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ID: 2690

Hebreus 11.29-12.2

Auxílio Homilético

18/08/2019

 

Prédica: Hebreus 11.29-12.2
Leituras: Jeremias 23.23-29 e Lucas 12.49-56
Autoria: Odair Braun
Data Litúrgica: 10º. Domingo após Pentecostes
Data da Pregação:  18 de agosto de 2019
Proclamar Libertação - Volume: XLIII

Testemunhar a boa nova com perseverança

1. Introdução

Jeremias 23.16-29 possivelmente tenha sido proferido num contexto de celebração, quando o profeta contesta a falsidade dos que diziam falar em nome de Deus. Isso gerava clima de desconfiança, pois a palavra e a verdade de Deus eram atingidas. Jeremias evidencia que da presença de Deus ninguém consegue se esconder. Ou seja, o mentiroso e falso, mais cedo ou mais tarde, é desmascarado. Cabe salientar que esse contexto de falsas profecias, de uso da palavra de Deus de modo distorcido, causava decepção ao povo que confiava. Sob esse prisma é oportuno olhar para a realidade religiosa brasileira. O profeta denunciava a irresponsabilidade dos líderes de então, assim como se opunha à alienação vivida pelo povo que, de certa forma, gostava de ouvir os falsos profetas. O que o profeta nos diria hoje? A profecia de Jeremias deve ser entendida no sentido de orientar o povo de então, assim como o povo de hoje, para que busque conduzir a vida e atuação ao encontro do projeto de Deus.

Lucas 12.49-56 aponta para a verdade que do fogo advém purificação. O fogo depura. Ele limpa sujeira, transforma. Ou seja, para se chegar ao novo se faz necessário enfrentar transformações. Isso vale para o metal precioso, bem como para a vida pessoal. E a transformação que se faz necessária somente acontece quando se olha para Deus, para a atuação de Jesus Cristo, o iniciador e consumador da fé e esperança. A transformação ocorre quando se reconhece e quando há entrega nas mãos de Deus e aos seus cuidados. Ali se abrem as portas da superação e da vitória. Hebreus 11.29 – 12.2 procura apontar para tal realidade.

2. Exegese

Hebreus 13.22 mostra uma autoapresentação do livro, definindo-o como uma carta de exortação. A carta possivelmente tenha sido escrita para uma comunidade que enfrentava tempo de estagnação. Em vista disso, o livro tinha como objetivo injetar ânimo nos participantes desse espaço de vida comunitária. A Carta aos Hebreus deseja que a comunidade perceba que ela tem papel importante no plano de Deus para com a humanidade e, especialmente, que a comunidade deve ter orgulho disso. Em vista disso, deseja que a comunidade e seus integrantes recobrem sua vitalidade e disposição para fazer frente às dificuldades. Neste sentido, Hebreus 13.9 mostra que a comunidade destinatária estava vulnerável frente às falsas doutrinas. E isso tinha que ser enfrentado. Em relação ao local de origem, autoria e destinatários, não há posição unânime por parte dos exegetas e pesquisadores. Porém isso em nada diminui a importância do texto e suas exortações.

A estrutura de Hebreus apresenta os seguintes blocos:

Hb 1.1 – 4.13 – Exortações e reflexões sobre a vocação cristã e suas implicações.

Hb 4.14 – 10.18 – Núcleo da carta: Cristo o verdadeiro sumo sacerdote da nova aliança.

Hb 10.19 – 13.25 – Exortação que apela para a seriedade da situação da comunidade e que requer sua posição e participação, bem como fidelidade.

A passagem em estudo se encontra inserida no terceiro bloco, o qual, por sua vez, pode ser dividido em:

Hb 10.19-39 – Exortação e desafios pastorais.

Hb 11.1-40 – O papel da fé.

Hb 12.1-29 – Exortação à perseverança e testemunho.

Hb 13.1-25 – Exortações para a vida comum e para a caminhada da comunidade.

Todo o capítulo 11 de Hebreus trata do tema fé. Tem como objetivo exortar e promover ânimo, visando à mobilização da comunidade destinatária. Assim sendo, é uma palavra desafiadora que temos diante de nós, razão pela qual ela mesma convida para deixar o peso para trás. Por isso cabe sempre perguntar: quais são os pesos, quais são os fardos atuais? Ou: o que nos impede de viver e seguir a vontade de Deus plenamente?

