Campanha Em comunhão com as viDas das mulheres


História de vida de Marta Schönholzer Dunck

11/02/2016

 

 

 

Nome: Marta Schönholzer Dunck

Tempo de participação na IECLB: Desde o batismo

Comunidade: Comunidade Evangélica de Confissão Luterana Pastor Norberto Schwantes

Paróquia: Canarana

Sínodo: Mato Grosso

 

 

 

Aos 83 anos de idade a memória já não guarda muitos acontecimentos, pormenores, mas lembro com muita emoção do que ficou registrado, provando que o que foi importante é possível ser puxado como um fio que se desenrola, enrola de novo....

Nasci aos 27 dias do mês de outubro do ano de 1933 e fui batizada em dezembro de 1934, em Santa Rosa, na Evangelical Lutheran Church (UAC).

Meus pais, Germano Schönholzer, de família luterana, imigrante Suiço, veio ao Brasil em 1822. Após ficar viúvo e com três filhos, se casa com minha mãe, Maria Perius Zimmer - de família católica, que foi aconselhada pelas vizinhas para ajudar a tomar conta dos filhos. Ele trabalhava empregado. Era o serrador na serraria e ela dona de casa e agricultora.

Quando eu tinha dois anos de idade meus pais mudaram-se para o então município de Braga, um pequeno povoado. Naquela época ainda não havia escola nessa localidade, somente a Igreja Católica onde, com minhas amigas, frequentava os programas que ela desenvolvia. A Igreja Luterana mais próxima ficava no município de Santo Angelo. Na época só contávamos com um caminhão-reboque, que era usado para a retirada de madeira a ser levada à serraria e em emergências. Para batizar as crianças que nasciam, esperava-se por quase dois anos e, então, íamos de carroça até Restinga Seca, viagem de dois dias, na casa da vovó Maria Barbara e vovô Francisco Zimmer. 

Minha mãe não sabia ler e foi somente aos sete anos que eu tive contato com as histórias da Bíblia. D. Ana, nossa vizinha, lia a Bíblia na língua alemã e eu gostava muito de ouvir as histórias, juntamente com suas filhas, Eli e Lídia.

Para começar meus estudos, aos 7 ou 8 anos, fui levada para a casa de meus tios Cornélio e Matilde, em Santa Rosa. As aulas aconteciam na Igreja Evangélica. O professor era o filho do pastor. Não lembro mais do seu nome. Lá fiquei por um ano.

No ano seguinte, quando estávamos retornando para retomar meus estudos, meu pai, ao visitar seu amigo Fritz, que estava preso por falar a língua alemã, no vilarejo de Campo Novo, ficou preso por um dia, por tê-lo cumprimentado também na língua alemã, apesar de possuir o “salvo conduto”. Soltaram seu Fritz e prenderam meu pai. Ao soltá-lo, prenderam o amigo novamente. Com essa trapalhada toda, voltamos para casa. Naquele ano, por sorte, chega D. Luiza, a nova professora do local.

No ano seguinte, mudamos para a localidade de Lajeado Tigre, pertencente ao município de Tenente Portela, onde meu pai havia comprado um moinho, no qual trabalhei como munheira mais tarde, por muitos anos. Meu pai continuava trabalhando no Braga. Continuei meus estudos com a professora D. Brandina, em Tronqueiras.

Fiz os estudos da “doutrina” com o professor Verno Antton e fui confirmada no dia 6 de maio de 1948 na Comunidade Evangélica de Tenente Portela, pelo pastor Friedrich Zander. Aos domingos íamos de carroça participar dos cultos, quando o pastor Zander vinha da paróquia de Três Passos. Foi ele quem fez meu casamento, no dia 15 de agosto de 1954, quinze dias após o casamento civil, porque na ocasião o Rio Turvo transbordara.

Depois de casada fomos morar a três quilômetros de Tenente Portela. Então íamos aos cultos também quando o pastor ia ao município.

Em 1960, comecei a participar dos encontros da OASE em Tenente Portela, uma vez ao mês, quando o pastor Norberto Schwantes assumiu a paróquia de nossa cidade.

Nesses encontros, também organizávamos e reformávamos roupas que chegavam do estrangeiro, pelo programa “Pão para o Mundo”, para a doação aos necessitados. Por vezes, organizávamos chás aos sábados e jantares, com o objetivo de angariar fundos para manter o internato evangélico.

Dessa época, lembro com muito carinho de D. Gertrud Schwantes, esposa do pastor Norberto, de D. Norma Fries, Araci e Neli Breunig, da D. Olinda Ghercke e de tantas outras, das quais não recordo mais os nomes. Companheiras de tantos trabalhos pela comunidade. Nas festas da comunidade era convidada para liderar o grupo de mulheres nos preparativos das cucas, assadas no forno da padaria de D. Veni Stirmer. Também lembro dos Srs. Olinto Ott e Willy Schmidt, responsáveis por puxar o sino. Por dez anos prestamos nossos serviços à Comunidade, até que, convidados pelo pastor Norberto, eu e meu marido resolvemos migrar para Mato Grosso, juntamente com mais oitenta famílias.

