Campanha Em comunhão com as viDas das mulheres


História de vida de Helvetia Hulda Bender

09/08/2017

 

Nome: Helvetia Hulda Bender

Tempo de participação na IECLB: Desde o Batismo

Comunidade: Alto Linha Santa Cruz – Paróquia Monte Alverne/RS

Sínodo: Centro-Campanha-Sul

Sou Helvetia Hulda Bender. Nasci em 18 de maio de 1950 e fui batizada em 30 de julho do mesmo ano na Comunidade de Alto Linha Santa Cruz, Paróquia de Monte Alverne. Participava na comunidade com meus pais de forma regular, mas não com grande envolvimento.

Dos 14 aos 24 anos fiz curativos nos pés de uma vizinha. Quando eu tinha 20 anos faleceu minha avó materna a qual também cuidei até a morte. Estava envolvida com atividades de cuidado desde pequena. Certa vez acompanhei a vizinha para fazer uma cirurgia em Porto Alegre, no Hospital Moinhos de Vento. Descobri que tinha curso de enfermagem neste hospital.

Fiz a inscrição e prova de admissão no curso de enfermagem oferecido no Hospital Moinhos de Vento. Consegui passar. Logo veio o desafio de conseguir os recursos. Meus pais venderam uma vaca por 500.00 cruzeiros. Estes eram suficientes para dois meses: pagar o curso, moradia, alimentação. Só a saudade foi maior que a fome, também nos dias que passei com apenas um pastel. Depois, o pai me deu uma espiriteira de álcool, uma panela, um prato e um par de talheres. Levava chuchu, batatas, cebolas e folhas de couve. Disto fazia minha comida.

Estava à procura de um emprego quando ouvi o Pastor Damerow falar sobre a Faculdade de Teologia, em São Leopoldo. Num sábado de manhã resolvi ir para São Leopoldo. Chegando à rodoviária pedi informações sobre como chegar ao Morro do Espelho. Ninguém soube me explicar. Não tinha ônibus pra lá, somente táxi. Aí meu corpo ficou mole, me sentei num banco e comecei a chorar porque eu não sabia mais o que fazer da minha vida sem dinheiro, sem comida e sem trabalho. Pensava: como vou trabalhar em São Leopoldo e estudar no Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre? Como conciliar os horários sendo tudo muito longe? 

Sentada no banco, pensando na minha vida lembrei-me da vó Luíza e da herança de varizes – ela passou toda a vida com perna enfaixada e com muita dor, eu não queria isso para mim. Como eu vou continuar na roça? Qualquer machucado sempre logo inflamava.

Levantei do banco e olhei pra frente, para a estrada reta e longa. Comecei a andar e andar nesta estrada, sem destino. Foi o pior caminho que já andei. Lá longe eu vi uma torre branca. Como eu não via solução para minha vida, de curiosa fui até a torre. Cheguei lá e eu estava na frente do túmulo do Padre Réus. Vi muita gente trazendo rosas, outras tirando rosas, outras tiravam sua carteira de trabalho do bolso e esfregavam na foto do Padre. Eu sentei bem quietinha num banco e comecei a orar pedindo a Deus que me fortalecesse para continuar, que me desse uma luz, mostrasse um caminho novo que até então eu não tinha visto.

Voltei para a estrada e numa parada peguei o ônibus de volta para Porto Alegre. Sentei ao lado de uma mulher alguns anos, mais velha que eu. Começamos a conversar. Falei que estava procurando emprego. Ela me disse que na segunda de manhã, no Hospital das Clínicas em Porto Alegre/RS, teria seleção para emprego de atendente de enfermagem. Ela pediu para que eu não falasse que ela me indicara, pois não queriam que funcionários fizessem indicação. Eu deveria dizer que vi o anúncio no jornal.

Segunda feira, ao invés de ir para a aula, falei com a enfermeira Vera Petersen, responsável pela seleção. Quando cheguei à secretaria fui perguntada se eu tinha curso de enfermagem. Falei que estava cursando. A secretária então, me disse que não adiantava esperar, pois só quem tinha curso completo teria chance. Mas, eu não dei bola. Pensei: Hoje já perdi a aula então vou esperar. Apareceram mais 25 pessoas, além de mim.

A enfermeira Vera chegou e nos cumprimentou com um sorriso e nos convidou para irmos à outra sala. Ela começou a falar dizendo que gostaria de dar emprego para todos, mas não era possível, pois só tinham oito vagas. Deu um papel amarelo do RX para todos e pediu que escrevêssemos porque estávamos ali. Eu coloquei que vim de Santa Cruz para fazer o curso de enfermagem. Apenas havia iniciado o curso, mas sabia verificar os sinais vitais. Preciso muito de trabalho, estou passando necessidade. Tenho muita força de vontade. Entregamos as folhas e ela pediu que voltássemos na terça-feira.