O pecado (= peso) assedia as pessoas cristãs de todos os tempos. O pecado afasta da vontade e do desejo de Deus. Contudo, a vontade de Deus deseja que sejamos parte, que sejamos uma verdadeira nuvem de testemunhas. Por isso não pode haver isolamento e individualismo. A falta de luz e de sabedoria que se abate sobre os dias precisam ser enfrentados a partir do testemunho cristão. Portanto vida cristã requer ação e significa envolvimento. Equivale opor-se à passividade achando que tudo é assim como vemos, pois isso equivale à vontade de Deus. Pela fé somos e devemos nos mobilizar para fazer a diferença, para transformar aquilo que prejudica a vida.

Hebreus 11.29 se refere à fé do povo conduzido por Moisés, a fé que os pôs em movimento para atravessar o mar de juncos. Hebreus 11.30 aponta que mesmo após a morte de Moisés o povo continuou deixando se guiar pela fé no que não se vê, mas no que se espera. Evidencia-se que a conquista de Jericó não foi só resultado de uma tática militar. Foi resultado da fé em Deus. Hebreus 11.31, no caso de Raabe, indica que foi a fé que proporcionou a decisiva ajuda para se entregar nas mãos de Deus. Em Hebreus 11.32-33 são mencionados cinco juízes e fala-se das façanhas da fé. Em Hebreus 11.34 se aponta para o fato do fogo perder sua virtude destruidora, consequentemente, também transformadora. Quando a fé esmorecer, ela também perde a capacidade de transformação. Em Hebreus 11.35 novamente se mencionam as façanhas da fé, e dali se passa a falar dos milagres da ressurreição. Hebreus 11.36 aponta para o fato da fé ser colocada à prova, no que se segue Hebreus 11.39, onde se observa um balanço geral apontando novamente para o papel da fé. Hebreus 11.40 indica que a comunidade deve ter presente o testemunho de fé, assim como deve estar consciente do privilégio de testemunha.

Hebreus 12.1 mostra uma metáfora de corrida. O pecado precisa ser vencido, pois é ele que impede o triunfo. A perseverança é requerida e ela é indispensável para se chegar à vitória. Isso é testemunhado por uma nuvem de testemunhas. A afirmação “também nós” parece ser um convite, um chamado para seguir na mesma linha do exposto ao longo do capítulo 11. Também nós, um grupo, uma comunidade, uma nuvem de testemunhas, que aponta para os que podem ouvir, testemunhando e convidando para o compromisso da transformação. “Livremo--nos de todo peso” – do grego onkos, traduzido pela Almeida Atualizada por peso – dá a ideia de algo que pode atrapalhar, tirar da normalidade, questionar e desvirtuar do caminho. Hebreus admoesta para que todo peso, preocupação, aquilo que desvirtua e desvia do caminho seja posto de lado, para que possamos correr com perseverança. Em suma, mudar de rumo é preciso. Isso não é fácil, pois somos fortemente envolvidos e ficamos presos, às vezes estagnados. Para vencer esse quadro se requer perseverança.

Hebreus 12.2 evidencia Jesus como iniciador e consumador da fé. A comunidade é peça fundamental nesse processo de vencer e superar as dificuldades que são enfrentadas. Contudo, sozinha fica difícil. Por isso Hebreus orienta a olhar com determinação e firmeza para o consumador da fé, Jesus Cristo, aquele que garante a vitória. Neste sentido, hypomonē = esperança não é algo que possa ser desenvolvido com facilidade. Equivale a ter atitude, disposição, coragem. Como pessoas cristãs, estamos numa luta constante, sendo necessário fixar os olhos em Jesus Cristo, a partir de quem tudo pode ser superado.

3. Meditação

Vivemos tempos de competição e concorrência. Produzir é uma regra, independente das consequências. No reverso dessa moeda observa-se a luta pela sobrevivência de pessoas e do planeta, criação de Deus. A vida é atingida e desprezada. O espaço comunitário é desconsiderado e anulado. Da comunidade cristã se esperam atitude e compromisso. Ela precisa ser parte da nuvem de testemunhas para dizer que há como ser diferente. Fazemos parte deste mundo criado por Deus. E isso deve comprometer.

