Celebração


ID: 2651

A manjedoura está vazia.

29/12/2019

A manjedoura está vazia.

Ainda podemos respirar o ambiente fraterno do Natal. Hoje é o primeiro domingo após o Natal, e já somos desafiados a refletir sobre um texto do Evangelho com sinais de violência, em especial violência contra as crianças. Herodes quer tirar a vida do menino Jesus!

O Evangelho de Mateus coloca esse texto praticamente na abertura, porque a proteção da vida dos pequeninos é um dos temas centrais do evangelho de Mateus. Os pequeninos são caracterizados pelas crianças; pelas mulheres; pelos doentes; pelos “endemoninhados”, pelos estrangeiros, por todos e todas que sofrem à margem da vida. Por isso, na abertura do evangelho de Mateus já surge essa contradição entre a alegria e o medo pelo nascimento da criança Jesus. Além dos magos, reis, pastores – vemos que também os assassinos - são atraídos pelo nascimento de Jesus. Nem bem os anjos deixaram de cantar Gloria Deus nas maiores alturas e paz na terra entre as pessoas a quem ele quer bem e já temos uma história de conflito e de violência contra o recém-nascido Jesus.

Os anjos anunciaram que o nascimento de Jesus significava que Deus desceu para esse mundo, ele veio morar com os seres humanos, e ele veio para cumprir as promessas de Deus no Antigo Testamento. Deus moveu céus e terra para anunciar o início de um novo mundo, um mundo onde as esperanças dos mais pobres finalmente vão se concretizar. Essa é uma boa notícia para os pobres, mas é uma má notícia para os poderosos como o rei Herodes e seu grupo. Aliás as notícias e os acontecimentos são sempre assim: elas são boas para uns e más para os outros. Por isso, antes de concordar ou discordar deveríamos sempre nos perguntar quem serão os favorecidos e quem serão os afetados por tal notícia ou situação?

O rei Herodes era conhecido por sua crueldade. Para se manter no poder ele já havia mandado assassinar membros de sua própria família além de outros adversários. E o rei Herodes considera o nascimento de Jesus uma ameaça. Por isso, de maneira oculta, sorrateira, na escuridão da noite, o rei decide agir contra esse projeto de Deus. Contrata um grupo de assassinos que invadem as casas em busca de crianças de até dois anos de idade. Dezenas de crianças foram assassinadas em Belém e arredores. Esse grupo de crianças são os primeiros mártires do cristianismo. Ninguém sabe ao certo quantas crianças os assassinos degolaram naquela noite. Alguns dizem que podem ter sido algumas dezenas ou podem ter sido milhares.

Em menos de uma semana, Jesus já esteve em perigo de morte por duas vezes. Primeiro por ter nascido numa estrebaria, ou seja, nas piores condições de higiene, que coloca em alto risco a vida de qualquer recém-nascido e de qualquer mãe. E agora, Jesus escapou da matança promovida pelo rei assassino de crianças, porque os anjos de Deus não dormem e estão sempre vigilantes. Eles avisaram a José do perigo iminente. José acordou assustado e entendeu que era naquela mesma noite que ele deveria fugir dali levando a Maria e o menino Jesus para o Egito. Desta forma, o Evangelho de Mateus relaciona a infância de Moisés com a infância de Jesus. Assim como Jesus, Moisés também tinha sido livrado de assassinos quando era criança e foi criado no Egito.

A história de Moisés é considerada a maior atuação de Deus em favor de seu povo, Deus libertou o seu povo da escravidão e deu a Moisés leis com a tarefa de educar esse povo. A Lei de Moisés é um catecismo obrigatório para todo judeu. O grupo de judeus tradicionais tinham o ensinamento da Lei de Moisés como referência religiosa, Cumprir a Lei de Moisés para o judaísmo é o único caminho para se aproximar de Deus. 

Com o nascimento de Jesus, Deus começa uma nova grande intervenção na história. Também Jesus tem seus seguidores e quer educar o seu povo com uma nova lei. A Lei de Jesus tem apenas uma única norma: AMAR. Os seguidores de Jesus devem praticar o amor a Deus e o amor ao próximo. Devem ser solidários, devem ser pessoas compassivas, devem ser pessoas que antes de julgar os outros elas se colocam no lugar dos outros. No grupo de Jesus, ajudar os outros não deve ser entendido como obrigação, mas como um gesto natural dos discípulos de Jesus.

Portanto, um grupo mais tradicional na Comunidade dizia que conhecer e obedecer a Lei de Moisés é o que aproximada as pessoas de Deus. Outro grupo na Comunidade dizia que a Lei de Jesus era mais importante do que a Lei de Moisés. Na lei de Jesus o que vale é a prática da misericórdia. A Lei de Jesus deve sempre priorizar a vida, em especial a dos pequeninos. Mas o Evangelho diz que tem grande perigo maior se aproximando da Comunidade. Mas, enquanto a comunidade discute sobre a maneira de servir a Deus, surgem os assassinos do rei Herodes. Eles querem matar o menino Jesus. Eles foram mandados para destruir o projeto de Deus.

