A Oração de Paulo pela Igreja em Filipos (Filipenses 1.1-11)
Estudo bíblico (P. Alexander Busch – Igreja Ev. Reformada de Castrolanda)
(1) Se você estivesse numa prisão, acusado injustamente, que carta você escreveria para sua família? A carta de Paulo aos Filipenses é considerada a carta da alegria do apóstolo. Comparada com outras cartas de Paulo, a palavra “alegria” aparece diversas vezes (Fp 1.4; 2.17-18; 3.1,29; 4.4). É uma carta que transmite alegria, gratidão, saudades e confiança, apesar de Paulo estar escrevendo da cadeia (Fp 1.7,14). Não sabemos onde Paulo estava preso, porém sabemos que ele tem liberdade para se corresponder com as igrejas. Vale a pena ler e conhecer a carta aos Filipenses (ela não é longa!). Para nosso estudo queremos nos concentrar no início da carta, quando Paulo escreve uma oração e revela as razões de sua alegria e esperança ao se lembrar com afeto e saudades da igreja em Filipos.
Leitura de Filipenses 1.1-11
(2) Na saudação inicial aprendemos algo muito importante sobre a vida e fé cristã. Seguir Jesus não é trilhar por um caminho solitário. Faz parte do caminho uma comunidade de irmãs e irmãos. Paulo se identifica como o autor da carta. E, diferente de outras cartas, Paulo não se descreve como “apóstolo”, mas fala de si mesmo como “servo de Cristo Jesus” (1.1). Também notamos que embora seja uma carta pessoal, Paulo inclui Timóteo como coautor, sinalizando que o trabalho missionário é um trabalho em equipe e que anunciar o evangelho é uma responsabilidade de todas as pessoas que pertencem ao povo de Deus e que creem em Cristo Jesus. Paulo menciona “bispos e diáconos”, mas suas palavras são dirigidas à toda comunidade cristã em Filipos. Ou seja, a missão de anunciar o evangelho é de todas as pessoas cristãs.
(3) Um detalhe à parte sobre bispos e diáconos. Quando a carta foi escrita não existia ainda o modelo hierárquico de organização da igreja. Esta estrutura mais rígida irá surgir a partir do século II em diante. Ou seja, possivelmente no tempo de Paulo, estes títulos indicavam funções de liderança dentro da comunidade. Eram pessoas ativas na missão, que exerciam as tarefas de ensinar e supervisionar a igreja (bispos = epíscopos no grego = supervisor), enquanto que outras pessoas cuidavam e serviam as pessoas mais necessitadas (diácono = a pessoa que serve).
Qual sua percepção da nossa igreja? A comunidade como um todo assume a tarefa de anunciar o evangelho? Existem acertos e lacunas? Quais são? Qual sua percepção do trabalho do conselho que colabora na igreja como supervisor? E qual sua percepção do trabalho da diaconia que direciona recursos para ajudar famílias em situação de dificuldade?
(4) Após a saudação, Paulo escreve sua oração de gratidão a Deus pela igreja em Filipos. A igreja é motivo de grande alegria, gratidão e louvor para o apóstolo, “Sempre que penso em vocês, eu agradeço ao meu Deus. E, todas as vezes que oro em favor de vocês, oro com alegria por causa da maneira como vocês me ajudaram no trabalho de anunciar o evangelho desde o primeiro dia até hoje” (1.3,4,5).
(5) Na oração Paulo agradece a Deus pela história desta igreja, desde suas origens até hoje. O livro de Atos narra com detalhes o início desta igreja. Na Segunda Viagem Missionária, quando Paulo, Timóteo e Silas chegaram a Filipos, Lídia ouviu o evangelho, ela e sua casa foram batizados e acolheram os missionários. Houve também oposição ao evangelho e perseguição ao trabalho missionário. Alguns dias depois, Paulo e Silas foram presos sob a acusação de provocarem tumulto na cidade. Um tremor de terra, porém, abriu as portas da prisão e o carcereiro, prevendo que os prisioneiros tinham fugido, pensou em se matar. Paulo o impediu e, ao apresentar o evangelho, o carcereiro e sua casa foram batizados (At 16.11-40).
