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ID: 2690

1 Pedro 3.18-22

Auxílio Homilético

21/02/2021

 

Prédica: 1 Pedro 3.18-22
Leituras: Gênesis 9.8-17 e Marcos 1.9-15
Autoria: Nilton Giese
Data Litúrgica: 1° Domingo na Quaresma
Data da Pregação: 21/02/2021
Proclamar Libertação - Volume: XLV

Identidade cristã

1. Introdução

A primeira leitura, Gênesis 9.8-17, contém a “aliança de Deus com Noé”. A aliança famosa, a mais importante, terá lugar mais tarde, a aliança com Abraão. A aliança com Noé garante que nunca mais haverá dilúvio para destruir a terra! É o que Deus assegura a Noé (Gn 9.11). E essa promessa vem acompanhada por um memorial: o arco-íris, sinal do novo pacto entre Deus e a humanidade. O medo do “dilúvio” foi quebrado! Agora temos uma nova aliança e uma alternativa de vida para todos os seres vivos. A arca transforma-se numa grande casa acolhedora da vida, onde o cuidado com os animais se destaca de uma maneira especial (Gn 9.1-7). É a casa da vida que coloca o ser humano em comunhão com a terra, a natureza e o cosmo.

Marcos 1.12-15 reporta-se à cena em que Jesus foi tentado por Satanás, ao cabo do que os anjos passaram a servi-lo. O confronto com Satanás, como princípio do mal, está presente na vida de Jesus em sua proclamação do reino de Deus. O deserto deixa de ser lugar de prova e penitência, segundo a tradição judaica, para converter-se em lugar de aprendizagem no confronto. O Espírito de Deus leva Jesus até a memória fundacional de Israel, quando, vencendo Satanás, a vida torna-se fidelidade a Deus e ao humano.

Marcos reescreve a história, levando-nos da água do batismo à reconstrução da humanidade, para dizer-nos que Jesus está aí apostando numa opção de vida, dignidade e felicidade humanas. Mas Jesus não assume o combate sozinho. Está junto com os animais e os anjos, como que evocando um novo paraíso. Ao retomar o “paraíso” para reiniciar o caminho do humano, Jesus conta com forças naturais e angelicais (a terra e o céu) favoráveis.

Obviamente, os quarenta dias do deserto não desaparecem no ministério de Jesus. Eles permanecem e são paradigma da contradição e do desequilíbrio que permanentemente atravessam a história.

2. Exegese

A Primeira Carta de Pedro foi redigida possivelmente no final do primeiro século (nos anos 90) na comunidade judaico-cristã de Roma. Ela não foi escrita pelo apóstolo Pedro (que morreu nos anos 50-60), mas a memória de Pedro havia se tornado uma figura de grande prestígio em toda a igreja. Como um dos primeiros apóstolos e como mártir de Roma, a palavra de Pedro tem credenciais. Entre os destinatários da carta estão cristãos da Ásia Menor, mais precisamente os eleitos na dispersão (1.1). Ao dizer que as pessoas cristãs foram “eleitas” por Deus, a carta diz que o batismo é um ato que acontece por iniciativa divina, mas que tem consequências na forma de vida das pessoas. Por isso o batismo é sempre ponto de partida. A partir daí as pessoas cristãs se distinguem por sua forma de vida. E três atitudes são fundamentais em toda pessoa/igreja cristã: são pessoas 1) que se apoiam umas as outras, 2) que partem o pão e 3) que praticam a espiritualidade e a oração. Mas como os recém-batizados ainda não estão suficientemente firmes para conviver com os conflitos e as adversidades, a carta tem o propósito de confirmar a identidade cristã e sensibilizar para a solidariedade e unidade da igreja (SCHMIDT, 2011, p. 116).

3. Meditação

O apóstolo Pedro enfatiza que para ser uma pessoa cristã, para ser uma pessoa seguidora de Jesus Cristo e membro de uma comunidade/igreja cristã é preciso ser “assim como Cristo”.

As pessoas a quem a Carta de Pedro se dirige são pessoas que recentemente entraram para a comunidade cristã e que não entendem por que não se pode ser cristão e adorar os deuses romanos, e até mesmo o imperador, ao mesmo tempo. Eles ainda não estão suficientemente firmes para conviver com os conflitos e as adversidades. Por isso a carta tem o propósito de confirmar a identidade cristã, animar as pessoas para a prática da solidariedade e fortalecer a unidade da igreja.

