Um Kaingang em minha escola

05/12/2014

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Quando o Kaingang entra na escola e é avistado pela criança do primeiro ano, de longe pode se escutar sua fala admirada: “Eu pensei que só existia índio na TV!”. O Kaingang sorri e segue até a sala que lhe aguarda, pois sabe que esta será apenas uma das descobertas das crianças neste dia.

Crianças a partir de 9 anos de idade até adultos e professores têm tido o privilégio de estudar sobre os povos indígenas, escutando o relato dos Kaingang, perguntando sobre sua história e cultura, ouvindo seu canto que diz: “Somos índios e somos filhos dessa mata, nós queremos coisas naturais para ver nossos filhos aprender!”

A lei 11.645, do ano de 2008, obriga as escolas, públicas ou privadas, a trabalharem a história e cultura indígena, algo que até então praticamente não era abordado, fazendo com que as crianças e jovens não conhecessem parte tão importante da sociedade brasileira. Baseadas nesta lei e no desejo de valorizar tais culturas, mais de sete escolas de Montenegro/RS abriram suas portas para a temática e puderam conhecer melhor o povo Kaingang.

A presença Kaingang nas escolas se deu através da exposição de banners deste povo, bem como de falas de Kaingang direcionadas a professores e alunos/as de vários níveis. No total, mais de 1.200 pessoas puderam aproximar-se desta temática e compreender melhor o modo de ser e viver dos Kaingang, povo desta região.

O COMIN (Conselho de Missão entre Povos Indígenas), entidade da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil-IECLB, realizou o trabalho de planejamento tanto com as escolas, como com os/as indígenas, separadamente. Da mesma forma, a mediação de contatos antes e durante a atividade entre escolas e Kaingang, buscando refletir, também, junto a este povo, sobre a importância do trabalho, além de possibilitar os deslocamentos para os diferentes locais. Uma preocupação foi trazer à tona o princípio da reciprocidade, tão importante para os Kaingang. No diálogo com as escolas, buscou-se explicar a importância de contrapartidas em relação ao trabalho realizado pelos Kaingang, que ocorreu de forma voluntária, seja por meio da compra de artesanato ou pela arrecadação de alimentos.

As falas nas escolas abordaram duas principais questões: a história e cultura Kaingang e a realidade de vida deste povo na atualidade. Com isso, os/as expectadores/as puderam conhecer aspectos de sua cultura, como as metades clânicas que organizam a vida em sociedade, e também perceber o quanto ainda precisa ser feito para que os direitos, garantidos em lei para os povos indígenas, sejam de fato respeitados. Os olhares de acolhimento para com a criança Kaingang que acompanhava os pais são apenas um sinal da relação de troca e fraternidade que se estabelece em tais momentos.

Angelita Beatriz Bordignon Vian, professora do Colégio Estadual Ivo Buhler-CIEP, comenta sobre a participação do cacique Kaingang Francisco Rokán dos Santos: “Foi uma maravilha trazer o Francisco pra cá! Foi o Ensino Médio que se grudou nesse projetão, mas respingou na escola inteira, com maquetes, os banners, a presença do indígena [...] A realidade mudou, a maneira como os indígenas vivem. A gente tem aquela imagem de que o índio é vagabundo, pois essa é a imagem que nós temos quando a gente não conhece a realidade do indígena”.

Segundo a professora, a presença Kaingang na escola trouxe maior entendimento para toda a comunidade escolar e até mudanças de postura: “Com os alunos que participaram a gente vê direitinho uma mudança. O que aconteceu foi um respeito maior por eles, já entendem os Kaingang lá no centro agora. Até já tem gente defendendo quando alguém fala mal!”

A partir dos retornos dados pelas escolas, pode-se perceber que muitos objetivos deste trabalho foram alcançados. Francisco, que é cacique na Terra Indígena Pó Mig, em Lajeado/RS, e atuou em várias escolas não-indígenas, explica: “Os cidadãos às vezes acham que nós somos brabos, mas queremos mostrar que temos cultura diferente, porém somos também cidadãos [...] Com esse trabalho nas escolas conseguimos nos aproximar das pessoas, falar sobre a nossa venda de artesanato, ser reconhecido pela prefeitura e pelas entidades da cidade.”

O que é destacado como o principal objetivo destas atividades pelo cacique é a aproximação intercultural: “Nós somos abertos para conviver mais junto, se aproximar e com isso diminuir os preconceitos”, ressalta Francisco. Como preconceito só existe em relação ao desconhecido, o trabalho realizado pelos Kaingang nas escolas montenegrinas é um bom caminho para a construção de uma sociedade mais tolerante e de respeito com a diversidade.
 

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