O Conselho Nacional de Igrejas Cristãs no Brasil e o Conselho de Igrejas Cristãs do Estado do Rio de Janeiro (compostos pela Igreja Católica Apostólica Romana, Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, Igreja Presbiteriana Unida, Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia, e no Rio a Igreja Cristã de Ipanema), vêm juntar as suas vozes às demais que, nesta manhã, intercedem em favor da paz. Paz não significa a ausência de discordância nem de diferença, mas significa possuir a vontade profunda de encontrar caminhos de aproximação onde as distâncias se alargam e onde as opiniões se enrijecem; significa fazer um deslocamento para poder olhar para uma determinada situação a partir de um lugar que não é o seu; significa ter a habilidade para ouvir nas palavras e no silêncio entre as palavras o que o outro está dizendo. E para ouvir, às vezes é necessário calar, fazer silêncio, pausar. A pausa é fecunda. Tenho a impressão que estamos precisando fazer uma pausa enquanto sociedade para nos reencontrar. O povo brasileiro é, historicamente e culturalmente, hospitaleiro, alegre, brincalhão, bem-humorado. Por isso é tão desconcertante para nós nos depararmos com a faceta violenta e raivosa dos grupos de indignados; do pessoal do quebra-quebra e daqueles que instrumentalizaram a copa para fins políticos. Há um mês participei de um encontro entre o ministro Gilberto Carvalho e a sociedade civil aqui no Rio. O grupo do “não vai ter copa” hostilizou o ministro de forma violenta e desrespeitosa, entrando várias vezes numa histeria coletiva retroalimentada pelo ódio. A tática de desestabilização da reunião e a incitação à violência ficou evidente. Alguns de nós saímos de lá chocados. Tenho a impressão que no processo de globalização, globalizou-se também a raiva. É preciso não reproduzi-la; não ficar repetindo-a nas nossas conversas, nas redes sociais, na mídia. É preciso contrapô-la com ações afirmativas, propositivas. Não podemos aceitar a importação do ódio, de nenhum tipo, nem a sua reprodução.
Nos colocamos solidários com o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro quando diz não aos vídeos que incitam o ódio contra as religiões afro-brasileiras. Permanecemos ao lado do MPF quando este recorre da decisão descabida do juiz que baseia o seu julgamento num argumento arcaico e obsoleto, desconsiderando a complexidade do universo religioso brasileiro.
Queremos uma copa de paz, assim como queremos uma cidade e uma sociedade de paz. Sabemos que paz não se alcança sem justiça, por isso não estamos tentando igualar paz a esquecimento; não estamos advogando botar panos quentes nos nossos problemas. Não! Nós temos problemas sérios para resolver no Brasil, e nós estamos encarando estes problemas e os estamos lidando com eles, e precisamos continuar. Afinal, 500 anos não se resolvem numa década.
A cultura de remoção atrelada à construção da coisa pública está instalada na mentalidade política brasileira desde sempre; não foi inaugurada com a copa. Precisa ser questionada? Sim. Precisa ser modificada? Sim. Mas não pode ser atribuída à copa; a copa não é o início nem a causa desse modo de agir. Precisamos assegurar participação popular no que tange ao planejamento urbano; precisamos assegurar igualmente que os lucros da copa sejam revertidos para a construção de moradias dignas, mais UPAs, etc.
Nós não queremos as nossas crianças e os nossos adolescentes sendo abusados sexualmente; nós não queremos as nossas mulheres jovens e rapazes sendo traficados. As igrejas cristãs se preocupam e se empenham no combate a estas indignidades humanas. Ontem foi o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. O CONIC, juntamente com o Movimento Paz e Proteção, da UNICEF, está engajado nesta luta. As igrejas individualmente também têm as suas campanhas para o período da copa. E muitas igrejas se engajam na campanha Protege Brasil, do governo federal.
Para além das iniciativas dentro do escopo dos direitos humanos, nós queremos recuperar a alegria e a vontade de celebrar. Por isso, a partir de uma iniciativa da Igreja Luterana, fizemos um roteiro de igrejas do CONIC que, nas cidades-sede da copa, vão abrir suas portas para celebrar em inglês, em alemão e em português, tendo a copa como tema.
O futebol está impresso no DNA do povo brasileiro e a copa acontecerá em nosso país. É preciso recuperar a alegria, é preciso celebrar! Pois, no final das contas, é a vida que vai ter que fazer o gol.
E que o Brasil seja campeão!!
Estádio do Maracanã, Rio, 19/05/2014
Palavra da Pa. Lusmarina Campos Garcia, Igreja Luterana, presidente do CONIC-Rio
Veja mais sobre Copa do Mundo 2014