200 Anos de Presença Luterana no Brasil



ID: 3277

Igreja Evangélica no Brasil Central: 75 anos*

28/06/1912

 

Comunidades no Brasil Central

A mais antiga das comunidades que hoje pertencem a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), é Nova Friburgo, perto do Rio de Janeiro. Foi fundada por imigrantes alemães evangélicos que lá chegaram em maio de 1824. Juntamente com o primeiro grupo veio o primeiro pastor da nossa igreja, Friedrich Oswald Sauerbronn (1772 - 1864). Nos decênios seguintes, imigrantes e seus descendentes fundaram outras comunidades na região que na época foi chamada de Brasil Central e abrange os atuais Estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo.

A Conferência de Pastores Evangélicos (1867)

Para o extenso campo de trabalho do Brasil Central a Missão de Basiléia (Suíça) enviou, desde 1861, alguns pastores-missionários. Um deles era Karl Wagner-Groben (1836 - 1886). Assumiu inicialmente um pastorado em Santa Catarina (1861). Em 1864 tornou-se pastor no Rio de Janeiro. Um de seus propósitos era reunir todas as comunidades evangelicas de origem alemã numa igreja evangélica. Mas naquele tempo não houve condições para realizar tal plano. Por isso Wagner-Groben e alguns colegas seus, também enviados de Basiléia, fundaram, em agosto de 1867, no Rio de Janeiro, a Conferência de Pastores Evangélicos. Essa, porém, não teve grandes repercussões. O próprio Wagner-Groben retornou para a Europa já em 1871.

A Conferência Pastoral do Brasil Central (1909)

Pelo final do século XIX, a Missão de Basiléia diminuiu seu engajamento no Brasil. Em vez disso vieram para o Brasil Central pastores relacionados com a Igreja da Prússia (Alemanha). Entre eles surgiu, uns 40 anos após a tentativa de Wagner-Groben, de novo a ideia da fundação de um Sínodo. As perspectivas, desta vez, eram muito melhores. Entrementes havia exemplos que podiam ser seguidos. Nos Estados sulinos existiam o Sínodo Rio-Grandense (desde 1886) e o Sínodo Evangélico Luterano de Santa Catarina e Paraná (desde 1905).

De 27 a 30 de margo de 1909 reuniram-se, em São Paulo, 5 pastores e 10 representantes leigos das comunidades do Rio de Janeiro, Petrópolis, São Paulo, Rio Claro, Campinas e Santos. Do culto de abertura da importante reunião participaram nada menos que 450 pessoas. Em 28 de margo, aquele pequeno grupo de pastores e leigos discutiu, entre outros assuntos, a união definitiva das comunidades num Sínodo. Viram-se as dificuldades, mas resolveu-se dar o primeiro passo: foi fundada a Conferência Pastoral do Brasil Central.

Os estatutos, aprovados igualmente com unanimidade, estabeleceram como objetivos: promover a vida de fé, estimular a reciclagem teológica, apoiar o trabalho pastoral em geral, fomentar os interesses das comunidades em igreja e escola. Como uma de suas tarefas mais importantes a Conferência Pastoral assumiu o compromisso de viabilizar e fomentar a participação regular de leigos. Manifestou também sua disposição de entrar em contato com organizações semelhantes já existentes ou a serem fundadas no Brasil. Era algo assim como o primeiro germe da ideia de uma Federação de Sínodos.

As reuniões seguintes foram realizadas de 5 a 7 de outubro de 1910, no Rio de Janeiro, com a participação de 6 pastores (incluindo, como hóspede, um representante da Conferência Pastoral do Espírito Santo), e de 2 a 4 de dezembro de 1911, em Petrópolis, com a participação de 7 pastores. Merece ser destacado, entre os muitos assuntos discutidos, o fato de que os pastores se ocuparam também com a questão dos povos indígenas da América do Sul, tão importante até aos nossos dias. De grande importância era igualmente a informação que o Pastor Ludwig Hoepffner(1875 - 1941), do Rio de Janeiro, deu na reunião de 1910: havia elaborado, a partir de um modelo francês, uma agenda (ordem de culto) em língua portuguesa que em breve seria impressa.

