Paróquia Martin Luther

Sínodo Norte Catarinense



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Mateus 7.24-27 - Você precisa de que? - Você precisa de BASE

Prédica

13/06/2008


Leitura Bíblica Básica: Mateus 7.24-27
Outras Leituras:
Autor: P. Clovis Horst Lindner (Blumenau - SC)
e-mail:
Origem: CEJ - Paróquia Martin Luther
Cidade: Joinville - SC
Data da pregação: 13/06/2008
Data Litúrgica: 1a. Palestra de Evangelicação na Paróquia

Prédica:
Tema: Você precisa de que? Você precisa de BASE

Nestes três encontros que estão diante de nós, eu quero levantar uma pergunta muito importante para a vida de cada um, cada uma de nós. É uma pergunta existencial. Deveríamos refletir sobre ela de vez em quando. Se fizéssemos isso, certamente viveríamos melhor, mais tranqüilos, menos atormentados e, talvez até, mais... muito mais. Essa pergunta é: Você precisa de quê? O que você acha que precisa para viver e qual é a real necessidade da sua vida? Há uma diferença muito grande entre essas duas perguntas.

O ser humano é muito insatisfeito. Ele nunca está contente. Vive reclamando de tudo. Chega a ser chato. A gente nunca olha para baixo, para os mais humildes, para os que têm menos ou mesmo nada. A gente sempre olha para cima, para aquele que tem mais, que pode mais, que mostra mais.

Agora já faz 20 anos que eu estive com minha família por alguns meses na Alemanha. A gente ficava admirado com tudo o que via e com as coisas que eles tinham. Havia quilômetros de distância entre o nível de vida que conhecíamos aqui no Brasil e o que víamos lá, no final dos anos 1980. Mas, acreditem, não era difícil encontrar um alemão que reclamasse e que achasse que as coisas podiam estar melhores para eles.

Um dia, um alemão me perguntou como eu explicava que, apesar de ter tantos problemas e dificuldades, nós brasileiros estávamos sempre alegres, enquanto que eles viviam como o bicho da goiaba, dentro da fartura, mas viviam reclamando. Eu lhe disse: Olha, vocês estão lá no alto da escada do nível de vida. Para vocês não há mais degrau para subir. Daí onde vocês estão, só podem descer novamente. Enquanto nós brasileiros ainda temos muitos degraus para subir. Cada novo degrau que subimos é uma festa para nós. Acho que é por isso que somos tão alegres.

Pois é! Você precisa de quê? Talvez, no mundo dinheirista de hoje, muitos gostariam que a pergunta fosse: Você precisa de quanto?. O que eu quero, nesses três encontros dessa evangelização, é que possamos descobrir quais são realmente as coisas essenciais. Vamos nos desfazer do acessório para descobrir o essencial. Hoje de noite, nossa pergunta é sobre o fundamento. Sobre que base construímos a nossa vida? Ela é sólida ou movediça?

Leitura: Mateus 7.24-27: 24 Todo aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as pratica será comparado a um homem prudente que edificou a sua casa sobre a rocha; 25 e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, que não caiu, porque fora edificada sobre a rocha. 26 E todo aquele que ouve estas minhas palavras e não as pratica será comparado a um homem insensato que edificou a sua casa sobre a areia; 27 e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, e ela desabou, sendo grande a sua ruína.

Estas palavras estão no final do mais importante discurso de Jesus, no início de sua carreira de Messias. Conhecido como o sermão da montanha, este discurso começa no capítulo 5 de Mateus e faz um dos mais importantes resumos dos ensinamentos do Mestre. Cada cristão deveria conhecer este trecho da Bíblia quase de cor; lê-lo muitas vezes. Aqui estão as principais respostas da nossa pergunta: VOCÊ PRECISA DE QUE? São indicações claras de como um cristão deve conduzir sua vida; são balizas que mostram o caminho por onde devemos caminhar, se quisermos seguir aquilo que Jesus Cristo ensina. Mas isso não parece ser um empreendimento fácil porque, caso contrário, Jesus não teria encerrado seu discurso com estas palavras que nos servem hoje como texto de introdução à nossa série de reflexões deste final de semana.

Como um primeiro momento, a partir desse texto de Jesus, queremos refletir sobre a realidade da nossa sociedade e o quanto ela afeta a construção da casa da nossa vida e da nossa sociedade. Na noite de hoje, queremos refletir sobre a base, o fundamento sobre o qual construímos a nossa vida. A qualidade desse fundamento vai determinar a firmeza da casa da nossa vida. E a qualidade do terreno é determinada pela realidade.

Muitos de vocês certamente já construíram uma casa. Quem já construiu uma casa, tem algum conhecimento sobre técnicas de construção. Também por isso sabe muito bem o que significa construir sobre areia e o que é preciso fazer para que a casa fique firme e não sofra com os humores do tempo. O que uma tempestade é capaz de fazer a uma construção a maioria de nós sabe muito bem. E sabemos também que tudo que não está bem firme, pregado ou preso a sapatas de concreto, é arrastado pela força da água e do vento.