Então, no ano de 1973, eu, meu esposo Augusto Dunck e nossos dez filhos nos mudamos para Canarana, integrados a um projeto de colonização, liderado pelo pastor luterano Norberto Schwantes, de Tenente Portela. A decisão de mudar se deu pela necessidade de proporcionar à família novas possibilidades e terra para cultivar.
 Nossa chegada ocorreu no dia 11 de janeiro. Tempo das águas. Literalmente era começar mais uma vez, só que diferentemente de quando nos casamos, pois tínhamos dez filhos para sustentar e em meio ao cerrado mato-grossense, numa casa construída com lona e folhas de coqueiro, mas com uma vontade enorme de desenvolver a terra que escolhemos para recomeçar. 

No início, as famílias reuniam-se para comentar principalmente sobre “a saudade do sul”, os problemas a serem enfrentados, as doenças que surgiam etc. Nos finais de semana nos reuníamos nas casas das famílias, tanto evangélicas como católicas, para ler a Bíblia, meditar, cantar muito. Isso nos ajudou profundamente a suportar a saudade e enfrentar o dia a dia. 

A chegada do pastor Hildor Reincke foi muito boa. Ele reuniu as mulheres na casa da D. Ida e lá pudemos falar das nossas dificuldades e saudades. Nessa reunião vimos que todas tínhamos as mesmas dificuldades e anseios, por isso decidimos nos encontrar uma vez por mês. Essa foi considerada a primeira reunião da OASE, em Canarana, da qual participavam mulheres de diferentes denominações religiosas.

Nessas reuniões, além realizar estudos bíblicos, oração e cantos, conversávamos sobre tudo o que estava acontecendo: a falta de alimentos, de medicamentos, dificuldades em lidar com as novas doenças até então desconhecidas, os atoleiros nas estradas recém-abertas, o clima diferente, a terra que não sabíamos como cultivar... A afirmação “Canarana, por lembrar Canaã, a terra prometida” foi também a nossa esperança de dias melhores, apesar de todas as adversidades.

No dia 1º de julho de 1974 foi realizada a primeira reunião para formar a Comunidade de Evangélica de Canarana, e o pastor Hildor ficou incumbido de visitar e assistir todas as famílias luteranas que viessem a se estabelecer na região. Foi sua missão como pastor designado pela IECLB, em novas áreas de colonização.

Em 1976, no dia 25 de julho, a jovem comunidade inaugura seu centro comunitário, local usado para as mais diversas finalidades, tanto pela comunidade quanto por instituições da cidade, por membros e não membros. Por muito tempo, as mulheres ficaram incumbidas de zelar pelo local.

Em 1985, no dia 17 de fevereiro, foi registrada a ideia da construção do templo e começou-se a arrecadação de fundos necessários para o seu início. Foram muitas promoções, muitas reuniões, e em 27 de julho de 1986 foi lançada a pedra fundamental com a presença do estagiário Geraldo Grützmann. Relato estas datas para mostrar o trabalho que tínhamos pela frente, em meio as dificuldades existentes.

Graças ao trabalho desenvolvido pela comunidade e pelo grupo da OASE, com incontáveis jantares e almoços, o trabalho nas festas e arrecadação de donativos pelas famílias é que em julho de 1998, treze anos depois, inauguramos o templo, e em 31 de dezembro, a torre e o sino. Importante lembrar que também fomos auxiliados pela OGA.

O papel da OASE nesse tempo todo foi fundamental. Assumir os trabalhos na cozinha, colaborar e promover jantares e almoços, fazer artesanato para arrecadar fundos. Impossível lembrar de tudo o que fizemos.

A OASE também, com suas promoções, colaborou dando o material para fazer o piso e comprar material pedagógico para uma creche municipal; pagou exames laboratoriais na Campanha contra a verminose, colaborou na compra dos tijolos para a construção do templo e na aquisição de parte de suas janelas e tantas outras atividades.

Fomos desafiadas, com a colaboração do pastor Ari Käfer, a também pensar e agir globalmente, como denunciar a pesca predatória e a caça, que era proibida. Assumir cargos na diretoria da comunidade, bem como na OASE, foi importante. Entretanto, foi o empenho dos membros, e em especial das mulheres, nesses anos todos, que encorajou nossa união em torno da fé, em prol de um projeto de vida comunitária luterana em solo mato-grossense. Deus, em nossos momentos mais angustiantes, também esteve conosco, nessa caminhada. “ Deus é Castelo forte e bom, defesa e armamento. Assiste-nos com sua mão, na dor e no tormento...”.

Penso que meus “conselhos” e opiniões, ajudaram muito as pessoas que vinham até nossa casa para desabafar, colocar suas angústias, pedir guarida. Muitas voltavam, depois, agradecendo.

Atualmente, ainda participo das reuniões semanais do grupo “OASE Unidas em Cristo”. Lugar onde podemos levar nossas dores e alegrias. Confraternizar. Agradeço a Deus pelas bênçãos recebidas nestes anos todos e agradecimentos a todas as mulheres que participaram nesta caminhada de Fé, Trabalho, Comunhão e Serviço. Amém.


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