Voltei no dia indicado e a secretária me perguntou o que eu queria novamente ali. Eu disse: - Vim para saber o resultado. Ela disse: - Não precisas esperar. Não foste escolhida sem curso completo. Eu respondi: - A Vera é quem pode dizer isto. E a Vera chegou, abriu os braços para me abraçar e disse: - Venha comigo! E a secretária viu. Vera me levou para a sala das enfermeiras e disse para uma delas: - Esta é tua nova funcionária. Ela só sabe verificar os sinais vitais, mas tem muita força de vontade.

Sábado eu estava sem rumo, parecia que o mundo tinha parado para mim. Na segunda procurei emprego no Hospital das Clínicas. Na terça soube do resultado e na quarta-feira, dia 30 de abril de 1975 comecei a trabalhar. Permaneci trabalhando no Hospital das Clínicas até 28 de dezembro do ano 2000.

Como lugar para morar a Irmã Marta, do Hospital Moinhos de Vento, nos indicou uma pensão feminina. Ela não sabia que esta era apenas uma pensão de fachada, pois na casa, moravam as moças que se prostituíam na Boate Madrigal – casa noturna que funcionava na Av. Farrapos. Fomos eu e mais três jovens do curso morar lá. 

Dona Lurdes era a proprietária da pensão. A casa era enorme. Entrando pela porta tinha um grande corredor e em cada lado do corredor tinham três escadas que davam acesso aos porões. Os quartos grandes ficavam no porão de baixo. Em cima e nos fundos de uma escada tinha outro porão, lá eu ficava. Só tinha um banheiro com água quente que era aquecida com álcool, para não gastar luz. Cada uma tinha que comprar o seu álcool.

Nessa pensão, aconteciam estranhos movimentos e chamadas na campainha. Ela começava a tocar às 18h e assim ia até às 20h. Dona Lurdes chegava no corredor e gritava: Fulana, o Ciclano chegou. Eu não entendia o que estava acontecendo. Sem pensar mal fui perguntar Dona Lurdes e ela ficou braba comigo e me xingou porque eu havia reclamado que o aluguel subia a cada semana. Foi quando ela sugeriu que eu fizesse o mesmo que aquelas moças dizendo-me que eu iria ganhar muito dinheiro sem precisar passar fome.

Aos poucos comecei a entender o que estava acontecendo nesta casa e fui falar com a Irmã Marta que ficou muito surpresa. Ela não sabia que esta pensão funcionava como um prostíbulo.

No tempo em que morei naquela pensão fiz amizade com uma das mulheres que se chamava Paula. Ela me ajudou comprando o tecido e os acessórios para confecção do avental que eu precisava para o trabalho, pois o hospital não tinha o meu tamanho. E ela me falou: - Não entre na vida que eu estou. É uma vida muito sacrificada. Fica firme no teu propósito. Eu perguntei a ela por que não saía dessa vida? E ela me disse que depois de estar no meio era difícil de sair. 

Depois de concluir o curso passei a trabalhar também no Hospital da PUC. Também neste processo seletivo tive que explicar porque eu queria mais um trabalho e por quanto tempo eu conseguiria trabalhar em dois lugares. Eu disse que ficaria pelo menos dois anos porque o que eu mais queria era ter um banheiro só pra mim. Mesmo já tendo mudado de pensão, nos lugares em que morava o banheiro era sempre coletivo e aquecido com álcool.

Fiquei nove anos e três meses nos dois empregos e consegui comprar um apartamento de um dormitório para eu morar. Trabalhava muito para conseguir me manter em Porto Alegre. Um dia, quando o Pastor veio lhe visitar, uma pessoa internada me convidou para celebrar a ceia com ela. Foi quando conheci o Pastor Bonato (motoqueiro), da Comunidade São Marcos. Ele me convidou para me integrar na comunidade. Participei o quanto pude e depois de me aposentar o Pastor Evaldo Pauli me convidou para participar das reuniões da OASE.

Fui a primeira presidente da OASE desta comunidade. Assumi o cargo aos trancos e barrancos, pois eu não tinha conhecimento da dinâmica nem do funcionamento de uma OASE. Também participei das atividades no Sínodo Rio dos Sinos. Depois fui presidente da comunidade. Foi um período muito difícil porque primeiro o presidente titular da comunidade faleceu e depois o pastor faleceu também. Mas com muita fé luta e solidariedade a comunidade seguiu em frente.

Em 10 de dezembro de 2010 decidi voltar para minha terra natal e passei a integrar a comunidade e a OASE de Alto Linha Santa Cruz. Participo da diretoria e colaboro com trabalhos manuais. Continuo firme na minha fé, no meu propósito de vida. Mesmo lutando com muitas enfermidades encontro alegria na linda e maravilhosa natureza, criação de Deus, que me cerca e na fé que me fortalece.


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