A maioria das casas recebe um fundamento sólido, com sapatas de concreto, amarras de ferro-de-construção e vigas concretadas formando a base de assentamento dos tijolos que vão formar as paredes e que, por sua vez, irão suportar a laje superior e o telhado. Nesse sentido, até mesmo construir sobre o lençol de areia do nosso belo litoral não constitui, via de regra, um risco maior.

Mas nossa comparação tem que levar ainda em conta uma obra erguida sobre a rocha. Eu ainda não construí uma casa sobre a rocha, e creio que a maioria de nós jamais fez uma obra assim. Mas não é difícil imaginar o quanto uma tal construção é uma obra complicada e difícil. Fazer a rocha ficar plana, pronta para receber uma casa, não é tarefa fácil. Já a areia molda-se com facilidade, é fácil de colocar em formas e de manusear.

Os nossos construtores de hoje têm muito mais facilidade para erguer uma construção do que os do tempo de Jesus, que só podiam erguer a casa sobre um lugar firme e difícil de moldar ou sobre um lugar fácil de ajeitar, porém perigoso e instável. Os construtores de hoje têm o concreto, que pode ser moldado e colocado em formas, como a areia. Quando ele seca, transforma-se em rocha e garante segurança e estabilidade à construção.

Exatamente assim é com os ensinamentos de Jesus. O evangelho não é um perfume, um toque de esoterismo ou de mística que damos à nossa vida para enfeitar e que se amolda perfeitamente ao nosso jeito de ser. O evangelho é áspero, cheio de arestas e cantos, como uma pedra de rocha, na qual nossas convicções pessoais e particulares não conseguem prender-se. Em outras palavras: quem quer seguir os ensinamentos de Jesus deve estar preparado para colocar algumas de suas convicções pessoais em segundo plano. Deve estar pronto para pensar de forma atravessada, agir de maneira diferenciada e de ajustar sua vida de forma nova.

Como isso se realiza? Em suas parábolas e histórias Jesus falou muitas vezes que o amor de Deus se realiza no próximo. Quem é o teu próximo, no qual você deveria ter agido?, ele pergunta em suas conversas francas e abertas com seus opositores. Fica bem claro que o ensinamento de Jesus é sobre o amor e a comunhão. Quem compreendeu que todos nós somos filhos de Deus, que somos parte de sua comunhão e de sua comunidade, também é confrontado com a responsabilidade de agir em resposta a essa comunhão. O forte carrega o fraco. O que tem, reparte com o que não tem. O são visita o doente. O que vive em liberdade procura aquele que precisa viver na prisão ou perdeu sua liberdade. Quem tem de beber e comer reparte com aquele que precisa de alimento para sobreviver.

Creio que todos vocês conhecem muito bem esta lista de Jesus. Mesmo assim, precisamos ser lembrados dela constantemente. Como filhos de Deus somos uma comunhão diante do Pai. E, numa comunhão um cuida do outro, presta atenção no outro, se preocupa com o outro.

II

No entanto, vivemos numa sociedade que contradiz radicalmente essa figura da comunhão. A sociedade é feita de um conjunto de pessoas que são como ilhas. Cada um só pensa em seu próprio bem-estar, em seu conforto, na resolução de suas próprias necessidades. Nossa sociedade é de consumo. Quem pode consumir tudo o que o comércio oferece, está bem. Os outros são excluídos, prejudicados, colocados de lado. Na nossa sociedade, as pessoas não valem pelo SER (pelo que são), mas pelo TER (pelo que têm). Por isso não perguntam Você precisa de quê?, mas Você precisa de quanto?.

Essa lei levou a nossa sociedade a uma realidade de enganação e de mentira. Agora, as pessoas já não valem nem pelo SER nem pelo TER. Elas valem pelo PARECER (a gente só precisa manter as aparências, isso basta!). Se eu pareço bem de vida, se eu dou a impressão de ter grana suficiente para comprar tudo o que a sociedade de consumo exige de mim, eu sou alguém bem visto. Não importa se eu preciso de um celular; eu tenho que ter um porque, caso contrário, eu vou ser um ET e ninguém vai me aceitar. Com isso, do dia para a noite, há 100 milhões de celulares no Brasil. Trocamos de carro porque agora foi lançada uma geração 4, e o nosso é da geração 3. Trocamos, mesmo que tenham feito somente uma maquiagem no novo carro, que tem a mesma tecnologia embutida há mais de 10 anos. O novo Pálio é feito da mesma palha de sempre.

Assim, poderíamos citar uma lista de coisas com as quais as pessoas mantêm a aparência. Umas enganam as outras, querendo mostrar que são melhores, mais importantes, mais na moda, mais... mais... O que vale são as aparências, o resto não importa. ISSO é construir sobre a areia! Isso é dar uma falsa base para a vida. Ela não permanece, não dura. Ela balança mais do que palanque no banhado. Ela frustra, machuca, joga as pessoas na depressão e as leva ao posto de saúde para pedir Flouxetina. Nossa sociedade, por isso mesmo, é injusta, tem uma economia desumana ou vive um exagerado individualismo. Nessa realidade, cada qual só pensa em si mesmo.

