Prédica: Isaías 40.1-11
Leituras: Marcos 1.1-8 e 2 Pedro 3.8-15a
Autoria: Marivete Kunz
Data Litúrgica: 2° Domingo de Advento
Data da Pregação: 06/12/2020
Proclamar Libertação - Volume: XLV
A palavra permanece
1. Introdução
O livro de Isaías, a partir do capítulo 40, apresenta relatos sobre os judeus deportados para a Babilônia. A predição de sua ida para o cativeiro está no capítulo anterior. Os capítulos 40 a 55 apresentam uma mensagem de esperança e conforto ao povo em época de tristeza. O exílio, para aqueles que não conseguiram progredir em seus negócios, tinha sido um período de desalento. Além disso, meio século tinha se passado e para alguns os deuses da Babilônia se mostravam mais fortes que Javé. Muitos acreditavam que o castigo do cativeiro seria permanente. Mas o livro anuncia que o tempo de castigo tinha acabado e que eles já tinham cumprido o período do cativeiro, até de forma dobrada. É nesse contexto que surge a mensagem de Isaías 40.1-11, mostrando que a palavra, enviada por meio dos profetas de Deus, não tinha mudado, mas será cumprida à risca.
2. Exegese
V. 1 – Neste versículo, o verbo consolar, no modo imperativo, é muito enfático e mostra que o povo de Israel estava em aflição no cativeiro babilônico. O início do texto revela urgência tanto do envio da mensagem como do anúncio do amor de Deus pelos seus. Por meio da expressão “meu povo” evidencia-se que o Senhor quer “renovar a adoção de Judá” (RIDDERBOS, 1995, p. 310). Wiersbe afirma a partir da expressão hebraica nāham que “consolar” significa “falar ao coração”, sendo também uma referência aos tempos de “grandes provações” (WIERSBE, 2007, p. 57). O texto não especifica quem eram as pessoas que recebem a mensagem, mas os cincos primeiros versículos evidenciam que era um grande número de pessoas.
V. 2 e 3 – O castigo em dobro pode ser uma indicação à destruição de Jerusalém ou ao período de cativeiro. Wiersbe afirma que a expressão em dobro não quer dizer que Deus havia disciplinado injustamente seu povo, pois ele é misericordioso (Ed 9.13). Compreende-se que o castigo foi na medida certa (Jr 16.18) (WIERSBE, 2007, p. 57). Fica claro que o povo de Israel passou por um período de trabalho árduo e recebeu o castigo duplo de Deus por causa de seus pecados. Aqui é importante atentar para as palavras falai ao coração, pois não se fala apenas em castigo dobrado, mas também que o povo deveria ser consolado (v. 1) e tranquilizado, pois os pecados foram perdoados. A ênfase não está no castigo, mas no tranquilizar do próprio Deus. Falar ao coração é uma forma de cumprir a ordem, ou seja, de consolar o povo. Falar ao coração significa falar com ternura (RIDDERBOS, 1995, p. 310). Os olhos do autor voltam-se nesse momento para Jerusalém e sua condição, pois o tempo de seu trabalho árduo (ou milícia) acabou.
V. 3 – Aqui aparece a figura do caminho, imagem que aparece em outras partes de Isaías, como em 11.16. As expressões e ênfases deste versículo costumam ser associadas pela tradição cristã a João Batista, o precursor que preparou o caminho para o ministério de Jesus Cristo. Essa vinculação com João Batista se confirma, por exemplo, em Mateus 3.3.
V. 4 – Conforme Wiersbe, é possível ver, já no v. 3, que há “a figura de um emissário consertando as estradas e removendo os obstáculos, preparando o caminho para a vinda de um rei” (WIERSBE, 2007, p. 57). Os aspectos topográficos (deserto, ermo) podem estar simbolizando aqui a falta de vida. Nivelar o caminho no deserto era necessário devido às depressões. Os buracos deveriam ser tapados e as pedras, removidas, para o caminho ser acessível.
V. 5 – Este versículo mostra que Deus está chegando e o mundo verá sua revelação e glória. Deus mostrará seu poder, majestade e bondade para toda a humanidade. O povo de Israel é mero instrumento no preparo do caminho para ele.
V. 6 – Este versículo apresenta uma ordem para que o profeta clame. O verbo qerā se encontra no Qal, imperativo, masculino, diferentemente de quando a ordem é para Sião ou Jerusalém (v. 9), quando o verbo se encontra na forma feminina singular (bāsar). É possível que a pergunta que aparece neste versículo (que hei de clamar?) esteja relacionada com a ordem que aparece no v. 3 (clame). A pergunta que aparece aqui traz um tom de desespero. A resposta para esse desespero pode estar nos dois versículos seguintes.
