Amados irmãos, amadas irmãs,
estamos diante de um texto bíblico maravilhoso. O motivo é que Cristo está no centro. Todo o texto bíblico de Hebreus 5.5-10 é sobre Jesus. Não é sobre o ser humano e suas obras; não é sobre o ser humano e sua sabedoria; não é sobre o ser humano e suas mazelas. Não! É tudo sobre Jesus. Jesus está no centro. O autor da carta aos hebreus não testemunha de outro senão de Cristo. O Filho que não foi criado pelo Pai, mas foi gerado pelo Pai na eternidade. Por isso ele é o Filho Unigênito, ou seja, o único gerado.
O autor de Hebreus quer falar de Jesus. Quer comunicar Jesus a seus leitores ou ouvintes. Quer testemunhar das coisas que Deus fez em Jesus. Não sabemos quem foram os destinatários da carta. Contudo, devido ao conteúdo do texto, percebemos que é uma carta de encorajamento a irmãos e irmãs passando por sofrimento. E olha que interessante: em meio ao sofrimento, o autor não testemunha de ladainhas ou falácias humanas capazes de trazer um conforto momentâneo; não! O autor – seja quem for – testemunha de Cristo! Somente Cristo! Deus pronunciou sua palavra final absoluta por meio do seu Filho Unigênito; abandonar a Cristo significa abandonar o próprio Deus. Em meio ao desânimo, os ouvintes/leitores da carta não deveriam abandonar a fé, mas perseverarem ainda mais na revelação de Deus em Jesus.
Todos nós passamos por momentos de dificuldade em nossas vidas. Há momentos em que a cruz parece estar muito pesada. Existem momentos em que o sofrimento se instala de tal maneira em nossas vidas que parece não haver saída ou salvação. Muitas vezes, nem mesmo parece haver uma luz no fim do túnel. Quantas vezes estamos desanimados, tristes, desconsolados por coisas que acontecem e que estão fora do nosso controle. Você já se sentiu assim? Você já sentiu que parece que nada mais faz sentido? Você já se sentiu sobrecarregado por emoções as quais nem consegue denominar? Você já se sentiu triste, abatido, cabisbaixo? Quem em sua vida nunca passou por momentos de adversidades? Quem em sua vida nunca enfrentou verdadeiras guerras interiores e exteriores? Quem em sua vida já achou que aquele momento seria o fim?
Bem, se você, como eu, já teve esses sentimentos, a carta aos Hebreus é para você. Ela traz conforto e consolo justamente quando não parece haver o que fazer para deixar a situação de tensão. O centro está em Cristo. Deus fez tudo em Cristo! E a carta aos Hebreus nos convida a contemplarmos a Cristo e lembrarmos o que Deus já fez por todos nós e pela nossa salvação.
Não sabemos quem foi o bem-aventurado autor da carta aos Hebreus. Mas, ao ler a carta, podemos saber que é alguém que encontrou consolo, força e ajuda em Deus – e não em suas próprias forças ou méritos. Não sabemos o seu nome, mas sabemos o nome em quem o escritor crê: Jesus Cristo! Não sabemos a sua identidade, mas sabemos que é alguém que foi afetado pela identidade de Cristo – tão profundamente impactado que sua carta estabelece magistralmente as continuidades e as descontinuidades entre Antigo Testamento e Novo Testamento. É alguém que crê no mistério de Jesus Cristo, verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, gerado pelo Pai na eternidade.
Às vezes não somos nós quem estamos sofrendo. Às vezes quem sofre é o nosso próximo. Pode ser um vizinho, pode ser um familiar, pode ser um amigo, pode ser um irmão na fé... E quantas vezes nós nos perguntamos sobre como podemos ajudar a pessoa que está sofrendo. Às vezes, tudo o que queremos é libertar a pessoa do sofrimento, mas sentimos como se as nossas mãos estivessem atadas – e nada podemos fazer.
Esta também é a situação do autor da carta aos Hebreus. Ele está vendo o povo em sofrimento. Talvez, muitos estavam prestes a inclusive abandonar a fé cristã. Muitos já não suportavam o sofrimento. E essa pessoa desconhecida não ficou de braços cruzados. Ao contrário, tomou uma atitude – uma bela atitude. Essa pessoa começou a escrever! E escreveu não sobre si mesmo; não escreveu suas qualidades; não escreveu exaltando a si próprio. Não! Ele escreve sobre Cristo! Cristo é o consolo; Cristo é a ajuda; Cristo é o fundamento; Cristo é o cumprimento da Lei; e quem fez tudo isso foi Deus! Em meio ao sofrimento dos seus ouvintes, o autor não foca na sua própria história de “superação” (talvez), mas coloca todo o foco em Cristo!
Em Fevereiro de 2015, eu estava em Curitiba/PR e comprei, por curiosidade, o jornal Folha de São Paulo. Na edição, havia uma matéria chamada “Escreve que melhora” escrita por Reinaldo José Lopes em colaboração para o jornal. A matéria conta sobre uma descoberta do Centro do Câncer MD Anderson, nos EUA. Eles pediram que centenas de pacientes colocassem no papel, em detalhes, os pensamentos e as sensações provocadas pelo câncer. O resultado foi uma melhora significativa de vários sintomas da doença, relataram os pesquisadores. A matéria diz: “Usar a escrita como arma contra o câncer é só o exemplo extremo de uma série de outros estudos, os quais indicam que a chance de contar a própria história por escrito ajuda a enfrentar problemas de saúde ou dificuldades de relacionamento e autoestima” . Na matéria, pacientes também relatam o benefício da escrita como uma forma de terapia.
