Prédica: Mateus 25.1-13
Leituras: Amós 5.18-24 e 1 Tessalonicenses 4.13-18
Autoria: Carolina Bezerra de Souza e Eriksson Mateus Tomaselli
Data Litúrgica: 23º. Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 08/11/2020
Proclamar Libertação - Volume: XLIV
Como a festa pode ser melhor?
1. Introdução
Em geral, a parábola em Mateus 25.1-13 é interpretada em relação à parúsia, que tarda, mas para a qual a igreja deve estar preparada. A esse tema também estão relacionados os dois textos indicados para a leitura. Amós trata do Dia do Senhor como motivação para a igualdade social e a condenação do injusto. 1 Tessalonicenses trata do consolo do reencontro da igreja com Cristo.
Tal leitura, porém, é desconfortável. Sente-se compaixão pelas jovens tolas, cujas tochas se apagam pela demora do noivo. Esse é uma figura desagradável, rude, tarda demais e as deixa de fora, apesar de todo o esforço em estar à procura e à espera de participar da festa. Sob essa ideia, incomoda ter Deus ou Jesus associados ao noivo desagradável, e às jovens tolas, aos crentes que não vigiaram. Porque, por essa imagem, o texto trata de quem vai ficar de fora ou dentro do Reino e percebe-se que, mesmo fazendo bastante, todos correm o risco de ficar de fora. Ao mesmo tempo, a parábola parece contradizer outros textos de Mateus, que dizem que a escolha será pela justiça das pessoas.
Então nos perguntamos: não havia azeite nessa casa? Onde está a noiva? As jovens poderiam ajudar-se e ir juntas pelo caminho com cinco tochas? Se tardava o noivo, por que não apagaram as tochas para economizar? Todas dormiram, isso é vigiar? Só aquelas que não tinham azeite ficaram de fora? Por que uma imagem festiva se transforma em uma imagem de exclusão? Que Deus de amor é esse? Munidos desse desconforto, adentremos no texto.
2. Exegese
As parábolas dos evangelhos nos são distantes por tempo e cultura. Soma--se a isso a tendência alegórica de interpretação, que foi amplamente usada ao longo da história interpretativa desse texto, associando Jesus ao noivo, o reino dos céus à festa de casamento e as virgens tolas àqueles que não vigiaram. Também eram dados significados ao óleo, como sendo boas obras, e à porta fechada, como sendo juízo escatológico quando a mensagem pode ser mais geral. “Fato é que Mt 25.1-13 geralmente foi lido com a tendência de colocar as cinco virgens tolas no centro da atenção, usando-se o texto opressivamente enquanto possibilidade de identificação negativa e como instrumento disciplinar e repressor de desejos de mulheres” (RICHTER REIMER, 1999). Por isso, com perguntas e suspeitas, nos aproximamos do texto.
O entendimento dessa parábola precisa ser definido pelas ênfases e radicalidades de Mateus (a fé ativa, a justiça, a missão e o juízo) e pelo seu lugar na retórica narrativa. Assim, mais do que especular o quando e como, a parúsia é uma certeza que exige orientação sobre o agir comunitário para poder passar pelo juízo futuro.
Essa parábola é material exclusivo do Evangelho de Mateus, originado na própria cultura comunitária, revelando-a. Está quase ao final do evangelho, antes da paixão, na sessão apocalíptica, no quinto discurso de Jesus, momento de ele prever e explicar o que vai ocorrer entre sua paixão, ressurreição e retorno. Após os enfrentamentos com líderes religiosos no Templo de Jerusalém, Jesus dá ensino dedicado aos que o seguiam, condenando o Templo, logo ao sair de lá, e, no monte das Oliveiras, explicando sobre o fim do mundo, o seu retorno e o que há de vir antes disso. Usa uma série de parábolas intercaladas com explicações, imperativos e alertas sobre a vigilância e não saber quando: a da figueira (Mt 24.32-44); a do bom e do mau servo (Mt 24.45-51); a das dez virgens (Mt 25.1-13) e a dos talentos (Mt 25.14-30).