A questão do Sínodo

O assunto principal das reuniões, sobretudo da de 1910, foi a ampliação da Conferência Pastoral (constituída só por pastores) para um Sínodo (formado por pastores e leigos). Não houve nenhuma dúvida quanto a necessidade e utilidade de um Sínodo. Poderia despertar o interesse dos membros pela igreja, bem como sua consciência comunitária, promover o fortalecimento mútuo dos cristãos e das comunidades e fomentar a renovação na fé. Seria, enfim, uma obra que contribuiria para a edificação do reino de Deus.

Foram estudados diversos aspectos da questão sinodal, como os primeiros sínodos na história cristã e o desenvolvimento dos sínodos nas igrejas luteranas, inclusive entre imigrantes alemães na América do Norte. Os pastores ocuparam-se com uma série de detalhes da organização sinodal. Examinaram a possibilidade de publicar um jornal como meio de comunicação e divulgação, Mais tarde, porém, o Sínodo achou melhor aceitar como órgão seu o jornal evangélico Der Christenbote (O Mensageiro Cristão), publicado mensalmente em Blumenau pela Conferência Pastoral Evangélica de Santa Catarina.

Controvertida era a questão se o Sínodo devia ser aberto para todas as comunidades teuto-evangélicas do Brasil Central (inclusive as decididamente luteranas) ou apenas para as relacionadas com a Igreja Evangélica da Prússia. A Assembleia Constituinte do Sínodo, em 1912, decidiu-se pela primeira possibilidade.

Os estatutos do Sínodo

O anteprojeto dos estatutos do Sínodo foi elaborado, por incumbência da Conferência Pastoral de 1910, pelos pastores Ludwig Hoepffner e Walter Leesch (1881 -1919), de Petrópolis, assistidos pelo sr. A. Gertsch, Cônsul Geral da Suíça no Rio de Janeiro e membro da diretoria da comunidade da então capital federal. Na Assembleia Constituinte, depois, diversos artigos foram bastante modificados. O resumo que segue já considera as modificações.

O Sínodo foi designado Sínodo das Comunidades Teuto-Evangélicas do Brasil Central ou, brevemente, Sínodo Evangélico do Brasil Central. Sua base confessional foi definida de maneira ampla como sendo as verdades salvíficas reveladas nas Sagradas Escrituras. Acrescentou-se que o Sínodo se vincularia as igrejas da Reforma.

O Sínodo se propôs fortalecer nas comunidades a consciência de serem membros de uma só igreja evangélica. Visava tornar-se um centro unificador a fim de conservar e fortalecer a vida teuto-evangélica. Como tarefas sinodais específicas foram mencionadas, entre outras: fazer crescer a disposição de se engajar pela causa teuto-evangélica no Brasil; prover diaconisas para assistência aos doentes e as congregações; formar professores evangélicos capacitados; prestar assistência espiritual aos evangélicos dispersos e fundar novas comunidades; providenciar assistência pastoral a comunidades sem pastor.

A Assembleia Constituinte do Sínodo (1912)

A Assembleia Constituinte do Sínodo do Brasil Central realizou-se de 28 a 30 de junho de 1912, no Rio de Janeiro. Haviam sido convidadas todas as comunidades e/ou pastores no Brasil Central, filiados à Igreja da Prússia. Participaram 10 pastores e 8 delegados leigos, representando 10 comunidades, a saber, do Estado de São Paulo: Santos, São Paulo, Campinas e Rio Claro; do Estado de Minas Gerais: Juiz de Fora: do Estado do Espírito Santo: Campinho, Califórnia e Santa Leopoldina I: do Estado do Rio de Janeiro: Petrópolis; do Distrito Federal: a comunidade da cidade do Rio de Janeiro. Das comunidades convidadas faltou apenas a de Jequitibá/Santa Leopoldina II, no Espírito Santo.

No primeiro dia, uma sexta-feira, os estatutos do Sínodo foram longamente discutidos, emendados e aprovados. Sua aprovação definitiva, porém, dependia da aprovação por parte das comunidades e do deferimento (Genehmigung) da direção da Igreja da Prússia. Para a diretoria sinodal foram eleitos: como presidente, Pastor Ludwig Hoepffner; como vice-presidente, sr. A. Gertsch; como secretario titular, Pastor Walter Leesch, e como suplente, sr. Josef Kling (Petrópolis); como tesoureiro titular, sr. Heinrich Bamberg (São Paulo), e como suplente, sr. Ph. Kahler (Juiz de Fora); como vogal, Pastor Hermann Fischer (nasc. 1879), de Santa Leopoldina I.