(6) Anos mais tarde, quando Paulo escreve a carta aos Filipenses, Paulo está de novo na prisão. A igreja em Filipos, num gesto muito bonito, envia o irmão Epafrodito para apoiar e consolar Paulo no cativeiro (2.25).
Existiam motivos para Paulo e a igreja em Filipos ficarem desanimados? Que qualidades podemos destacar na igreja em Filipos? Onde existe oposição ao evangelho nos dias de hoje? A oposição é somente externa (de fora) ou também interna (dentro da própria igreja)? O que este texto de Filipenses e a história da igreja nos ensinam sobre fé? O que aprendemos ao ouvir a oração de Paulo? Por exemplo, ele está na prisão, mas compartilha palavras de conforto e estímulo com a igreja. O que significa isto para nós?
(7) Gostaria de destacar o testemunho do jovem pastor e teólogo Dietrich Bonhoeffer, que em 1943 foi preso e em 1945 executado a mando de Hitler, semanas antes do final da 2ª Guerra Mundial. Enquanto na prisão, ele no início registrou em algumas cartas seus momentos de medo, desânimo, insegurança e até mesmo raiva. Mas também escreveu a jovens pastores que corriam risco de vida, escreveu orações para outros prisioneiros, escreveu poemas que falam de esperança. Suas cartas e anotações escritas na prisão estão reunidas no livro “Resistência e Submissão”. Ao ler e meditar em suas palavras, percebemos o quanto o olhar de Bonhoeffer se dirige aos outros, que suas orações são em favor dos outros, que sua preocupação era a vida e sobrevivência lá fora, a sobrevivência de familiares, amigos, a sobrevivência da própria Igreja para perseverar em meio ao caos. Sua própria situação de prisioneiro com risco de ser morto está registrada somente em observações mais periféricas.
(8) Vivemos um contexto e uma realidade diferentes do apóstolo Paulo, da igreja de Filipos e do pastor Bonhoeffer. Não corremos o risco de ir parar na prisão por causa do evangelho. O evangelho, entretanto, também nos compromete a perseverar na fé. Para Paulo a perseverança na fé não é obra humana, mas é ação de Deus na vida das pessoas, “eu estou certo de que Deus, que começou esse bom trabalho na vida de vocês, vai continuá-lo até que ele esteja completo no Dia de Cristo Jesus” (1.6). Embora a igreja em Filipos surgisse do trabalho missionário realizado por Paulo, Silas e Timóteo, a obra é de Deus. É Deus quem começou este trabalho. É Deus quem dá continuidade ao trabalho. É Deus quem irá concluir este trabalho no dia em que Cristo Jesus retornar (“Dia de Cristo Jesus” é um termo que se refere à sua segunda vinda). Ou seja, a fé está centrada em Deus. Mesmo havendo oposição e motivos para desânimo, a nossa confiança é fortalecida pelas promessas de Deus e a confiança gera perseverança.
(9) Além disso, se Deus continua sua obra até completá-la, isto significa que, por enquanto, a igreja ainda está a caminho. A igreja não chegou ao seu destino final. Deus ainda está trabalhando. Por isto, ainda ouvimos na oração de Paulo as seguintes palavras, “O que eu peço a Deus é que o amor de vocês cresça cada vez mais e que tenham sabedoria e um entendimento completo, a fim de que saibam escolher o melhor” (1.9-10a).
A igreja não pode se acomodar, julgando ter alcançado um nível ideal de prática do amor e vivência na fé. A igreja em Filipos, mas também a nossa igreja, deve fazer uma constante avaliação de sua vivência na fé e prática de missão. Saber escolher o melhor é exercer discernimento para continuar seguindo a Jesus neste tempo e lugar que Deus nos colocou.
De que maneira e em que sentido a nossa igreja/comunidade pode continuar “crescendo no amor”? Pense em situações da vida pessoal e da igreja que exigem discernimento. De que forma podemos alcançar discernimento?