Temos em nossa tradição luterana a ideia, que existem situações nas quais o testemunho do evangelho exigido de nós por Deus, ficaria distorcido e prejudicado se ficarmos calados. Não se trata de querer intrometer-se de forma voluntariosa num debate político onde é possível defender posições diferentes, mas, sim, de uma situação onde permanecendo calados e, supostamente neutros, ficaríamos claramente culpados diante de Deus e das pessoas.
Um exemplo histórico claro do que significa isto, nos vem do período nazista na Alemanha. Entre as diversas aberrações daquele tempo, uma das mais absurdas era a existência dos assim chamados Cristãos Alemães que tentaram justificar a ditadura de Adolf Hitler e sua ideologia nazista a partir da fé cristã a da Bíblia. Desta forma defendiam como cristãos a limpeza étnica, empreendida pelo regime contra judeus, ciganos, comunistas, homossexuais, cristãos, etc... resultando em mais de 6 milhões de mortos. Para nós hoje salta aos olhos como tais posições agrediam o testemunho de fé da igreja. Não poderia haver para cristãos sérios comunhão de fé com estes cristãos alemães que aos poucos dominavam a igreja.
Um dos fatos mais infelizes da história da nossa igreja é que somente poucos tiveram a coragem de assumir sua discordância. Estes entraram no Status Confessionis. Tiveram que sair da Igreja e fundaram a Igreja Confessante (Bekennende Kirche). Resistiram à deturpação do evangelho e salvaram o testemunho de fé neste período escuro da história. O nome mais conhecido deste grupo é o do Pastor e teólogo Dietrich Bonhoeffer que pagou por sua firmeza com a vida. A Igreja evangélica alemã assumiu muito mais tarde em Stuttgart 1949 o seu erro com a declaração de culpa pelos crimes nazistas.
Em nossos dias temos algo acontecendo na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados em Brasília que, mesmo não tendo o alcance enorme dos crimes nazistas, nos coloca numa situação semelhante no sentido que o testemunho de nossa fé fica prejudicado se permanecermos simplesmente calados.
O Presidente da Comissão, o Pastor Marco Feliciano, abusa de trechos bíblicos para p.ex. discriminar afrodescendentes. Ele escreve: Citando a Bíblia (...) africanos descendem de Cão (sic) (ou Cam), filho de Noé. E, como cristãos, cremos em bênçãos e, portanto, não podemos ignorar as maldições. Ora, é este o exato argumento que serviu como justificativa para a escravidão dos negros no Brasil e serviu p.ex. para legitimar o regime do Apartheid sulafricano. Afronta uma compreensão profunda do evangelho a partir dos caminhos de Cristo que nunca discriminou ninguém, que, muito pelo contrário, foi ao encontro dos que estavam à margem: Doentes, loucos, cobradores de impostos, mulheres....
Como cristãos evangélico luteranos precisamos nós distanciar expressamente deste testemunho público contrário ao espírito do evangelho do amor incondicional de Deus.
Quem quer permanecer cristão e valorizar os valores de Cristo tome distância e expresse seu repúdio!
P. Guilherme Nordmann - Paróquia Vila Campo Grande-Diadema