Advento - Natal - Epifania



ID: 2655

Apocalipse 3.14-22 - Cristianismo indeciso?

Prédica

05/12/1948

CRISTIANISMO INDECISO?
Apocalipse 3.14-22 

Conhecemos aquelas palavras do nosso Catecismo que nos ensinam que Cristo há de vir para julgar os vivos e os mortos. Cristo é o juiz que julgará a todos os homens, e nós todos vamos de encontro a esse julgamento, onde Ele pronunciará a última, a definitiva palavra sobre nós. 

Se isso é assim, então a nossa vida não tem o seu sentido e o seu valor em si mesma. O que somos em verdade, não depende de nossa própria opinião, do juízo que formamos de nós mesmos, mas depende da palavra que o Senhor no seu dia há de dizer sobre nós. Isso, porém, não quer dizer que nós não devemos examinar-nos, procurar conhecer a nossa situação, e procurar saber o que somos. Ao contrário, faz parte da vigilância cristã, que tanto nos é recomendada, que sejamos vigilantes também quanto a nós mesmos, que não nos deixemos levar, mas que nos demos conta da direção do nosso caminho e de cada passo que damos. Tudo, porém, importa que o critério, com o qual nos examinamos, a medida, com a qual medimos a nossa vida, sejam tais que possam persistir naquele dia perante o nosso juiz. Com outras palavras: Devemos examinar-nos perante Deus, não contentar-nos com a nossa opinião humana, mas perguntar pela opinião do Senhor; devemos perguntar: O que é que Ele diz sobre mim e a minha vida? Se não começarmos a encarar a nossa vida, tudo o que somos e fazemos, do ponto de vista de seu fim, isso é, do ponto de vista de Deus, então necessariamente cairemos em ilusões sobre nós e a nossa situação. 

Dessa ilusão fala a palavra que hoje ouvimos, a palavra do Senhor dirigida a uma comunidade cristã. n a palavra daquele, diante do qual nada permanece oculto e que não só vê as coisas visíveis e externas, mas que conhece e examina os pensamentos do coração. E o que Ele vê e sabe de sua comunidade, Ele não pode louvar. É uma comunidade, na qual não falta atividade, uma comunidade que tem obras a apresentar, uma comunidade que parece ter uma vida rica e que é honrada e reconhecida. Mas tudo isso não impede que o Senhor pronuncie sobre ela a dura sentença: Eu sei as tuas obras, que nem és frio nem quente; que fosses frio ou quente! Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca. 

O que Cristo, o Senhor, repreende em sua comunidade, é a falta de uma atitude decidida. Há cristianismo, querem ser cristãos, e acham talvez que são bons cristãos, mas o que o Senhor vê, é um cristianismo morno, um cristianismo bem temperado que não exige sacrifícios e que no fundo nos deixa assim mesmo como somos. É' um cristianismo sem sal. Mas esse cristianismo sem ardor, sem entusiasmo, sem coração é intolerável aos olhos do Senhor. Porque é um cristianismo que não diz Não, mas também não diz Sim, um cristianismo indeciso, e por isso sem verdadeiro interesse, sem sincero amor. 

E Cristo diz: Oxalá fosses frio ou quente! Um claro Sim, ou então um claro Não! Porque um claro e sincero Não pode ainda um dia transformar-se em um Sim. Mas de uma atitude que se nega a tomar uma decisão, de cristãos que não se querem entregar inteira e definitivamente a Cristo, o Senhor diz a palavra que é uma das mais sérias do Novo Testamento: Porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca.
E isso é dito a uma comunidade que se chamava cristã. E mais ainda: é dito a uma comunidade que, pela sua própria opinião, era rica e de nada tinha falta. Vejamos o que isso tem a dizer a nós. Isto então pode acontecer: que uma comunidade julgue de si mesma que tudo esteja em ordem, pois há vida, há atividade em seu meio, ela tem obras, realizações visíveis que demonstram o seu cristianismo, e, apesar disso, o que o Senhor diz sobre a sua situação, é bem diferente: Tu que dizes: Sou rico, de nada tenho falta, não sabes que és infeliz, miserável, pobre, cego e nu — palavras que todas descrevem a absoluta falta do que é essencialmente necessário. A situação dessa comunidade não é a mesma como a daquele fariseu que, perante a face de Deus, nem se lembra da presença daquele, diante de quem se encontra, e que diante de tanta riqueza que constata em sua própria vida — de nada tem falta, está satisfeitíssimo consigo mesmo, tudo está em ordem — não necessita mais de Deus? 

Esse perigo também para cristãos existe. Também nós não estamos isentos da tentação de iludir-nos a nós mesmos e a outros sobre a nossa situação, julgando estar tudo em ordem conosco e de termos tudo, e na realidade somos infelizes, pobres e cegos como aquele fariseu, porque excluímos de nossa vida aquele que unicamente pode tornar-nos ricos e felizes e dar-nos tudo. Estou rico, nada me falta — é a atitude daquele cristianismo que se contenta com aquilo que tem ou julga ter, cristianismo saturado e abastecido que já sabe tudo a respeito de Deus, e que não sente que sempre lhe falta o principal, lhe falta o melhor, o que só teremos se sempre nos for dado de novo. E nos é dado se permanecemos em ligação, em contato vivo e contínuo com a realidade eterna de Deus. Sem esse contato, sem essa comunhão viva com Deus, o nosso cristianismo tem que tornar-se uma ilusão, isso é, podemos ter a aparência de sermos ricos, mas é uma riqueza que não vem de Deus, e por isso é pobreza aos seus olhos; podemos dar a impressão de sermos vivos e ativos, mas na realidade somos mornos e mortos. Toda a nossa atividade, se ela não tiver a sua origem em Deus, de nada vale no mundo dos eternos valores. 

