhá-la com o mundo.
Vivemos em uma sociedade que necessita conhecer o Filho de Deus. Como temos testemunhado nossa fé em Jesus? Temos falado de Jesus às pessoas? Somos chamados a falar a todas as pessoas à nossa volta quem é esse Jesus. Esse testemunho não pode ser feito somente em palavras, mas nossas vidas devem revelar nossa fé.
Cada vez mais, temos visto pessoas colarem adesivos em seus carros dizendo: Jesus Cristo é meu Salvador; Jesus Cristo é Rei; Jesus Cristo é Senhor. São tantas as pessoas que falam de Jesus, mas tão poucas as que realmente o reconhecem como Senhor e Salvador. Se realmente todas as pessoas que falam de Jesus o reconhecessem como Filho de Deus, haveria menos injustiça, violência e guerras. Reconhecer Jesus como o “Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”, é buscar viver seus ensinamentos, para que o mundo o conheça através de nossas vidas.
Reconhecer Jesus como Filho de Deus é muito mais do que frequentar uma igreja; é ser igreja. Somos chamados a não só falar de paz, mas viver a paz; não só falar de amor, mas viver em amor; não só falar de justiça, mas praticar a justiça; não só falar do amor de Deus, mas viver esse amor.
4. Imagens para a prédica
O dualismo pode ser um recurso didático interessante para contrapor a realidade proporcionada pela vida em Cristo em oposição aos que se deixam governar pelas regras deste mundo. O batismo em Cristo e, portanto, a recepção do Espírito Santo a ele associado poderiam constituir elementos importantes da mensagem à comunidade. E essa vivência do batismo, que é a vida com Jesus, é também condição para que ele seja reconhecido como o Cristo.
A estória a seguir ilustra o que decorre do seguimento de Jesus.
No corre-corre do dia a dia, algumas pessoas que se dirigiam a um terminal rodoviário esbarraram numa menina que vendia maçãs próximo à entrada do terminal, ao lado de um belo canteiro de jardim.
Derrubaram sua cesta de maçãs, esparramando-as pelo chão, mas não se importaram... estavam todos com muita pressa...
Somente um homem parou para ajudar a pequena vendedora. Ao começar a recolher as frutas, ele percebeu que ela era cega.
Gentilmente ajudou-a a levantar a cesta e a ajuntar as maçãs. Ao ficar, verificou que várias de suas frutas se estragaram na queda, a menina ficou visivelmente apreensiva:
– Minha mãe vai ficar muito triste.
– Não se preocupe, minha querida, disse-lhe o homem, eu pago as maçãs que estragaram.
Pagou e despediu-se dela, mas, quando estava partindo, ela o chamou e perguntou:
– Moço, é você que é Jesus?
O homem parou, voltou-se para trás e respondeu:
– Não, minha querida, mas sou um dos amigos dele.
(Autor desconhecido)
5. Subsídios litúrgicos
Sugestão de hino: HPD 2 – 466: Anunciar as maravilhas do Senhor.
No momento do envio, enfatizar que Jesus nos envia ao mundo para testemunhar seu amor. A palavra ouvida não pode ser guardada, precisa ser vivida e testemunhada.
Bibliografia
BULL, Klaus-Michael. Panorama do Novo Testamento: história, contexto, teologia. São Leopoldo: Sinodal, 2009.
LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2003.
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