Nós estamos falando aqui da própria índole do ser humano, pecador, afastado do Pai, que sempre de novo se julga dono do próprio nariz e em condições de decidir por si mesmo. Todos nós somos assim. Caso contrário, não haveria essas mesmas barbaridades e distorções acontecendo bem dentro de nossas comunidades, igrejas, grupos de estudo bíblico e presbitérios. Sempre de novo, porque continuamos pecadores, nos afastamos dessa comunhão fundamental e nos voltamos egoisticamente para nós mesmos e nossos desejos pessoais mesquinhos e individualistas.

Também nas comunidades vigora não o SER, mas o TER... e mais ainda o PARECER. Infelizmente, também nós cristãos nos portamos pelas aparências: eu sou mais justo que o outro... os luteranos são mais cristãos que os católicos... os que ajudam na festa são melhores que os outros... os que não saem da barra do talar do pastor são mais santos que os outros... eu oro e leio a bíblia três vezes ao dia e, por isso, sou mais salvo que os outros... eu sou melhor pastor que fulano... e por aí vai. Isso também é construir sobre a areia. Isso também é perguntar pela quantidade e não pela qualidade.

III

Lutero refletiu sobre essa questão de maneira bem plástica, dizendo que tais pessoas estão encurvadas em si mesmas e somente conseguem ver seu próprio umbigo: elas não conseguem ver os outros que estão à sua volta. E nós vivemos tempos assim, numa sociedade em que aprendemos a lidar com os nossos problemas, cada um cuidando de si mesmo, e se preocupando com seu próprio umbigo. Não resolvemos os problemas em grupos ou de maneira coletiva. Cada um é desafiado a achar seu próprio lugar ao sol, a resolver seus problemas com suas próprias capacidades. Isso nos leva a desviar o olhar dos problemas do outro, voltando-o para nosso próprio umbigo. Primeiro eu preciso lutar pelos meus próprios direitos, para que eu esteja bem. Primeiro eu preciso acariciar minha própria alma e me esforçar para que eu me realize.

Todos sabemos que, com tais justificativas, com uma tal filosofia de vida, é possível ganhar muito dinheiro. Por isso, nossa sociedade como um todo está voltada para ela. Em todos os meios de comunicação é possível ouvir, 24 horas por dia, o convite: pense em você! Compre, você precisa! Acumule e poupe tanto quanto for possível.

Não quero transformar nossa sociedade na ante-sala do inferno, mas uma coisa me parece bem óbvia: na maioria das vezes nós somos nosso próprio próximo, e essa é a diferença fundamental para a qual Jesus aponta em seu discurso do sermão da montanha. Somente conseguimos progredir, seguir o caminho certo quando reconhecemos que essa visão distorcida e pecaminosa, somente voltada para nosso próprio umbigo, acaba se transformando num beco sem saída. Nele não há realização, nem salvação. A plenitude somente pode ser encontrada no caminho da comunhão, da solidariedade, da fidelidade de um para com o outro.

E como todos nós, graças a Deus, somos diferentes uns dos outros, cada um com seus dons e capacidades, é preciso que cada pessoa descubra para si mesma de que maneira ele é mais forte, mais presenteado, mais saudável que o outro e, dessa forma, pode auxiliar quem precisa. Essa é a rocha sobre a qual vale a pena construir a nossa casa. Essa é a base sobre a qual vale a pena construir a nossa vida.

O evangelho não quer que fiquemos somente na torcida, na retaguarda, ou no comando, dizendo o que o governo, as ONGs, a igreja ou quem quer que seja deve fazer para melhorar o mundo. O desafio é para cada um cada uma de nós. Todos somos chamados a ajudar na obra da casa. Devemos participar, fazendo a argamassa, carregando os tijolos ou preparando a madeira para as vigas. Na construção da casa de Deus só há um jeito de participar: ajudando na obra. Não basta ter dinheiro para mandar outros construírem.

Essa é a construção da casa sobre a rocha. Quem já ajudou um doente, ou segurou a mão de uma pessoa que está morrendo, quem já disse uma palavra de conforto para alguém que está desesperado, quem já se colocou como escudo para proteger alguém mais fraco numa briga, quem já repartiu seu último pedaço de pão com alguém, talvez tenha visto o olhar cheio de gratidão da pessoa que ajudou. Com certeza ele experimentou o amor que brotou num momento como este.

Aliás, estimada comunidade, este é um sentimento que não pode ser comprado com dinheiro... nem com muita grana! E quem sabe do que eu estou falando, porque já o experimentou pessoalmente, também sabe que este sentimento está apto para preencher o vazio que a gente sente dentro de si de vez em quando. Ele sabe também que tal sentimento tem o poder de ser um fundamento, como uma rocha firme para sua vida; portanto, pode ser a base que precisamos para a nossa vida.

Amém.

P. Clovis Horst Lindner
Blumenau - SC


Autor(a): Clóvis Lindner
Âmbito: IECLB / Sinodo: Norte Catarinense / Paróquia: Joinville - Martin Luther
Testamento: Novo / Livro: Mateus / Capitulo: 7 / Versículo Inicial: 24 / Versículo Final: 27
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 8836

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