Mas, ainda o Senhor fala à sua comunidade, também a essa comunidade, sobre cuja situação atual tem que pronunciar tão dura sentença. Ele que aqui se apresenta como o principio da criação, que do nada criou a vida, Ele também desta morte pode ressuscitar nova vida. Ainda Ele está presente nesta comunidade. Ainda Ele fala, o Senhor, e por isso a palavra da mais grave e dura sentença é ainda palavra que oferece graça e perdão; não é ainda a última palavra. Mas tudo importa que agora, hoje, enquanto ainda ouvem a palavra do Senhor, reconheçam a sua situação perante Deus, que vençam aquele cristianismo de nome que só é uma fachada, mas ao qual falta o principal, Cristo mesmo, aquele cristianismo que ainda sabe alguma coisa de Jesus Cristo, e talvez ainda saiba falar e dizer belas palavras sobre Ele, mas Cristo deixou de ser-lhe aquela realidade, sem a qual não podemos viver. Tudo importa que seja vencido este cristianismo formal, satisfeito consigo mesmo, mas que na realidade não necessita de Cristo e na prática vive sem Ele. 

Deus em Jesus Cristo veio para procurar e salvar os que estavam perdidos. A porta da casa paterna está aberta para a volta do filho. Cristo chama a si os tristes e aflitos, os oprimidos e cansados, os fracos e doentes; todos nele encontram um irmão que os compreende, que lhes quer ajudar. Mas, aos mornos, aos indecisos, aos desinteressados Ele hoje ainda diz: Aconselho-te que de mim compres ouro provado no fogo, para que te enriqueças, e vestidos brancos, para que te vistas, e que unjas os teus olhos com colírio, para que vejas; eu repreendo e castigo a todos quantos amo; sê, pois, zeloso e arrepende-te! 

Ele é o Senhor que repreende e castiga, mas o seu castigo é motivado pelo amor. Ele quer que vejamos a nossa verdadeira situação, e essa só Ele no-la pode mostrar. Dele recebemos o colírio, para que possamos ver o que é ilusão e o que é verdade em nossa vida. Agora podemos arrepender-nos, 'porque Ele nos diz: Sê zeloso e arrepende-te! Ele é o único e verdadeiro Salvador. Só Ele nos pode ajudar. Toda a nossa honestidade, toda a nossa cultura nada nos ajuda; se não recebemos as vestes brancas da justiça dele, estaremos nus perante Deus. E antes de toda a nossa riqueza própria, antes de tudo que nós julgamos ter e poder apresentar, e o que na verdade é urna grande ilusão, Ele nos oferece verdadeira riqueza: Aconselho-te que de mim compres ouro provado no fogo. Jesus Cristo mesmo nos quer ser tudo: toda sabedoria, todo orgulho, toda riqueza, e Ele nos quer ser tudo, porque sem Ele nada temos e nada somos o que possa persistir naquele dia. 

Ele mesmo quer vir a nós. Eis a mensagem do Advento, com a qual termina o nosso texto: Eis que eu estou diante da porta a bater. Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, eu entrarei, e tomarei a ceia com ele e ele comigo. 

Hoje ainda ouves esta voz: tão perto Ele está de ti, diante de tua porta. Não se move nada em teu coração ao ouvir esta voz do teu Salvador? Ele — diante da porta a bater! Como é triste bater numa porta, e na porta de uni conhecido, de alguém que a nós pertence, e ele está em casa, mas a porta não se abre, ela permanece fechada! Qual é a nossa atitude? Porque a nós é dito, hoje ainda uma vez, que Cristo está diante da nossa porta a bater!
Mas, por outro lado: Que grande promissão, que incomparável possibilidade com isso nos é dada! Cristo ainda não se afastou de nós. Ainda quer entrar. Ainda nos procura. E a todos que lhe abrem a porta, que afastam tudo que impede a sua entrada, todo orgulho, toda sabedoria própria — a eles promete: Tomarei a ceia com eles e eles comigo, lá no reino de sua glória eterna. Se nós deixarmos Cristo entrar em nossa vida, em nosso Hoje, então Ele nos dará. entrada no seu Hoje eterno. Queira Deus abençoar-nos o Advento que ainda nos é dado, para nele ponderarmos o que serve para o nosso bem eterno. 

Queira Deus abençoar-nos o Advento que ainda nos é dado, para nele ponderarmos o que serve para o nosso bem eterno.

Pastor Ernesto Schlieper

Novembro/Dezembro de 1948 (Advento), Porto Alegre 

Veja:

Testemunho Evangélico na América Latina

 Editora Sinodal

 São Leopoldo - RS
 


Autor(a): Ernesto Theophilo Schlieper
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo do Natal
Natureza do Domingo: Advento
Perfil do Domingo: 2º Domingo de Advento
Testamento: Novo / Livro: Apocalipse / Capitulo: 3 / Versículo Inicial: 14 / Versículo Final: 22
Título da publicação: Testemunho Evangélico na América Latina / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1974
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 19738

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