A comunidade que recebeu a Carta aos Hebreus, na qual está inserido o texto da pregação, estava se distanciando da fé, pois possivelmente achava ser mais fácil viver sem esse compromisso. Com isso sua fé ia diminuindo. Isso também pode acontecer conosco. É fácil nos acomodarmos e nos distanciarmos do convívio comunitário, descuidando da fé. Mas, em contrapartida, temos o exemplo de Abraão, que não esmoreceu; lembramo-nos de Jó, que a cada provação se sentia mais perto de Deus. Ele não se resignou nem desanimou.

Hebreus aponta para a necessidade das pessoas cristãs permanecerem firmes e confiantes na promessa de Deus. O texto coloca diante de nossos olhos uma arena esportiva, na qual somos atletas. Acredito que podemos perceber que a passagem em estudo propõe um profundo consolo, com o objetivo de nos situar a partir do exemplo dos nossos pais na fé.

A partir do texto podemos perceber quatro pontos:

• testemunho dos antepassados;
• perseverança na corrida;
• pensar em Jesus;
• redenção através de Jesus.

Hebreus 11.29 – 12.2 fala de uma jornada na qual caminhamos e que é colocada a nós, pessoas cristãs. Em nossos dias também há lutas e disputas nos diferentes contextos em que nos encontramos. Há a luta pelo espaço de trabalho, pelo sucesso pessoal, por realização, pelo bem-estar da família. Há a luta entre famílias, entre irmãos e irmãs que disputam espaços e heranças. Há luta e sonhos por dias melhores.

Da luta da qual fala o texto de Hebreus há algo distinto. Em Hebreus não está em jogo o direito ou a capacidade dos mais fortes. Na luta proposta por Hebreus faz-se necessária a paciência, ou como diz o texto: Deixemos de lado tudo que nos atrapalha e o pecado que se agarra em nós. Corramos com perseverança na corrida, mantendo os olhos fixos em Jesus. Paciência e perseverança são algo que necessitamos em toda parte e em tudo que fazemos e planejamos. Isso certamente todos sabem de experiência própria, não é fácil nem simples. O fio da paciência e da perseverança é tênue e pode ser rompido facilmente.

Hebreus, ao falar da nossa luta, não põe em questão nossa força muscular física, mas põe em questão nossa capacidade. Perseverança e paciência são uma luta do coração, e não de forças físicas. Por isso é uma luta, uma jornada tão difícil e pesada. Vivemos em uma sociedade que julga e avalia pelo que produzimos. Uma sociedade do fazer. E o sinal maior dessa sociedade é a falta de paciência e perseverança. Tudo deve acontecer em um estalar de dedos ou num apertar de tecla de computador. Não há tempo para esperar, não há tempo para perder. Afinal, o capitalismo ensina: tempo é dinheiro. Queremos fazer e resolver tudo sozinhos. Por isso a luta do coração por paciência e perseverança é árdua e muitas vezes inglória. Como é a luta de nosso coração? Como estão nossa paciência e perseverança? Como lutamos com nossa falta de motivação?

