Os aflitos e indigentes buscam águas, e não as há, e a sua língua se seca de sede, mas eu o Senhor os ouvirei, eu o Deus de Israel não os desampararei. Abrirei rios nos altos desnudos, fontes no meio dos vales; tornarei o deserto em açudes de águas, e a terra seca em mananciais. Plantarei no deserto o cedro, a acácia, a murta e a oliveira;... para que todos vejam e saibam, considerem e juntamente entendam que a mão do Senhor fez isso, e o Santo de Israel o criou. Isaías 41.17-20
Uma parte da região Nordeste do Brasil - principalmente o chamado Polígono da Seca - vive novamente uma grande estiagem. Açudes, rios e lagoas estão secos. A população, já tão sofrida, enfrenta a seca como pode, ou busca, e geralmente não encontra, uma vida melhor nas cidades maiores. Como Igreja queremos colocar-nos ao lado dessas pessoas ameaçadas em sua existência.
A IECLB também atua no Nordeste. Há, por exemplo, campos de trabalho no Recife, em Fortaleza, Salvador, Natal. Ainda não é o suficiente, mas todos esses campos e outros mais são importantes iniciativas missionárias, lideradas por obreiros e por leigos. A Comunidade do Recife, por exemplo, tem um trabalho diaconal na Comunidade de Gravatá, distante 100 km, num bairro bem pobre, onde a população vive na maior miséria. Através do trabalho com crianças e de um programa de alfabetização de adultos, pessoas de Gravatá estão aprendendo a importância de uma vida melhor. Mesmo em meio à pobreza: estão se dando conta que a alfabetização é um importante instrumento para conquistar cidadania; estão aprendendo e ensinando o que significa solidariedade; estão, com sua humildade, desafiando a IECLB a conhecer a história do nordestino vítima da seca, do descrédito humano, e de pessoas que usam a desgraça desse povo para obter benefícios pessoais.
Gravatá nos faz acreditar que fome e pobreza podem ser combatidas, quando existem pessoas que se reúnem em torno da Palavra de Deus e se preocupam com o bem-estar de toda a comunidade.
Os meios de comunicação, com depoimentos de pais desesperados, imagens de crianças desnutridas e de saques a mercados, apresentam reportagens sobre iniciativas do governo, da sociedade civil e das igrejas, como campanhas de arrecadação de alimentos e distribuição de cestas básicas. São imagens que se repetem a cada nova seca. Desde o século XVI já são registradas grandes secas no Nordeste: são 41 desde lá, a última foi a de 1993.
Ações emergenciais, nesse momento, são extremamente importantes, pois se está lidando com o direito à vida. Mas só essas iniciativas não bastam. São necessárias ações maiores, como implantar projetos de educação, de saúde, de irrigação, de construção de açudes e canais, que beneficiem principalmente a população pobre e os pequenos agricultores. É preciso defender uma reforma agrária embasada numa política que dê garantias aos trabalhadores que vivem da terra. É preciso defender a geração de empregos dignos no próprio Nordeste. É preciso combater as agressões à natureza, que tanto prejudicam o equilíbrio da vida no nosso planeta.
Muita coisa já está sendo feita, mas muito mais urge realizar, haja vista as medidas extremas adotadas pela população, como saques a mercados e manifestações de protesto. Nessas atitudes fica mais uma vez explícito o conflito entre o direito à vida e o direito ao acesso à comida. A IECLB não apóia os saques, mas respeita as pessoas famintas e desesperadas quando apelam para esse expediente extremo para saciar a fome de suas famílias.
Como Igreja temos a consciência de que não podemos aceitar como natural que pessoas morram de fome, que crianças, geração após geração, nasçam e cresçam subnutridas. Como Igreja não podemos ficar só na indignação diante de notícias veiculadas pela TV e pelos jornais. Mais do nunca somos chamados para ações concretas de solidariedade e para a defesa de iniciativas de médio e longo prazo, que ultrapassem mandatos e governos.
Por isso, como Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil,
1 - intercedemos pelas pessoas que passam fome e sede no Nordeste e solidarizamo-nos com elas através da campanha ....., da entidade Diaconia, do Recife, da qual a IECLB participa. Essa entidade se propôs a construir 50 cacimbas e 50 poços, ao custo de R$ 50,00 e R$ 500,00 cada um, respectivamente. Cada Comunidade da IECLB pode assumir o compromisso de arrecadar o dinheiro seja para uma, duas ou mais cacimbas; ou para construir meio, um ou dois... poços. A iniciativa fica por conta dos presbitérios e do espírito de solidariedade dos membros de cada Comunidade. O dinheiro deve ser enviado para a IECLB, conta Nr..., indicando a finalidade. A Secretaria Geral encarregar-se-á de repassar, imediatamente, os valores para a Diaconia, que será solicitada a fazer prestação de contas de como e onde o dinheiro foi aplicado.
2 - apoiamos, individual e comunitariamente, campanhas locais que já estão sendo feitas por outras organizações que sejam sérias e garantam que as arrecadações de alimentos cheguem, de fato, até as pessoas necessitadas.
3 - enviamos, em nome da Presidência, correspondência ao Presidente da República e aos Ministérios competentes, pedindo atitudes mais eficazes no combate à seca, para que calamidades de fome e de sede não continuem se repetindo no Polígono da Seca.
É o que nesse momento talvez esteja ao nosso alcance. Não podemos omitir-nos ignorando a palavra de Cristo, que nos desafia dizendo: Tudo o que fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes (Mt. 25.40). Por sua graça somos acolhidos e nos tornamos comunidade solidária. Compartilhemos o generoso amor de Deus por testemunhos concretos dizendo Aqui você tem lugar. “Os aflitos e indigentes” anseiam pelo cumprimento da promessa lembrada no início: tornarei o deserto em açudes de águas, e a terra seca em mananciais. Somos chamados a contribuir com alegria para que isso aconteça e o Senhor da vida seja louvado.
Porto Alegre, 19 de maio de 1998
Huberto Kirchheim
Pastor Presidente