Religião e Poder

Artigo

13/09/2002


Nesta semana, estamos sendo confrontados com repetidas imagens e reflexões que lembram os ataques terroristas sofridos pelo Pentágono, na capital americana, Washington, e testemunham a tragédia que destruiu o coração financeiro de Nova York e das Américas, o World Trade Center. Foi neste dia, 11 de setembro de 2001, que o mundo parou diante das ações audaciosas, pelas quais grupos religiosos islâmicos fanáticos se responsabilizaram. Foram muitos os questionamentos acerca das agressões do terror que acenderam disputas e dúvidas sobre as razões e as conseqüências de atos dessa natureza e grandeza..

Que caminhos o mundo haverá de seguir no futuro? Diante da responsabilidade que cabe à Igreja cristã de preservar vidas humanas e de promover o exercício do ministério da reconciliação, perguntamos pelo rumo que a instituição Igreja terá de tomar diante da nova realidade, pós-11 de setembro de 2001?

Representantes da ciência da futurologia, ao lado de muitas outras manifestações, se ocuparam com as mesmas questões. Seu intuito era de trazer subsídios que nos fizessem avançar em busca de argumentos norteadores. Ambos os lados, tanto os agentes do terrorismo como aqueles que contra-atacam os atores do terror, fundamentam os seus atos em convicções religiosas.

O cenário motivado pelo terrorismo, seja a partir do poderio bélico ou das sanções políticas e econômicas aplicadas por aquelas lideranças que se identificam sendo os donos do mundo, os árbitros sobre o bem e o mal, nos coloca diante de dois fatos. Em primeiro lugar, observamos o escalonamento das ações assassinas e violentas na sociedade moderna. Seus responsáveis podem ser lideranças amigas da guerra ampla ou dos atos de terror. Está à solta o time de lideranças políticas cegas diante das conseqüências desastrosas das aventuras bélicas ou das práticas do terror.

O segundo fato decorre daquele mencionado acima: o espírito guerreiro tolo dos dominadores do mundo tem como contrapartida o avanço da solidariedade internacional. Quem aposta no convívio pacífico, empenha-se pela prática da misericórdia e da reconciliação.

Na qualidade de discípulos/as do Mensageiro da Paz, somos adeptos radicais da política da paz, do diálogo, do amor. O cristianismo tem como vocação preferencial o desenvolvimento de instrumentos a serviço da defesa da vida, fruto da criação de Deus. Por causa da fé cristã, lutamos pelo fortalecimento e pela ampliação dos núcleos da solidariedade e do amor ao próximo. A sociedade humana, independentemente da cor ideológica e religiosa, é carente desses nichos da paz, do perdão e do respeito mútuo.

Este mundo tão conturbado e ameaçado por lideranças incapazes de promover a união entre os povos e cujo desenvolvimento futuro nos parece tão incerto, desafia as forças que promovem vida e paz. É força da fé que tem um compromisso de fidelidade com as respectivas bases confessionais, fundamentadas no Evangelho. Devemos ao mundo o testemunho de que Jesus Cristo é Filho único e verdadeiro de Deus. Sua missão foi ecumênica: a vivência da paz é possibilidade verdadeira. A ação reconciliadora de Jesus Cristo não conhece fronteiras, limites e supera os obstáculos criados pelo egoísmo e pela intolerância humana. O sacrifício de Cristo na cruz revela esta oferta de reconciliação. A minha paz vos dou. Vo-la dou não como o mundo a dá. É o anúncio de Jesus Cristo prestes a morrer.

Na perspectiva cristã, somos mensageiros de que este mundo é de Deus. Ele faz nascer o seu sol sobre os maus e os bons e vir chuvas sobre justos e injustos (Mateus 5.45), ainda que os dominadores deste mundo se arroguem o direito de classificar e de confinar os bons e os maus em compartimentos específicos. A fé cristã representa aquela força que, em meio à ansiedade e ao desespero, frutos das guerras e das tragédias, mostra o caminho do amor. Neste tempo determinado por falsas ideologias de segurança, a confiança em Jesus Cristo e o amor ao próximo recebem uma nova qualidade e importância.

São valores humanos e cristãos que precisam ser radicalmente diferenciados da política de segurança que as nações ricas e privilegiadas desenvolveram para assegurarem as suas próprias políticas de domínio.

Faz parte da missão do Deus dos cristãos preservar a distância crítica diante de todo tipo de imperialismo bélico, econômico e político. Trata-se de uma questão de bom senso e, não por último, determinação da religião e desafio do testemunho da fé em Jesus Cristo.

Manfredo Siegle
pastor sinodal do Sínodo Norte-catarinense
da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB)
em Joinville - SC
Jornal ANotícia - 13/09/2002


Autor(a): Manfredo Siegle
Âmbito: IECLB / Sinodo: Norte Catarinense
Área: Missão / Nível: Missão - Sociedade
Natureza do Texto: Artigo
ID: 8191
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