Ao dizer que Jesus sofreu no corpo, o autor quer dizer que Jesus sofreu como ser humano. Jesus foi verdadeiramente humano, morreu como ser humano, mas o amor de Deus o vivificou pelo Espírito (pneuma). O apóstolo Pedro diz a esses novos cristãos que quando eles se mantêm fiéis a Jesus e seus ensinamentos, eles passam a ter o mesmo cuidado de Deus que Jesus teve. Também nós podemos estar certos da presença, do acompanhamento, do conforto e consolo de Deus e da promessa da ressurreição. Pois esse Jesus Cristo foi para o céu e agora está sentado à direita de Deus (v. 22), a quem estão submissos os anjos, as autoridades e os poderes do céu. Portanto adorar os deuses romanos é inútil, pois é Jesus que tem o poder sobre todas as coisas. Todas as situações da vida e da morte estão sob seu governo.

Inspirados no exemplo e na autoridade de Jesus, os cristãos são chamados a resistir ao mal e manter a consciência limpa. Se há alguma justificativa para o sofrimento de um cristão, esse consiste em manter a consciência limpa (3.21). Aqui o apóstolo enfatiza o comportamento ético das pessoas cristãs.

O apóstolo Pedro lembra que o único sofrimento digno de ser sofrido é aquele que se sofre em nome da justiça, da verdade e da fidelidade a Deus. Assumir o evangelho, testemunhar Cristo tem implicações concretas para a vida pessoal, familiar, comunitária e social. Exige rupturas, opções e renúncias. Há um preço que devemos pagar.

Lembremos que a carta de 1 Pedro foi escrita no período mais duro da perseguição aos cristãos. A primeira perseguição (na qual foram executados também os apóstolos Pedro e Paulo) foi promovida pelo imperador Nero contra as comunidades cristãs em meados da década de 60. Mas no ano 94 aconteceu uma perseguição ainda maior, sob o imperador Domiciano.

Os primeiros cristãos foram perseguidos majoritariamente pelo fato de não adorarem os deuses romanos ou por não participarem dos rituais cultuais em favor do imperador e do império. Adorar os deuses romanos significava demonstração de patriotismo, de respeito à pátria e às suas autoridades.

Por isso muitas pessoas cristãs viviam na clandestinidade. Elas se reuniam com outras pessoas cristãs de forma escondida, seja na casa de alguém e até mesmo nas catacumbas. Nesses encontros elas contavam as histórias de Jesus, cantavam hinos e partiam o pão na celebração da Santa Ceia. Os primeiros cristãos eram muito solidários entre si.

A perseguição romana deixou muitas crianças órfãs e muitos velhos sem o cuidado dos filhos e filhas. Mas na comunidade cristã não havia meninos e meninas de rua ou velhos abandonados. Entre eles não havia necessitados, nos diz Lucas em Atos 2.43-47. Diante da necessidade de alguma pessoa, sempre havia alguém disposto a vender suas propriedades e dividir o dinheiro com a pessoa necessitada.

No entanto, negar-se a adorar os deuses romanos e o imperador como um deus foi considerado um crime político. A partir disso, muitas pessoas cristãs foram denunciadas por seus vizinhos.

Existiam diversas formas de julgamento, mas a forma mais comum era assim: a pessoa cristã deveria publicamente sacrificar um animal aos deuses romanos e pronunciar uma maldição a Jesus Cristo. Fazendo isso, ela seria libertada. Se ela se negasse a fazer isso, então ela seria sentenciada por falta de patriotismo e condenada a trabalhos forçados e até à morte.

Embora na hora H muitos cristãos apostatassem (esse era o termo para se referir às pessoas que fraquejaram, que não aguentaram a pressão, o sofrimento e abandonaram a fé cristã, adorando os deuses romanos e amaldiçoando Cristo), houve também aquelas pessoas que permaneceram firmes em sua fé em Cristo.

Entre eles, segundo a tradição:

Natanael ou São Bartolomeu (?-?): Era um dos 12 apóstolos. Nasceu em Caná, a cidade onde Jesus transformou água em vinho. Depois da morte do Mestre, alguns relatos dizem que ele foi para a Índia, outros que ele foi para a Armênia, onde converteu o rei. Em retaliação, ele teria sido preso por sacerdotes e torturado: sua pele inteira foi arrancada. Depois, teria sido morto (segundo tradições distintas) por espancamento, degola ou crucificação de ponta-cabeça.

