Sobre o ser Mulher

03 canções e uma poesia!

08/03/2016

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Neste 08 de março, Dia Internacional da Mulher, quero cantar e ouvir poesias! Há músicas e poesias que falam à alma e falam da vida. Ao querer cantar sobre a realidade de ser mulher, deparo-me, na cultura brasileira, com canções que humilham e oprimem, desprezam e rebaixam o sexo feminino. Canções que são entoadas e repetidas por milhares e contribuem para o preconceito e prática de violência contra a mulher. Esta violência é incentivada em músicas de diversos estilos, cantadas e reafirmadas por familiares nossos, amigos, sem nenhum filtro ou análise crítica do que se canta e por que se canta...!

Aliás, a violência contra a mulher é tema que nos atinge em cheio. Cada dia ouvimos histórias e relatos de mulheres violentadas das mais diversas formas por homens. Esta violência é incitada por programas de TV, propagandas, discursos da mídia e de pessoas nas mais variadas formas.

Quem de nós nunca ouviu ou conhece casos estarrecedores de violência contra a mulher? No início deste ano, na cidade onde moro, mais uma triste notícia da morte de mulher por violência praticada por seu companheiro. A situação era de que as filhas haviam ido “resgatar” a mãe na casa onde era constantemente violentada, e, após muita insistência das filhas, a mãe, com 52 anos, havia concordado em deixar o lar, e no momento que o “resgate” acontece, o esposo mata a mulher com diversas facadas, na frente das filhas, com as portas trancadas...! Sim, este e inúmeros relatos nos chocam, nos desinstalam diante do crescente e chocante machismo que mata mulheres e dilacera vidas e famílias, a cada dia, a cada hora.

Esta realidade da violência contra a mulher foi cantada por uma banda gaúcha, “Nenhum de Nós”, sob o título “Camila”, experiência que teria sido partilhada com o autor da canção por uma amiga da escola. Ela sofria com a constante violência de seu companheiro. De fato, a denúncia escancarada da violência contra a mulher não é assunto corriqueiro nas canções brasileiras, antes seu estímulo! Para contar a sua história, o compositor usa o nome fictício de Camila:

CAMILA
“Depois da última noite de festa
Chorando e esperando amanhecer, amanhecer
As coisas aconteciam com alguma explicação
Com alguma explicação
Depois da última noite de chuva
Chorando e esperando amanhecer, amanhecer
Às vezes peço a ele que vá embora
Que vá embora...oh...

Camila, Camila

Eu que tenho medo até de suas mãos
Mas o ódio cega e você não percebe
Mas o ódio cega

E eu que tenho medo até do seu olhar
Mas o ódio cega e você não percebe
Mas o ódio cega

A lembrança do silêncio daquelas tardes
Daquelas tardes
A vergonha do espelho naquelas marcas
Naquelas marcas
Havia algo de insano naqueles olhos,
Olhos insanos
Os olhos que passavam o dia a me vigiar, a me vigiar...oh...

Camila, Camila, Camila
Camila, Camila, Camila

E eu que tinha apenas 17 anos
Baixava a minha cabeça pra tudo
Era assim que as coisas aconteciam
Era assim que eu via tudo acontecer
E eu que tinha apenas 17 anos
Baixava minha cabeça pra tudo
Era assim que as coisas aconteciam
Era assim que eu via tudo acontecer

Camila, Camila, Camila
Camila, Camila, Camila”.

A violência mata, cega, oprime, vigia, faz baixar a cabeça e a autoestima, cerceia a liberdade, a violência é escancarada e sutil e está presente em nosso meio e em nossas canções. É preciso denunciá-la, é preciso bani-la da sociedade, é preciso instrumentalizar as mulheres para a vivência da libertação! Nesse processo nos ajuda a rockeira “Pitty” que, com coragem, desconstrói a imagem de um modelo de ser mulher que muito foi cantado e afirmado pela sociedade brasileira, mulher que foi “exaltada” por sua postura de mesmice, submissa e calada. Estamos falando de “Amélia”, cantada por Mário Lago que afirmou: “Amélia não tinha a menor vaidade, Amélia que era a mulher de verdade...” Em resposta a esta afirmação, Pitty canta e desconstrói:

DESCONSTRUINDO AMÉLIA
“Já é tarde, tudo está certo
Cada coisa posta em seu lugar
Filho dorme, ela arruma o uniforme
Tudo pronto pra quando despertar

O ensejo a fez tão prendada
Ela foi educada pra cuidar e servir
De costume esquecia-se dela
Sempre a última a sair

Disfarça e segue em frente
Todo dia, até cansar
E eis que de repente ela resolve então mudar
Vira a mesa,
Assume o jogo
Faz questão de se cuidar
Nem serva, nem objeto
já não quer ser o outro
hoje ela é um também

A despeito de tanto mestrado
Ganha menos que o namorado
E não entende o porquê
Tem talento de equilibrista
ela é muitas, se você quer saber

Hoje aos trinta é melhor que aos dezoito
Nem Balzac poderia prever
Depois do lar, do trabalho e dos filhos
Ainda vai pra night ferver

Disfarça e segue em frente
Todo dia, até cansar
E eis que de repente ela resolve então mudar
Vira a mesa,
Assume o jogo
Faz questão de se cuidar
Nem serva, nem objeto
já não quer ser o outro
hoje ela é um também”.