Para responder a essas perguntas também são necessárias paciência e perseverança. Elas precisam estar em tudo que fazemos e também naquilo que não conseguimos fazer, ou que precisamos deixar de lado. O agricultor precisa ter paciência e perseverança para lançar a semente na terra que, por sua vez, precisa do tempo certo para germinar, crescer e dar frutos. Nada pode mudar essa realidade. O enfermo precisa de determinados dias para se recuperar. Ficar nervoso e impaciente em nada vai ajudar. Pelo contrário, só prejudica. Perseverança e paciência são essenciais nas atividades comunitárias, onde sempre há aqueles que têm boas ideias, mas que, ao serem chamados para executá-las, ficam cheios de receio, pedem tempo para pensar e acabam não assumindo. Portanto, em todo lugar onde se espera alcançar transformação, fazem-se necessárias paciência e perseverança. Hebreus fala que essa luta apenas é viável quando olhamos para Jesus Cristo como o grande consumador da fé. Hebreus, no texto em questão, tem isso como pano de fundo. Ele diz: tomem Jesus como exemplo. Seu viver e seu sofrer devem nos ensinar. O sofrer de Jesus não é o sofrer de uma pessoa, mas o sofrer do próprio Deus. Contudo, tratava-se de um sofrer com paciência e perseverança. Na vida de Jesus, nesse seu lutar, persistir e perseverar, foi essencial a oração no Getsêmani, antes de ser detido. Teria sido possível seguir esse caminho, lutar essa batalha sem aquela oração? Nessa oração ocorre o discernimento. No meio da noite Jesus luta com seu Pai, com Deus e seus planos: Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice. Contudo, não seja feito como eu quero, mas como tu queres (Mt 26.39). Erguer os olhos para Jesus quer nos fazer perceber o seu exemplo, quer fazer ver que Jesus fez o começo e mostrou o caminho pelo qual somos chamados a caminhar com perseverança e paciência.

Paciência e perseverança só há lá onde nós nos deixamos presentear. Hebreus diz: Corramos com perseverança na corrida, mantendo os olhos fixos em Jesus, o autor e anunciador da fé. Jesus é começo e o fim. Ele percorre o caminho por nós. Não só o caminho da cruz, onde suas últimas palavras foram: Tudo está consumado! Mais uma vez paciência e perseverança! Aqui chegamos ao ponto nevrálgico da fé cristã: Jesus está ao lado de todos que sofrem. Ele está ao lado de cada qual. Vocês já experimentaram tal presença de Jesus? Ou já lhe aconteceu ter de visitar alguém e não saber como fazer, pois não encontrava as palavras certas? E, então, mesmo sem se sentir à vontade, você foi e teve um encontro abençoado. Você se lembra de algo semelhante que tenha ocorrido? Pois essa é a proximidade de Jesus.

Jesus presenteia a paciência e perseverança que necessitamos para lutar no dia a dia; quer dizer que ele crê por nós quando a nossa fé fica fraca. O sofrer de Jesus no Gólgota o coloca no meio do nosso sofrer. Por isso manter os olhos fixos em Jesus significa colocar nosso sofrimento aos seus pés e dizer: Senhor, não consigo mais. Toma-me em tuas mãos e me guia. Jesus tudo pode consumar em nosso favor. Paciência e perseverança não podem ser fabricadas e revendidas no mercado da esquina. Somente podem ser recebidas de graça como presente vindo de Deus. Para tanto, fazem-se necessárias a entrega e a confiança em Deus.

As coisas não são como nós queremos, e sim como estão propostas por Deus. Ao nos confiarmos plenamente nas mãos de Deus, receberemos paciência e perseverança. Por isso corramos com perseverança na corrida da nossa vida. Que possamos manter nossos olhos fixos em Jesus, o consumador de nossa fé, o Senhor da paciência e da perseverança.

4. Imagens para a prédica

Não estamos numa comunidade cristã por mero acaso. Ali estamos porque somos chamados e chamadas pelo batismo a ser testemunhas de Deus, a correr com perseverança e fé. A corrida proposta é pelo reino de Deus. Por isso devemos estar livres, sem peso, sem fardos visando alcançar a vitória. Por isso devemos ser nuvem de testemunhas. Neste sentido, um possível roteiro para a pregação poderia ser:

a) O que a fé faz e permite? Desafios.

b) A carreira cristã – perseverança e regras.

c) Nosso compromisso – transformação.

d) O alvo a ser alcançado – vida eterna.

Bibliografia

KUSS, Otto; MICHL, Johann. Carta a Los Hebreos. Cartas Católicas. Barcelona: Herder, 1977.
MORA, Bartrés G. La carta a los Hebreos como escrito pastoral. Barcelona: Herder, 1975.


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Autor(a): Odair Braun
Âmbito: IECLB
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2018 / Volume: 43
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 50306

AÇÃO CONJUNTA
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Cada qual deve se tornar para o outro como que um Cristo, para que sejamos Cristos um para o outro e o próprio Cristo esteja em todos, isto é, para que sejamos verdadeiros cristãos.
Martim Lutero
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