A parábola é conectada ao final do sermão do monte. As palavras que classificam as virgens, tolas (mōros) e sábias/prudentes (fronimos), também são utilizadas em 7.24-27. Também a expressão do noivo não vos conheço tem o mesmo significado da expressão de desconhecimento em 7.23.
Sobre as virgens é dito que, naquele tempo (o tempo que antecede ao fim, ao qual Jesus vem se referindo), o reino dos céus poderá lhes ser comparado (ou contrastado?). Pelo contexto, a parábola pode representar a vida da comunidade: o cenário não precisa ser o fim dos tempos, e sim o momento liminar da própria comunidade, com seus horrores e injustiças, que deve ser contrastado ao reino dos céus como fonte de esperança de um mundo melhor (BLICKENSTAFF, 2005, p. 79).
O termo virgens denota mulheres que não tiveram relações sexuais com homens, jovens de cerca de doze anos, aptas para o casamento. Depois, evolui para mulheres que não vivem relações de dependência com homens pelo casamento. Nesse contexto, mostra o status das jovens na sociedade: em oferta para o mercado nupcial. Para Luise Schottroff, esse texto é escrito de uma perspectiva patriarcal: as jovens estavam em uma concorrência para estar na festa, uma ocasião de prova para elas, e serem consideradas sábias e boas esposas (cf. Pv 31.18 e Ec 22.4), para entender o que cercava essa tradição das mulheres e casamento (SCHOTTROFF, 2007, p. 40-42).
As lâmpadas são tochas (ver o que outros volumes de Proclamar Libertação já abordaram sobre isso: o v. 24, com texto de Ivoni Richter Reimer; e o v. 30, de Carlos Luiz Ulrich) que precisavam ser embebidas em azeite ocasionalmente, comumente usadas em procissões festivas de casamento até o local da festa, que costumava ser aberta à população local. Era improvável tamanho atraso do noivo e que convidados atrasados fossem impedidos de entrar, como cinco das jovens. Assim, o final da parábola é uma hipérbole trágica que faz o autor deixar de lado qualquer outra possibilidade verossímil de conclusão. A exortação à vigilância feita por Jesus, narrador da parábola, ao final, tem o mesmo tom da história do noivo que tarda e deixa alguns de fora.
A primeira dificuldade interpretativa é a divisão das jovens entre sábias e tolas, não por estarem à espera do noivo atrasado ou por adormecerem (o que contradiz com o tema da vigilância), mas apenas por terem ou não provimento de uma mercadoria, que podia ser adquirida por todas, uma vez que as tolas saem a comprar. Isso combinado à disputa pelo matrimônio separa as próprias mulheres, que se recusam a compartilhar o azeite e entram na festa sem aquelas que não foram previdentes em relação ao grande atraso do noivo. O efeito sobre quem ouve/lê leva a querer se identificar com as sábias, mas ficar em dúvida se na verdade se identificam com as tolas e ter grande simpatia por elas, pois a classificação não parece justa.
O uso dos termos sábio e tolo é recorrente, mas não muito coerente ao longo do evangelho. O termo tola pode significar fraqueza intelectual ou pessoa que não tem respeito a Deus e é entendido como um grande insulto, como chamar alguém de imbecil. Mas acusar alguém de tolo em meio à convivência contradiz o próprio evangelho (5.22). Também o termo oposto, sábia, é usado com referência às serpentes (10.16), que são usadas como acusação aos fariseus (23.33).
Outro problema: a porta se fecha e o noivo rude se recusa a abrir. Esse noivo não se assemelha ao Deus justo que cuida do desamparado. Tal ação era declarar a morte social das moças, que seriam incapazes para o casamento, uma imagem de opressão social, injusta com o esforço feito. Isso não combina com um reino dos céus que ampara e acolhe o necessitado e débil. Essa imagem não combina com o alvo de missão de atingir a todos.