No sábado, 29 de junho, foi examinada a questão da assistência pastoral as novas áreas de colonização em Minas Gerais, no Espírito Santo e em São Paulo. Por um lado apontou-se para os prejuízos religiosos, nacionais (!) e culturais causados pela escassez de visitas pastorais em núcleos distantes no Espírito Santo. Por outro lado tomou-se conhecimento, com gratidão, do vivo interesse pela igreja de teuto-russos luteranos recém-imigrados no Estado de São Paulo. No fim foi decidido pedir a direção da Igreja da Prússia, em Berlim, que mandasse um pregador (pastor) itinerante. Foi discutido também o trabalho das mulheres nas comunidades. Até então existia, no Brasil Central, só um único grupo (seria hoje um grupo da OASE - Ordem Auxiliadora de Senhoras Evangélicas), fundado em Juiz de Fora pelo Pastor Fritz Bliedner (nasc. 1883). **

Partindo de uma palestra dele, recomendou-se unanimemente a fundação de grupos de mulheres em todas as comunidades. Sua tarefa seria viabilizar e apoiar a assistência a doentes e pobres em geral, sobretudo a parturientes e solteiras, p. ex. pela contratação de uma diaconisa.

O domingo, 30 de junho, reuniu os delegados sinodais, de manhã, para um culto com Santa Ceia. Seguiu-se a reunião da Conferência Pastoral do Brasil Central, com discussões sobre um tema teológico a partir de uma palestra do Pastor Walter Leesch. Na ultima parte da assembleia, o Pastor Bliedner informou que havia elaborado um roteiro para o ensino confirmatório, com as partes principais (p. ex., o catecismo) nas línguas alemã e portuguesa (!), como subsídio para pastores em comunidades bilíngües. Já naquele tempo, pois, começou-se a usar o português, onde a situação o exigiu.

As 19h30m, finalmente, realizou-se o culto festivo de encerramento, muito bem frequentado pela comunidade. O Pastor Wilhelm Teschendorf (nasc. 1876), de São Paulo, um homem de 36 anos, pregou sobre Isaías 40.30-31:

Os jovens se cansam e se fatigam, e os moços de exaustos caem, mas os que esperam no Senhor renovam as suas forças, sobem com asas como águias, correm e não se cansam, caminham e não se fatigam.

Segundo o relatório do Pastor Hoepffner, este culto era o encerramento digno do evento festivo da Assembleia Constituinte (Vorsynode) das comunidades teuto-evangélicas do Brasil Central, satisfatório para todos.

Nossa caminhada

Com a fundação do Sínodo do Brasil Central, há 75 anos, aumentou para 4 o número de Sínodos de origem alemã. Cada um reunia as comunidades de sua região para uma caminhada em conjunto. Nela, as comunidades ajudaram-se mutuamente para não se cansarem. Manifestaram visivelmente sua solidariedade cristã. Entrementes essas 4 igrejas regionais, os Sínodos, uniram-se, em 1949, na igreja nacional luterana, a Federação Sinodal, que, depois, se transformou na atual IECLB. Também para a futura caminhada continua valendo a mensagem bíblica proferida no encerramento da Assembleia de 1912. Por feliz coincidência, esta mesma mensagem é transmitida também em forma de hino, na 2 estrofe do hino n9 229 do hinário Hinos do Povo de Deus, da IECLB:

Os que esperam no Senhor, suas forças hão de renovar.

Prof. Joaquim Fischer
São Leopoldo, RS

Notas do Portal:

* Por ocasião do centenário do Sínodo Evangélico do Brasil Central, o Portal Luteranos reproduz este artigo em função da sua atualidade.
** Um pequeno equívoco já que havia um outro grupo de mulheres, o de Rio Claro/SP, fundado em 1999.

(Fonte: Anuário Evangélico, Editora Sinodal, 1987)
 


Autor(a): Joachim Fischer
Âmbito: IECLB
Área: História
Área: História / Nível: 200 Anos de Presença Luterana no Brasil
Natureza da memória: Retrospectiva - organizações
Natureza do Texto: Artigo
ID: 12711

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