Eu tenho observado pessoas que usam a expressão: “Nós somos príncipes e princesas de Deus.” Como filhos do Rei, que é Deus, podemos assim dizer. Mas será que por trás desta expressão não está aquele pensamento: “Como príncipe e princesa tenho direitos!”?
Dentro desse contexto, gosto muito de uma palavra de Lutero que diz: “Nós somos mendigos, essa é a verdade”(*). Eu creio que aquela pessoa que se enxerga como mendigo diante de Deus, é uma pessoa que reconhece que tudo o que recebe é dádiva e não mérito. Essa pessoa tem os lábios cheios de gratidão a cada manhã, pois entende tudo, inclusive a própria vida, como um presente de Deus. Contudo, aquela pessoa que se acha merecedora de grandes coisas, essa dificilmente agradecerá.
Pessoas que acham que tudo o que tem na vida é devido ao seu esforço, à sua capacidade, estas têm poucas razões para agradecer. Mas aquela que se põe na condição de mendigo diante de Deus, esta agradece.
Eu, como mendigo, não posso fazer nenhuma exigência. Apenas posso estender a minha mão e pedir ao Senhor aquilo que necessito. Jesus dialogou com uma mulher estrangeira que lhe pedia uma graça: “- Não está certo tirar o pão dos filhos e jogá-lo para os cachorros, disse Jesus. Então a mulher respondeu: - Sim, Senhor, é verdade, mas até os cachorrinhos comem as migalhas que caem debaixo da mesa dos seus donos.” (Mateus 15.25-26) (**). Por sua humildade e fé, aquela mulher recebeu o que pediu ao Senhor. E isso é um ensinamento precioso para nós. Lutero tem uma oração muito bonita que diz assim:
“Vê, Senhor, eu sou um vaso vazio,
que carece ser enchido.
Enche-me, meu Senhor.
Sou fraco na fé, fortalece-me.
Sou frio no amor, aquece-me.
Faze meu coração arder
para que meu amor transborde,
e assim envolva o meu próximo.
Em minha carência só há pecado;
em ti, Senhor, há plenitude de justiça.
Por isso permaneço contigo.
A ti não preciso dar.
De ti posso receber.” (*)
Apesar de não passar de um mendigo diante de Deus, Ele me trata como seu filho. Sou para Ele um filho amado. Ele tem prazer e alegria em estar comigo. E eu, agradecido, só tenho que dizer: Obrigado, Senhor!
Tendo a imagem de mendigo, entendemos melhor o outro que sofre. Posso ser solidário, inclusive com os moradores de rua que não têm onde morar e dependem da caridade alheia para viver. Não uso violência contra eles, mas sei estender a mão.
Reflitamos sobre isso: diante de Deus, não temos mérito algum. Você pode usar o termo: “Príncípe e Princesa de Deus”, mas que você não pense, por causa disso, que tem algum direito adquirido. Tudo o que você recebe, tudo o que tem, tudo, inclusive a sua vida, é uma dádiva de Deus. E, pode ter certeza, é uma dádiva imerecida.
(*) Retirado de PÉROLAS PARA O SEU COTIDIANO, Palavras de Martim Lutero selecionadas e traduzidas por Lindolfo Weingärtner. Gráfica e Ed. Otto Kuhr Ltda.
P. Telmo Noé Emerich