V. 7 e 8 – Os dois versículos mostram que a vida é frágil e transitória e que é Deus quem a controla. Mas eles mostram também que a palavra do Senhor é eterna e permanece eternamente (Sl 37.1-2; 90.1-6; 103.15-18). O ser humano (a carne) é semelhante à erva. Nações e lideranças cumprem seu propósito e desaparecem, mas a palavra de Deus, diferentemente, permanece para sempre (1Pe 1.24-25; 3.8-15). Isso significa: o povo de Israel pode confiar no caminho de retorno à terra natal, pois Deus vai manter suas promessas e estar ao seu lado.
V. 9 e 10 – É incerto nesses versículos se Jerusalém é o arauto das boas novas, ou se essas boas novas seriam enviadas a Jerusalém. No final do v. 9, as boas novas são remetidas para Judá. Talvez o versículo mostre que as boas novas serão trazidas para Jerusalém, mas que essa também é responsável por levar tais notícias. Por isso poderiam ser ambas as coisas. Qual é a boa notícia que deveria ser anunciada por aqueles dias? Certamente a derrota da Babilônia e a libertação do povo judeu. O forte braço de Deus prevalecerá nas lutas. O povo é animado a levar as boas notícias com confiança, pois eis que ali está o seu Deus (v. 9), e ele vem com poder (v. 10).
V. 11 – O povo exilado precisava receber o recado e entender que Javé não o havia abandonado ou se esquecido dele, pois ele ainda era seu rebanho e sua propriedade especial. O poderoso braço de Deus, que reaparece neste versículo, também é o braço que carrega as ovelhas, guiando-as até chegar em casa. Eis a boa notícia!
3. Mensagem
Por que confiar na palavra do Senhor?
Isaías 40.1-11 proclama o conforto que virá do Senhor a um povo identificado como meu povo (v. 1), que vivia aflito em terra estranha. O texto não declara o que tinha acontecido a Israel e não fala de forma precisa sobre exílio ou a restauração da terra. Mas sabe-se que os israelitas estavam refugiados em terra estranha e que Jerusalém estava em ruínas. Eles já estavam no cativeiro há pelo menos meio século. O exílio é visto como castigo pelo que eles haviam feito ou deixado de fazer, ou seja, pelos seus pecados. Mas independente do que houve no passado, agora é tempo do povo ser consolado com a palavra de Deus, pois o trabalho árduo acabou e eles haviam pago por seus erros.
O profeta proclamou a libertação do povo que sofria longe de sua terra. Ele já estava fraco e indefeso frente às nações poderosas. Entretanto, a palavra do Senhor foi entregue ao povo por meio de seus profetas e o povo entendeu que havia esperança. Aquilo que lhes foi dito seria efetivado e eles poderiam confiar em sua palavra. Então vem a pergunta: por que, depois de tanto tempo, ainda confiar na palavra de Deus?
Porque a palavra do Senhor está preservada e permanece
A palavra do ser humano pode ser passageira, como sua vida o é. Tudo no ser humano é transitório e com o tempo até sua beleza se esvai. O que traz mudanças imperecíveis a toda a humanidade é a palavra de Deus, a qual, conforme o v. 8, permanece para sempre e cumpre o que promete. É a intervenção divina que garante a permanência da palavra escrita. O Salmo 119.89 diz: Para sempre, oh Senhor, está firmada tua palavra no céu.
Em Washington há um escritório de padrões. Todo peso e toda medida (polegada, litro, milímetro, jarda, galão etc.) têm uma cópia perfeita nesse local para fins de comparação. Ali está a medida perfeita e o padrão para os demais. Assim é a palavra de Deus. A Bíblia e seu testemunho sobre Deus são uma manifestação confiável dos seus propósitos para conosco.
Os céus e a terra passarão (2Pe 3.10), mas a palavra de Deus permanecerá (Mt 24.35). Conforme Isaías 40.8, seca-se a erva e cai a sua flor, mas a palavra de nosso Deus permanece (yqûm) para sempre. A ideia de permanecer/subsistir diz respeito à figura de alguém que está prostrado e esmagado, mas novamente fica em pé. Assim é a palavra: ela já foi objeto de perseguição, mas sua sobrevivência se transforma em milagre. Por dois mil anos, o ódio de algumas pessoas têm sido incansável e muito esforço tem sido feito para corroer a fé na inspiração e autoridade da palavra. Entretanto, cada amanhecer tem mostrado que essa palavra permanecerá. Essa foi a experiência do povo. Ele se sentia esmagado e acabado, mas o Senhor agora o levanta novamente, o coloca de pé. Essa foi a promessa entregue ao povo por seus profetas. E a palavra se cumpre.
