História do povo evangélico luterano


ID: 2927

"O QUE PROMOVE A CRISTO"

18/10/2017

À porta dos 500 anos da Reforma, muitas paróquias, comunidades e instituições ligadas à nossa IECLB tem se movimentado em direção a comemoração magna de um fato histórico extremamente importante, não apenas para cristãos de confissão luterana, mas ao cristianismo como um todo e, também para o mundo, visto que a Reforma não apenas envolveu religião, mas a partir de sua teologia influenciou a música, artes, educação, política, profissões seculares, idioma alemão, dentre outros.

O intuito da Reforma não era fundar uma nova igreja, mas apenas reformar a Igreja de Jesus Cristo, que na época estava se desviando de suas origens e da verdade do Evangelho. Por questões políticas houve a separação do catolicismo e então a Reforma assume um importante papel: doutrinar as pessoas cristãs a partir da experiência com a reta pregação do Evangelho e a participação nos sacramentos ministrados de acordo com as Palavras de orientação de Cristo.

A Reforma, dentro de seu campo religioso, inverteu radicalmente aquilo que parecia tão forte e inabalável na igreja da época: o poder institucional que determinava tudo e que estava acima da própria Palavra de Deus. Os cristãos alcançados pela Reforma, passavam a experimentar o contrário. A Bíblia passa a ser a norma principal que normatiza toda a forma de crer, ensinar, pregar, bem como de administrar a Igreja e vivenciar a espiritualidade cristã.

Assim, surgem e evidenciam-se os conhecidos “Pilares da Reforma”: Somente a Escritura, Somente a fé, Somente a graça, Somente Cristo. Em todos estes pilares, ao mesmo tempo que partem de Cristo e sua ação em nossa direção, apontam sobretudo a Ele. A hermenêutica da Reforma então passa a reconhecer que a Bíblia é a única fonte de conhecimento sobre Deus, sua vontade, seus ensinamentos e de seu plano de salvação da humanidade em Cristo Jesus.

De acordo com as palavras do saudoso Pastor Dr. Milton Schwantes, em seu escrito “Bíblia e Lutero”, para o reformador, “sua paixão residia antes em visualizar, nos textos, was Christun treibet, isto é, o que promove a Cristo. Portanto, seus olhos estavam voltados ao que era essencial”. Assim, toda a doutrina da Reforma parte deste pressuposto, sobretudo a partir da doutrina da justificação em conexão com a teologia da cruz. Só vamos vivenciar e experimentar o “Somente Cristo” em nossa vida de fé e espiritualidade cristã, se também partirmos do pressuposto “o que promove a Cristo”.

Neste sentido precisamos refletir qual ênfase tem se dado às comemorações dos 500 anos da Reforma: na pessoa de Lutero ou em sua obra? Conhecendo muitos escritos do reformador, certamente entendo que para ele, sua pessoa e sua própria obra, não eram o essencial, aliás, ele mesmo pede:

“Que o meu nome seja silenciado e que ninguém se chame luterano, mas cristão. O que é Lutero? Pois o ensino nem é meu! Tampouco fui crucificado em favor de alguém. São Paulo (1 Co3.4) não quis tolerar que os cristãos se denominassem paulinos ou petrinos, e sim cristãos. Como poderia então eu, um mísero e fedorento saco de vermes, estar à altura de que se chamassem os crentes em Cristo pelo meu nome, que não tem nenhum valor? Não façam isso, queridos amigos! Vamos apagar os nomes partidários e denominar-nos cristãos, segundo Cristo, cujo ensino possuímos (...) Não sou e não quero ser mestre de ninguém. Possuo, juntamente com a comunidade, o ensino único, geral de Cristo, o nosso único Mestre [Mt23.8]”.

Perceberam? Para Lutero a ênfase não estava em seu nome e nem em sua obra, pois não considerava o ensino seu, mas de Cristo. Todo seu esforço foi para apontar e promover a Cristo, o autor de nossa Salvação.

Preocupa-me ver que imperceptivelmente, como herdeiros da Reforma, estamos dando muita ênfase a Martin Lutero, a Reforma em si, e corre-se o risco que o essencial fique em segundo plano, ou quem sabe, “debaixo do tapete”. Sabemos que diante de todo cenário religioso que nos cerca, com inúmeras denominações cristãs evangélicas, partindo de diversas formas de doutrinas, precisamos nos identificar como “cristãos evangélicos de confissão luterana”, para nos distinguir e testemunhar a forma de vivenciar a fé e a espiritualidade cristã. Mas temos que cuidar para não ir além disso.

Que neste mês da Reforma, sobretudo as celebrações da semana do 31 de outubro, falemos menos de Lutero, de outros reformadores e pessoas daquela época, menos da Reforma em si, e falemos mais de Cristo, aquele pelo qual toda obra e esforço da Reforma focou e promoveu.

A partir de 31 de outubro, serão outros 500! Isso nos chama olhar para o passado, nos compromete com o presente e com o futuro. Que como herdeiros da Reforma, não percamos jamais a nossa essência, como cristãos, mas sobretudo como Igreja, e falemos mais de Cristo. Ao ler as palavras de Lutero acima descritas, arrisco-me a dizer que, se ele pudesse reescrevê-las para esta celebração dos 500 anos, certamente escreveria assim: - Não precisam ficar falando de minha pessoa, nem de meus feitos... Não faço questão que meu nome esteja evidenciado em tantos lugares, nem que façam bustos de mim... Preguem mais a Cristo e somente à Cristo, é disso que o mundo precisa! O verdadeiro caminho que leva a salvação! Esta é a verdadeira vontade de Deus!

“Porque ninguém pode colocar outro alicerce além do que já está posto, que é Jesus Cristo”. (1 Coríntios 3.11)

P. Marcio Simões da Costa
Comunidade Evangélica de Confissão Luterana no Bairro dos Pires

 


Autor(a): P. Marcio Simões da Costa
Âmbito: IECLB / Sinodo: Sudeste
Área: História / Nível: 500 Anos Jubileu
Área: Confessionalidade / Nível: Confessionalidade - Prédicas e Meditações
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Meditação
ID: 44361

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