Com esse texto o Evangelho nos quer chamar a atenção que nossa missão como seguidores de Jesus é aplicar e viver conforme a lei de Jesus e estar atentos para as ameaças que vem de fora da Comunidade e que querem destruir o projeto de Deus para nesse mundo.
Estamos chegando ao final de 2019. Olhemos um pouco para trás, em retrospectiva, para entender como as forças assassinas ainda estão presentes e como elas atuam contra o projeto de Deus.

Esse ano 2019 começou com uma série de lutos. Primeiro foi o crime da Vale em Brumadinho em 25 de janeiro que matou 272 pessoas e matou o rio Paraopeba, tirando a fonte de vida de milhares de pessoas e animais que usavam o rio como forma de subsistência. 119 crianças nunca mais viram seus pais desde aquele dia. O outro luto foi a morte de 10 adolescentes do time de base do Flamengo. Eles sonhavam com sair da pobreza através do futebol. Mas, numa noite esse sonho foi carbonizado pelo fogo.

O fogo continuou sua destruição na selva amazônica e no cerrado. O novo governo federal mandou abrandar a fiscalização do IBAMA e com isso os grileiros e madeireiros atuaram derrubando árvores e queimando o que não podiam mais transportar, para finalmente vender a posse da terra arrasada a quem se interessar. Tal como o imperador Nero - que no ano 64 colocou fogo em vários bairros de Roma - o governo federal limitou-se a contemplar as chamas e acusar falsamente supostos autores.

Mas talvez a ação mais catastrófica de 2019 tenha sido o arrocho financeiro sobre o SUS, que provocou a extinção de 26mil cargos públicos, quase a metade deles agentes comunitários de saúde, responsáveis por executar medidas de auxílio à prevenção de doenças, por meio de visitas às casas e da desinfecção de locais públicos e privados. Nós que vivemos aqui no Sudeste do país, conhecemos que os casos de dengue aumentaram sete vezes em relação ao ano passado e ultrapassaram a marca de 1,5 milhão de casos.

Esse arrocho financeiro contra o SUS também já está impactando nas farmácias populares e nos hospitais do SUS. Com a suspensão do contrato com sete grandes laboratórios para produção de remédios gratuitos para o SUS e para venda como genéricos e com a assinatura - agora no final do ano de2019 - do decreto desobrigando o SUS a oferecer sangue e remédios de forma gratuita nos hospitais daqui para frente: Quantas milhões de pessoas vão ser afetadas por essas medidas? Quantas mortes de pequeninos essas medidas vão causar?

Como podemos ver, as forças da morte continuam agindo – ainda hoje - com a intenção de aniquilar o projeto de vida de Deus junto aos mais pobres. Por isso, o chamado do Evangelho de hoje é que a Comunidade cristã deve proteger o projeto de Deus. Deus nos chama para fiquemos atentos as notícias e não deixemos que no apagar das luzes do Natal, desapareça também a mensagem do menino Jesus.

Portanto, nesse texto o Evangelho nos quer chamar a aatenção na defesa da vida das crianças e dos mais pobres. Nos encontros com pais/mães, padrinhos e madrinhas – nós temos feito uma oração que nos lembra que todas as crianças do mundo devem ser nossas crianças. A oração começa assim:

Eterno Pai que nos cuidas com amor de mãe,
estende tua mão sobre todas as crianças do mundo e abençoa-as.
Ajuda-nos a entender que todas as crianças do mundo são nossas crianças
e que cada uma delas é um membro da nossa família.
Que nossos irmãozinhos não mais sofram agressão,
que nossas irmãzinhas já não sejam vítimas de maus-tratos,
que nossas filhas jamais padeçam violentadas,
que nossos filhos nunca mais derramem lágrimas amargas por causa da violência.
Não permitas, ó Pai Eterno, que descansemos enquanto uma só dessas nossas crianças,
em qualquer lugar do planeta,
padecer sob qualquer tipo de opressão, humilhação, abandono ou desamor.
Que nossos irmãozinhos experimentem a alegria,
que nossas irmãzinhas conheçam a felicidade,
que nossas filhas aprendam a sorrir,
que nossos filhos vivam em paz.
E que as crianças do mundo encontrem em nós,
suas irmãs e irmãos mais velhos,
a proteção, a segurança e o carinho de que necessitam para crescer em estatura, sabedoria e graça,
diante da Eternidade e da humanidade.
Desde agora e para sempre. Amém!
 

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Quisera não ter outro pensamento que este: a ressurreição aconteceu para mim!
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