O texto estabelece um contraste entre aquilo que é eterno e aquilo que é perecível. Enquanto a palavra de Deus é eterna, a vida e o ser humano são como uma erva perecível e transitória. Na sua palavra eterna, o Senhor dá ao ser humano a certeza de seu favor. Além da erva, o texto traz outras figuras que mostram a fragilidade humana: a flor que murcha e cai, o vento que sopra. Mas sua palavra permanece e nunca é revogada. Por isso o povo podia confiar em suas promessas. Essa foi a mensagem entregue aos judeus no exílio, que se cumpriu tempos depois. Por isso hoje todos podem confiar em sua palavra, pois ela permanece e será cumprida.
Porque ela traz esperança e segurança
Diante de tantos desafios que o povo de Israel enfrentaria para retornar a Jerusalém, como a falta de recursos, era necessária uma palavra de esperança. E essa veio por meio do profeta Isaías. Em Isaías 40.1-2 vemos que a mensagem ao povo de Deus foi de encorajamento e esperança, pois o Senhor continuava com eles, continuava sendo seu Deus. O castigo não era algo permanente e eles já haviam pago o preço (v. 2).
O povo tinha um desafio monumental, mas faltavam-lhe os recursos para realizá-lo. Se confiasse em suas próprias forças, certamente sucumbiria. Por isso o olhar deveria ser direcionado para as promessas de Deus, e não para si mesmo. Ele deveria olhar para o alto! Isaías então fala ao povo (v. 9): “Eis aí está o vosso Deus!”.
O futuro parecia sombrio, com uma dura ou impossível tarefa a realizar. Mas o profeta mostrou a grandeza do Deus a quem o povo adorava. Esse Deus era maior que as circunstâncias da vida. As coisas do passado atormentavam o povo, pois ele havia desobedecido a Deus, se envolvido com idolatria, feito alianças indevidas, cometido imoralidades, rejeitando a mensagem dos profetas. Como consequência, colheram o cativeiro. Somente uma palavra de encorajamento poderia fazê-los enxergar o futuro que os esperava.
Retornar seria uma grande alegria, mas também significaria fazer um caminho penoso, cheio de desafios. Mas com confiança em Deus tudo ficaria mais fácil. Percebe-se que a partir do v. 3 há uma ênfase na adoração, pois o povo retornaria para Jerusalém a fim de reconstruir o templo, local de adoração especial a Javé. A tarefa seria dura, mas também alegre. E o Senhor os guiaria, abrindo o caminho a seguir. As figuras e imagens que o texto apresenta, como no v. 3, indicam que o Senhor traria ao povo o seu favor. Isso também pode ser visto no v. 11. Todas as dificuldades que porventura aparecessem pelo caminho para a chegada do Senhor ou os empecilhos que bloqueassem o caminho seriam vencidos.
O v. 11 termina com uma série de verbos formulados no futuro: apascentará, recolherá, levará, guiará. São palavras que evidenciam que aquele Deus que virá com poder (v. 10) também será o provedor. Ele vem como o pastor que cuida do seu rebanho com ternura e lhe dá atenção especial. Além disso, a glória de Deus (v. 5) controla a história. Por isso o povo pode retornar à sua terra natal.
Conclusão
A palavra de Deus irá se cumprir, ainda que as aparências indiquem o contrário. Assim como aquilo que foi anunciado ao povo judeu se cumpriu após meio século ou mais, certamente tudo o mais também se cumprirá. Tudo passa e tem um fim, a erva seca e as flores murcham e caem, a vida do ser humano finda. A palavra do Senhor, porém, está firmada no céu. Ela nunca passará, porque é eterna e merece toda a confiança.
4. Imagens para a prédica
Ridderbos observa em relação ao v. 3 que, devido às condições precárias das estradas do Oriente, era feito um trabalho para que as estradas ficassem limpas e transitáveis quando os membros das famílias reais transitassem por elas. O arauto do texto proclama que o rei que se aproxima é o Senhor (v. 3) e que sua chegada será em Jerusalém.
Sobre a palavra que permanece e é digna de confiança, pode-se utilizar a ilustração feita acima sobre o escritório de padrões existente em Washington: todo peso e toda medida (polegada, litro, milímetro, jarda, galão) têm uma cópia perfeita nesse local para fins de comparação. Ali está a medida perfeita, o padrão para tudo o mais.
Bibliografia
RIDDERBOS, J. Isaías: introdução e comentário. 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1995.
WIERSBE, W. Warren. Comentário bíblico expositivo do Antigo Testamento: proféticos. Santo André: Geográfica, 2007. v. IV.
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