A libertação vivenciada pela Amélia da Pitty contrasta com a de Mário Lago. Outros tempos, outros olhares, outros valores, muitas conquistas, sendo necessária muita libertação, muita luta e defesa da vida e da liberdade das mulheres!

Dia Internacional da Mulher é tempo oportuno para refletirmos sobre o que falamos, o que cantamos, o que escrevemos e afirmamos sobre as mulheres e todas as pessoas que merecem respeito, amor, justiça e vivência da libertação daquilo que lhes oprime, do que impede a vida em paz e liberdade.

Como podemos construir um modelo diferente daquele apresentado pela mídia, pela maioria das canções, das idéias e pensamentos sobre o ser mulher? Dia 08 de março também serve para se fazer esta reflexão!

Lembremos que Jesus Cristo interferiu diretamente numa situação de violência contra a mulher, situação esta que era amparada pela lei. Ele impediu que uma mulher fosse apedrejada, cf. Jo 8. Que possamos nós também interferir nesta sociedade que se omite e recebe como normal a violência contra a mulher dentro e fora de sue lares. Que possamos promover vida, cura e libertação, tal qual Jesus promoveu, criando lindas canções, poesias e textos com conteúdos que nos façam crescer como seres humanos, que valorizem a liberdade de ir e vir, de amar e ser amada, de colorir e desabrochar para a vida, vida em abundância como Jesus sonhou para a humanidade, cf. Jo 10.10.

E por falar em libertação e defesa da vida, é preciso lembrar de “Mariana”. Esta canção relata a experiência vivenciada por uma mulher após o período de ilusão e traição, que é outra forma sutil de violência na sociedade. A banda “IRA” canta esta bela história e encoraja as mulheres para a libertação de tudo que lhes oprime, escraviza, violenta e aprisiona através da atitude de empoderamendo de “Mariana”.

MARIANA
“Mariana foi pro Mar
Deixou seus bens mais valiosos com o cachorro
E foi viajar, foi de coração
Pois o marido saiu pra comprar cigarros e desapareceu
Foi visto no Japão, com a vizinha, sua ex-melhor amiga
Mariana foi ao chão
E ela pensou por muitas vezes
Se usava sua mauzer ou o gás de seu fogão
Mas seu último direito, ela viu que era um erro
Mariana foi pro mar
Mariana se cansou
Olhou o que restava de sua vida, sem direito a pensão
Sem um puto pra gastar, sempre foi moça mimada
Mas tinha em si a vocação do lar
E foi numa tarde de domingo que ganhou tudo no bingo
Sorte no jogo azar no amor
E sua bagagem estava pronta, parecia que sabia
Do seu prêmio de consolação
Mudou o itinerário, trocou o funerário
Pelo atraso do avião
Uma lágrima de sal, percorre o seu rosto
misturando-se ao creme facial
Onde foi que ela errou, se acreditava na sinceridade
De sua vida conjugal
E se ela pensava muitas vezes
Se usava uma pistola ou o gás do seu fogão
Mas ela mudou o itinerário, trocou o obituário
Pelo atraso do avião
Hoje ela desfila pela areia
Com total desprezo pelos machos de plantão
Ela está bem diferente, ama ser independente
Mariana foi pro mar”

Sim, Mariana libertou-se a tempo, viajou para o mar e revirou sua vida descobrindo e buscando novos sentidos e horizontes. Amando-se e querendo-se bem, Mariana reviveu, reergueu-se, foi pro mar...Nem sempre a violência é a última resposta e após a crise de desamor instala-se um verdadeiro e novo valor!

Mas no início dizia que neste 08 de março quero cantar e ouvir poesia. A poesia dedico a você, mulher, a você, que vibra com as conquistas das mulheres, a você, que se empenha na luta por mais vida e direito para todas as mulheres, a você que vibra com cada luta em defesa da vida e da justiça de gênero, com cada libertação diária e se delicia com a maravilha de ser mulher!

E Deus me fez mulher
“E Deus me fez mulher,
de cabelo comprido,
olhos,
nariz e boca de mulher.
Com curvas
e pregas
e suaves profundidades
e me cavou por dentro,
me fez oficina de seres humanos.
Teceu delicadamente meus nervos
e balanceou com cuidado o número de meus hormônios.
Compôs meu sangue
e me injetou
para que irrigasse todo meu corpo;
nasceram assim as ideias,
os sonhos,
o instinto.
Tudo o que criou suavemente
A marteladas de sopros
e as perfurações de amor,
as mil e uma coisas que me fazem mulher todos os dias
pelas quais me levanto orgulhosa
todas as manhãs
e bendigo o meu sexo”.
Gioconda Belli (Nicarágua – Manágua, 1948)
 


Autor(a): Cristina Scherer
Âmbito: IECLB / Sinodo: Norte Catarinense
Área: Missão / Nível: Missão - Mulheres
Testamento: Antigo / Livro: Jó / Capitulo: 10 / Versículo Inicial: 10
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Meditação
ID: 37005
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