3. Meditação
Toda parábola exige uma resposta de quem a recebe. Mas qual é a nossa resposta para uma história tão incômoda? O exemplo das dez virgens é trágico e, ao mesmo tempo, claro: todos estamos expostos ao mal social, ao juízo, ao detalhe não considerado que pode nos deixar de fora, sujeitos ao rótulo de tolos ou em necessidade. A disputa no meio do grupo não resolve a situação de que alguns não participam da festa. Talvez a melhor resposta a essa parábola seja a comunitária.
Entendendo que a imagem do reino de Deus nos anima com esperança de um mundo melhor, do qual queremos que todos participem, a resposta pode ser com ênfase na missão em termos de serviço: rever o conceito de vigilância para termos comunitários, ou seja, ser vigilantes comunitariamente ao ponto de não deixar que ninguém se desampare. Apenas o agir comunitário no suprimento das necessidades um dos outros pode cobrir as incompletudes pessoais e levar todos a fazer parte do momento festivo.
Portanto o tema da vigilância cristã se conecta à expectativa repleta de esperança pelo retorno de Jesus e à ética do cristão que ilumina o seu meio. A vigilância se liga tanto à oração, à sobriedade, ao uso de talentos, como à sabedoria e ao agir com responsabilidade para com as outras pessoas, fazendo do amor ao próximo e do serviço as regras da convivência. A festa pode ser mais alegre se todos colaborarem para que todos entrem.
4. Imagens para a prédica
Após a leitura, estimular a comunidade a expressar incômodos em relação ao texto, criar finais alternativos para a parábola que solucionem os incômodos, sugerir ações das jovens que pudessem levar todas a participar da festa.
5. Subsídios litúrgicos
Para o espaço litúrgico, sugerimos que se utilizem lâmpadas, como as virgens, no lugar das velas no altar, que também podem servir para mostrar, durante a leitura e a prédica, diferenciando-as de tochas, mostrando que ambas iluminam assim como a pessoa cristã deve iluminar o seu ambiente. Também é possível explorar a ideia do óleo, com unção, por exemplo.
Saudação
Igreja de Jesus aqui reunida, celebramos este culto em nome de Deus, que nos criou e deseja que ouçamos a sua Palavra; em nome do Filho Jesus, que se entregou para nos salvar, e em nome do Espírito Santo, que nos dá entendimento da palavra de Deus e nos ensina a crer nela e no seu Filho Jesus. (+) Amém.
Oração
Querido Deus, chegamos humildemente a tua presença para agradecer por nossa vida. Obrigada por mais esta oportunidade de nos reunir como teus filhos e tuas filhas para louvar, agradecer, mas principalmente para interceder. Pedimos que estejas conosco e nos dês muita força e ânimo. Não te esqueças de nós. Somos teus e tuas. Como acompanhaste patriarcas e matriarcas, estejas também conosco. Em nome do nosso Senhor Jesus Cristo, que vive de eternidade a eternidade. Amém.
Envio
Vamos agora, caminhemos nos caminhos da paz, na graça do Espírito Santo de Deus, cientes do nosso compromisso cristão de ensinar e viver por fé, na graça de Deus, na perspectiva do reino de Deus que, em Jesus Cristo, acolhe todas as pessoas. Enquanto caminhamos, vamos dizer ao mundo todo que Deus é bom, justo e, por meio do perdão, mediante confissão, faz acontecer vida e salvação. Amém!
Hinos
LCI 112 – Ensina-nos, Senhor
LCI 620 – Meu tempo
LCI 625 – Vigiar e Orar
Bibliografia
BLICKENSTAFF, Marianne. ‘While the Bridegroom is with them’: Marriage, Family, Gender and Violence in the Gospel of Matthew. Londres; Nova York: T&T Clark International, 2005.
SCHOTTROFF, Luise. As parábolas de Jesus. São Leopoldo: Sinodal, 2007. RICHTER REIMER, Ivoni. Antepenúltimo Domingo após Pentecostes: Mateus 25.1-13. In: SCHNEIDER, Nélio; WITT, Osmar L. (Orgs.). Proclamar Libertação. São Leopoldo: Sinodal, 1999. v. 24, p. 312-322.
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