Talvez isso se compare em parte com a vivência do autor de Hebreus. Ele não estava enfrentando um câncer ou qualquer outra doença. Ele estava enfrentando outro tipo de sofrimento: a perseguição aos cristãos. Não apenas ele estava sofrendo com a perseguição, mas também as comunidades que se formaram a partir do anúncio do Evangelho. E então, o que o autor de Hebreus fez? Ficou de braços cruzados? Achou que não poderia fazer nada? Não! Muito pelo contrário, ele escreve: escreve da sua fé, escreve da sua esperança, escreve da sua confiança em Deus.
O autor de Hebreus escreveu sobre Cristo para as pessoas que mais precisavam ler ou ouvir sobre Cristo em seus sofrimentos. Ele testemunha a Cristo como o mais importante em meio às lutas da vida. E para falar de Cristo, precisamos encontrar um ponto de contato com o ouvinte. A melhor maneira de testemunhar de Cristo para alguém é descobrindo algo da identidade da própria pessoa. Se a pessoa gosta de futebol, esse pode ser o início de uma conversa que poderá chegar, em algum momento, ao amor de Deus pelo ser humano: Estávamos perdendo feio o jogo, até que Deus enviou Jesus para vencer por nós, por exemplo. Se alguém gosta muito de flores, esse pode ser o ponto de contato para falar do Deus que criou as belezas da Criação. Se alguém gosta muito de cozinhar, esse pode ser o ponto de contato para falar sobre as refeições de Jesus com seus discípulos. A melhor forma de falar de Jesus é conhecer o/a ouvinte!
O autor da carta aos Hebreus fez isso. Ele sabia muito bem quais eram os símbolos essenciais das pessoas que estavam sofrendo. Conhecia exatamente qual era a linguagem que seria capaz de falar profundamente aos seus corações. Tinha conhecimento sobre quais exemplos usar para trazer consolo a quem sofre. Não é uma carta alienada do seu público-alvo, mas uma carta que fala de alteridade para alteridade, ou seja, do eu para o tu. Para comunicarmos o Evangelho, precisamos falar a língua das pessoas!
O autor da carta aos Hebreus falou sobre Cristo. Todo o conteúdo dos versículos que ouvimos na leitura bíblica não são sobre as obras humanas, mas sobre o que Deus fez. Todo o foco está na ação de Deus. É Deus quem faz. É Deus quem age. É Deus quem já realizou a obra da salvação em Jesus Cristo. Mas, como ele comunica isso aos Hebreus? Usando a linguagem dos hebreus, ou seja, os elementos que são o ponto de contato com a realidade de seus leitores/ouvintes.
Ele diz que Cristo é sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque. Para os Hebreus, o sacerdote representava uma função essencial que era a realização dos ritos de purificação através dos sacrifícios e a própria mediação entre Deus e os seres humanos. Isso é algo muito valioso para os Hebreus. O autor então usa desse ponto de contato para lhes comunicar Jesus! Jesus é esse sacerdote! Ele foi enviado como sacerdote para sempre. Mas tem uma novidade: além de ser o sacerdote – aquele que definitivamente faz a mediação entre Deus e os seres humanos –, Jesus também é ao mesmo tempo o sacrifício. Ele “aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu” (Hebreus 5.8) e, de fato, foi “obediente até a morte, e morte de cruz” (Filipenses 2.8). Jesus é o sacerdote e, ao mesmo tempo, é o sacrifício! Enquanto os sacerdócios humanos são falhos, o sacrifício oferecido por Deus para o perdão dos nossos pecados é perfeito, único, o último e o necessário para que, pela fé, sejamos salvos.
Amados irmãos, amadas irmãs,
Cristo está no centro! Ele é o sacerdote! Ele é o sacrifício! Em meio aos seus sofrimentos, isso significa a própria presença misericordiosa de Deus contigo; em meio aos sofrimentos de quem está à tua volta, isso significa a compaixão de Deus pelos que sofrem. Em meio aos sofrimentos, olhe e contemple os sofrimentos de Cristo. Em meio às dificuldades, lembre das dificuldades de Cristo; em meio às dúvidas, dê lugar à fé.
Em nosso sofrimento, ouçamos o testemunho da carta aos Hebreus que diz: “ele tornou-se o Autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem” (Hebreus 5.9). Salvação! O autor da carta aos Hebreus testemunha a Jesus para os sofredores como Salvador!
Que boa notícia é essa! Não estamos abandonados! Não estamos sozinhos! Não estamos mais condenados! Veio o Salvador! Veio nos salvar! Ó, que consolo. Ó, que gratidão. Ó, que salvação! Escreve que melhora! Escreve isso hoje em teu coração: Cristo é o Salvador. Testemunhe isso a quem está sofrendo: Cristo é o Salvador. Testemunhe isso ao mundo que geme e sofre por causa dos pecados humanos: Cristo é o Salvador!
Vamos falar de Jesus. Vamos levar Jesus a quem sofre também através de atitudes de cuidado. Vamos espalhar a boa-notícia do Evangelho. Não guardemos a melhor notícia do mundo apenas para nós mesmos: testemunhemos até dos telhados o que Jesus fez em consolo aos que sofrem. E assim, sejamos sal da terra e luz do mundo ao espalharmos a luz e o sabor do Evangelho ao mundo escuro e sem sabor.
Amém.