Santo Inácio de Antioquia (35-108): Nascido na Síria, Inácio se revelou um teólogo expressivo e um bispo de renome. Foi aluno do apóstolo João e o terceiro bispo da importante cidade de Antioquia. Preso na Síria e levado a Roma, tornou-se o primeiro cristão destroçado e devorado por leões no Coliseu, a mais importante arena do Império Romano.

São Policarpo (69-155): Era conhecido dos primeiros apóstolos e se tornou bispo de Esmirna, na atual Turquia. Foi condenado à morte durante o governo de Marco Aurélio, que havia determinado que todo cidadão do império deveria louvar os deuses romanos. Policarpo foi preso a uma estaca para ser queimado. Mas, milagrosamente, ele parecia imune ao fogo. Sendo assim, acabou esfaqueado. 

Deus não deseja o sofrimento de ninguém, mas, a partir do batismo, os primeiros cristãos entendiam que há, sim, uma forma de vida em que ele deve e pode ser assumido: uma vida em fidelidade ao amor de Deus em Jesus, uma vida que se importa com o sofrimento das pessoas e com a destruição da boa criação de Deus. A partir do batismo, toda pessoa cristã é chamada a assumir as consequências e os desdobramentos do seu compromisso com o reino de Deus.

4. Subsídios litúrgicos

Quando vejo a terra destruída e abandonada, quando vejo muitos lugares e muitas vidas arrasadas pela fúria do rio que arrasta tudo que encontra pela frente, quando vejo pessoas que ficam olhando a destruição provocada por uma enchente ou pelo fogo em que perderam tudo, quando vejo o agricultor carente de recursos e que olha com tristeza para a plantação destruída pelo granizo, eu me pergunto: Onde estão as tuas mãos, Senhor?

Quando observo a injustiça, a corrupção, a justiça distorcida por interesse econômico ou político, quando vejo a pessoa que explora sair vitoriosa, a pessoa prepotente sempre se saindo bem, e quando vejo quem trabalha honestamente, seja no campo ou na cidade, sempre mais pobre e sem ter onde buscar justiça, eu me pergunto: Onde estão as tuas mãos, Senhor?

Quando vejo a criança vendendo balas nos sinais de trânsito, quando vejo seu olhar sem esperança, reclamando um pouco de atenção, de aconchego, quando vejo que ainda existe um resto de amor em seu coração pelo pai ou pela mãe que a abandonou, eu me pergunto: Onde estão as tuas mãos, Senhor?

Quando vejo moços e moças adolescentes com semblantes caídos, sem fantasias, mostrando uma face cansada, que ao cair da noite se pintam os lábios, colocam uma roupa provocativa e saem de casa para vender o seu corpo, eu me pergunto: Onde estão as tuas mãos, Senhor?

Onde estão as tuas mãos, Senhor? Para lutar contra a injustiça, para dar calor, para estender uma mão a quem está desesperado, a quem está abandonado, para resgatar a infância e a juventude das drogas, dar amor e ternura aos esquecidos?

Depois de um tempo de silêncio, escutei uma voz: Minhas mãos são as tuas mãos. Não foi apenas a maldade que aumentou no mundo. Também diminuíram os gestos de bondade. Tenha coragem de usar as tuas mãos para dar amor, para ser instrumento do meu Reino.

Aí eu compreendi que as mãos de Deus são as minhas mãos, as tuas mãos, as nossas mãos.

Bibliografia

SCHMITT, Flávio. 1º Domingo na Quaresma. Prédica 1 Pedro 3.18-22. In: HOEFELMANN, Verner (Coord.). Proclamar Libertação 36. São Leopoldo: Sinodal; EST, 2011. p. 116-120. Disponível em: .


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Autor(a): Nilton Giese
Âmbito: IECLB
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo da Páscoa
Natureza do Domingo: Quaresma
Perfil do Domingo: 1º Domingo na Quaresma
Testamento: Novo / Livro: Pedro I / Capitulo: 3 / Versículo Inicial: 18 / Versículo Final: 22
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2020 / Volume: 45
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 64836

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