50 anos do Cancelamento da Realização da V Assembleia da FLM no Brasil

05/06/2020

 

Na vida eclesiástica temos muitas datas que são lembradas com eventos comemorativos. Agora, uma data ainda não figura no calendário da Igreja – 5 de junho.

Neste dia, há 50 anos, o Secretário Geral da Federação Luterana Mundial (FLM) anunciou o cancelamento da V Assembleia, marcada para o mês julho de 1970 na cidade de Porto Alegre/RS. Esta decisão repercutiu imensamente nos meios luteranos brasileiros e teve impactos importantes no jeito de a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) se relacionar com o contexto brasileiro.

Antecedentes

O Conselho Diretor da IECLB formulou o convite para a realização da V Assembleia no Brasil já que a República Democrática Alemã (cidade de Weimar havia sido o local original) não se comprometeu com a concessão vistos a todos os participantes. Todas as assembleias anteriores aconteceram em países de maioria protestante. O tema escolhido - “Enviados ao Mundo”- sinalizava a disposição de confrontar-se com a realidade conflitual do assim chamado Terceiro Mundo.

As comunidades brasileiras juntamente com as suas lideranças nacionais abraçaram com grande entusiasmo o planejamento e organização em nível local. O então presidente da IECLB, Pastor Dr. Ernesto Schlieper que formulara o convite, considerava que o evento ajudaria a Igreja para uma maior abertura para o mundo e, por sua vez, contribuiria para o alicerçamento da sua unidade interna. 

Uma Comissão Preparatória ocupou-se com os mais diversos aspectos: questões de logística, elaboração de materiais de estudo, campanhas de apoio, organização de um grande Dia da Igreja na Feira Nacional de Calçados (FENAC) em Novo Hamburgo/RS. A Igreja neste período estava sendo presidida pelo Pastor Karl Gottschald.

Debates e controvérsias

Visões distintas em relação ao contexto brasileiro estavam colocadas sobre a mesa. Havia enormes preocupações com relação à ditadura militar que havia decretado o AI-5 em dezembro de 1968. As denúncias no exterior da violação dos direitos humanos, somadas a reflexões críticas desenvolvidas pelas delegações jovens, fizeram com que o clima se acirrasse já que os dirigentes luteranos locais hipotecavam todo o apoio ao regime militar instaurado em 1964.

As delegações estrangeiras dispunham de maiores informações sobre torturas e mortes de presos políticos. Diversos dossiês davam entrada na sede da FLM em Genebra/Suíça. No Brasil a imprensa estava sob censura.

Controvérsias em torno da participação do Presidente da República e o convite para que Dom Hélder Câmara falasse aos jovens causaram muitas irritações e inquietudes. Jornais e revistas eclesiásticas repercutiam esta polarização. Cobranças feitas aos dirigentes luteranos brasileiros por parte das igrejas dos países europeus e dos EUA não recebiam uma resposta satisfatória, fazendo com que as reuniões preparatórias fossem marcadas por grande animosidade.

Uma tentativa de conciliação foi feita por parte do Secretário Geral da FLM por ocasião da sua participação na reunião preparatória dos delegados brasileiros em Blumenau/SC (4-6/05/1970). Ficou acertado que uma comissão interna se ocuparia da questão das torturas e das violações dos direitos humanos. O convite ao Presidente da República foi formulado mesmo assim.

Os europeus pressionaram pela não participação das autoridades militares, mas a solidariedade dos dirigentes brasileiros com o governo aumentou ainda mais as tensões. Os desentendimentos são marcados por grande emocionalidade. Mesmo a delegação jovem da IECLB, que divergia das posições da direção da igreja, enviou um telegrama reiterando a importância da realização da Assembleia no Brasil.

No dia 1º. de junho o presidente da FLM, P. Dr. Frederik A. Schiotz, reafirmou a realização da Assembleia no Brasil, mas uma entrevista telefônica dada a uma rádio alemã por uma liderança brasileira precipitou os acontecimentos.

Com a desistência das delegações das Igrejas da Finlândia, Suécia, Dinamarca, Noruega, Holanda e Alemanha o Secretário Geral, Dr. André Appel, anunciou no dia 5 de junho de 1970 o cancelamento da realização da V Assembleia em Porto Alegre/RS e a sua transferência para Evian (França).

A decisão marcou profundamente os debates e as ações no âmbito da IECLB nos dias, meses e anos seguintes. Tragédia ou alvorecer de uma nova era na Igreja? Por que a logomarca da IECLB remete a um evento que não aconteceu?

Essa reflexão fica para outras datas jubilares que temos pela frente.

Rolf Schünemann

[Maiores informações sobre a documentação em: Do Gueto à Participação. O surgimento da consciência sócio-política na IECLB entre 1960 e 1975. Editora Sinodal, 1992.]


 

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