Deus criou a vida e a identificou como sendo bela e de excelente qualidade. O mapa da violência, em nosso País, no entanto, reflete o contrário; desenha um quadro deveras triste e preocupante. O medo assola nossa gente, nossas famílias e a sociedade toda. Triste, porque pais, irmãos, parentes, parceiros choram a cada dia diferente a perda violenta de pessoas queridas. As sementes da morte encontram terra fértil sempre que se ignora a oferta da paz e o compromisso da justiça social. Preocupante, porque o mapa da violência vai desenhando fatos e dados estatísticos alarmantes e sempre crescentes. Vivemos sob o desespero de que a coluna vertebral da brutalidade humana parece inquebrável..
O crime organizado, a delinqüência, o narcotráfico, a lavagem do dinheiro assumiram proporções tamanhas que todo o tipo de resistência pública para combater essa realidade torna-se ineficaz. A vida é bagatelizada, destituída de valor maior, deixou de ser bela e de excelente qualidade. A falta de compromisso do ser humano em relação à preservação da vida própria e da vida alheia é gritante e ocorre à luz da irracionalidade. Os poderes públicos aos quais cabe assegurar o direito à vida digna das pessoas cidadãs sentem ua impotência diante da aplicação da lei do olho por olho.
Os membros da família cristã não vivem imunes a esse tipo de convívio. Não vivem em ilhas ou distantes da realidade da violência e do crime. Na qualidade de pessoas co-participantes da sociedade humana, estão submissos aos riscos que o próprio mundo impõe.
A confiança no Deus da vida gera uma nova identidade. Faz de pessoas cristãs, defensores da não-violência. Face a episódios violentos recentes, a questão da pena de morte tem sido novamente motivo de articulação na sociedade brasileira. Embora não se encontrem palavras, gestos e sentimentos que possam diminuir ou afastar o sofrimento e a dor de pais e de mães vendo seus familiares, filhos e filhas dizimados por mãos ou poderes assassinos, cristãos são contrários à pena de morte como possível força controladora do crime contra a vida humana. Uma autoridade jurídica afirmou o seguinte: Eliminar a vida de um delinqüente é a mais definitiva admissão do fracasso e de contradição de qualquer organização humana, pois tira a vida para supostamente protegê-la. A aplicação da morte, segundo o mesmo jurista, não é solução para nada. Apenas põe fim a uma vida.
Por causa da fé em Jesus Cristo, embaixador da vida em abundância, somos desafiados a nos tornarmos mais conscientes e corajosos, pessoas empenhadas a favor da justiça social. Quando a preocupação pela justa distribuição do pão de cada dia for relegada a um plano marginal da sociedade, o desrespeito à vida humana é mera conseqüência.
Não será a ausência da justiça social uma das grandes razões à violência e à geração de uma sociedade que convive insensível à brutalidade em sua volta? Num mundo assim, o valor das armas e dos cartuchos mortíferos valem mais do que a vida humana criada à imagem de Deus! A paz não acontece enquanto permanecermos de braços cruzados. A paz pressupõe sabedoria, promotora da sensibilidade e justiça humanas. E exige cooperação!
Manfredo Siegle
pastor sinodal do Sínodo Norte-catarinense
da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB)
em Joinville - SC
Jornal ANotícia - 05/12/2003