Neste mundo de pós-verdades e de extremismos absolutos somos chamados a mediar. Cada tanto circulam imagens e perguntas questionando a perspectiva da pessoa que emite as suas opiniões: qual a cor do vestido? Será que é um seis ou um nove? E a não menos clássica estória dos cegos que descrevem um elefante, é como uma cobra, um tronco, um abanador, etc. Eu já cometi a gafe de colocar sal no café achando que era açúcar. E você já teve momentos assim, onde a certeza perde a sua firmeza e torna-se um talvez ou um estava enganado?
No tempo bíblico, os espelhos não eram como os de hoje. Não existia a tecnologia de fazer uma tinta espelhada tão boa ou um vidro tão perfeito que refletem quase com total fidelidade. Os espelhos que o Apóstolo Paulo utilizava eram principalmente metais polidos que permitiam ter uma ideia do que refletiam, mas era impossível observar os detalhes. Em muitas ocasiões, a experiência era pior do que se ver numa colher de metal dos dias de hoje. Por isso, ao escrever sobre nossa percepção limitada e muitas vezes distorcida, Paulo lembra: Porque agora vemos como num espelho, de forma obscura; depois veremos face a face. Agora meu conhecimento é incompleto; depois conhecerei como também sou conhecido (1 Coríntios 13.12).
Outro dia, escutei um historiador que tinha sido questionado sobre o que poderá acontecer no Brasil. Ele disse que o papel do historiador não é prever o futuro, é observar o passado desde uma distância prudente. Ele indicou que 30 anos será um bom tempo para ter distanciamento emotivo e na maior assepsia possível olhar para os fatos e emitir veredito. Quem estudou um pouco sabe que a história é escrita pelos vencedores e que a visão que nós temos dos fatos passados ainda que dita assepticamente termina sendo influenciada pelos conceitos e preconceitos daqueles que a sistematizaram. Mas mesmo assim, é bom lembrar que o papel do historiador é uma tentativa de encontrar uma explicação lógica e racional para aquilo que aconteceu.
Por que escrevo tudo isto? Porque hoje, cada vez mais, tenho escutado pessoas que se declaram em favor de tal ou qual corrente política. Isso a princípio não é problema. O problema surge quando se absolutiza essa postura e se intenta eliminar as outras. O que você acredita que aconteceria se um daqueles cegos do elefante tivesse a mesma postura que os extremistas de hoje? Será que ia bater e mandar calar a boca dos outros que não acharam o elefante do mesmo jeito que ele? Será que cada qual ia fechar-se em si mesmo e não acreditaria na palavra do outro e na sua forma de ver o elefante? Rogo a Deus que nos ajude a descobrir que somos cegos diante do elefante e que somente vemos parcialmente aquilo que acreditarmos ser o todo.
P. José Kowalska
Paróquia Bom Samaritano - Ipanema, Rio de Janeiro, RJ