Profecia - Daniel 12.1-3

Profecias sempre serão constituídas de duas partes

14/11/2021

Daniel 12.1-3

1 E o anjo continuou, dizendo: — Nesse tempo, aparecerá o anjo Miguel, o protetor do povo de Deus. Será um tempo de grandes dificuldades, como nunca aconteceu desde que as nações existem. Mas nesse tempo serão salvos todos os do povo de Deus que tiverem os seus nomes escritos no livro de Deus. 2 Muitos dos que já tiverem morrido viverão de novo: uns terão a vida eterna, e outros sofrerão o castigo eterno e a desgraça eterna. 3 Os mestres sábios, aqueles que ensinaram muitas pessoas a fazer o que é certo, brilharão como as estrelas do céu, com um brilho que nunca se apagará.

Profecia

Duas considerações me ocorrem fazer quando a pregação se trata de interpretar uma profecia. Primeira, ela é sempre dramática e, de certa forma, assustadora. Não deixa chances para negociações e as ameaças realmente se cumprem. Segunda, por ser profecia, ainda dá tempo de correr atrás de algum prejuízo, do perdão, de reconsiderar caminhos e acertar o passo com a vontade de Deus. Tudo para que as ameaças não se cumpram sobre a vida de quem se arrependeu.

Daniel, este profeta, certamente era uma pessoa que chamava a atenção sobre si. Sua aparência, talvez, seu porte físico, sua inteligência, talvez. Estava, com três amigos, em um território hostil mas assim mesmo era admirado e tinha suas qualidades reconhecidas até pelo rei do local. O único problema parecia ser a fé que Daniel, seus amigos e todos os demais deportados tinham. Criam em um deus diferente do daquele local e estavam proibidos — por um decreto de seus opositores — de prestar Culto a seu Único Deus. A ameaça de queimar vivo a quem serve ao Deus Criador do povo de Israel naquele local, quase se confirma. Os três amigos de Daniel só escaparam vivos da fornalha porque um anjo do SENHOR os tirou de lá. E o próprio? Daniel foi lançado ao buraco dos leões. O rei Nabucodonosor nem sequer conseguiu dormir naquela noite em que Daniel lá passou e, no raiar do novo dia, foi ver o que restou do rapaz e o viu em pé, são e salvo. Um anjo do Senhor como que costurou a boca dos leões e nada fizeram.

O bravo e fiel Daniel já havia interpretado sonhos do rei e, com isso, tornou-se tão imprescindível dentro do palácio. E, além de interpretar sonhos, Daniel também sonhava, ou tinha visões. Desta vez estava à beira do Rio Tigre e ficou sem chão de tão impressionado com o que viu. Não sabia a que se segurar. Novamente anjos e outros seres celestiais, que a gente nem sempre consegue identificar, falaram palavras assustadoras. Iriam desmoronar todos os poderosos reinos da época. Síria, Pérsia e Egito estavam se desfazendo com maus governantes. Povos, antes poderosos e temidos, se desmanchariam por causa de sua infâmia e descaso com a justiça de Deus. Um longo tempo de perseguição e destruição estaria pela frente, mas Deus pouparia o Seu povo. Esta é a parte boa da profecia.

Profecias sempre serão constituídas de duas partes: a denúncia e o anúncio! Seria inimaginável um profetinha levantar ameaças contra reinos tão poderosos e bem instalados como os daquele tempo. Podem acreditar! Esses reinos não eram coisa pouca! Tivemos a oportunidade de ver, em museus londrinos, objetos, armaduras e até pedaços de portões e muros escavados em pesquisas arqueológicas desses lugares. São deslumbrantes. Mas tudo caiu. A profecia se cumpriu. Sim, a parte boa da profecia é o anúncio da possibilidade de mudanças.

Nesse tempo, aparecerá o anjo Miguel, o protetor do povo de Deus.” Assim anuncia o primeiro versículo. O nome Miguel significa: aquele que é parecido com Deus.1 Ele confirma que coisas terríveis acontecerão mas, na qualidade de guardião do povo de Deus, mostra a porta pela qual podem sair todas as pessoas que buscam o arrependimento. A notícia de um tempo de angústias e grandes dificuldades como nunca aconteceu desde que as nações existem” só é amenizada com o fato de que serão salvos todos os do povo de Deus que tiverem os seus nomes escritos no livro de Deus”.

O livro da vida é o lugar onde estão inscritos os nomes das pessoas que se mantiveram puras. Olhando para o livro do Apocalipse 3, temos uma aplicação desta profecia: “Há um grupo de cristãos fiéis que não contaminaram as suas vestes que são classificadas como dignos (vers.4). É a lã não tingida, é a vida não maculada. É a brancura da pureza de vida e integridade de caráter. As pessoas assim classificadas dignas não o são por elas mesmas. A dignidade humana acontece no participar da dignidade divina. E a recompensa será maior do que apenas não estar se maculando aqui. Uma nova vestimenta branca será dada (vers.5), ainda mais alva, a todas as pessoas que se arrependeram e preservaram sua integridade diante do Senhor. Para estas, não é relevante a fama ou os bons contatos com as autoridades terrenas; relevante é ter seu nome no livro da vida (Salmo 69.26-28). Mais uma vez: isto não é mérito humano, mas tão somente concretização do amor de Deus (Romanos 8.39; Ev. de Mateus 10.32s)”.2

Esta condição de ter seu nome inscrito no livro de Deus e ser visto como pessoa justa e não contaminada, traz mais um aspecto da vida ao cenário desta profecia: a ressurreição. Muitos dos que já tiverem morrido viverão de novo”. Não há outro texto no Antigo Testamento que fale de maneira tão clara sobre a vida após a morte porque, conforme diz o versículo 2, “uns terão a vida eterna”.

Realmente não consigo imaginar como esta notícia positiva — e bombástica — foi aceita. Ressuscitar? Entre os judeus provavelmente esta parte do anúncio desta profecia, a parte boa, seria mais improvável e confusa de ser aceita que a parte ruim. Mesmo nos dias de Jesus, um dos grupos judaicos atuantes, os saduceus, eram frontalmente contra qualquer doutrina da ressurreição.

E nós, hoje, neste século XXI, como podemos entender essa vida após a morte, a ressurreição, a eternidade? Ainda no século passado alguns teólogos foram festejados porque lançaram a ideia da “desmitologização”. Trocando em miúdos: desfazer os mitos que existem nos textos bíblicos, segundo eles. Da mesma forma como alguns detalhes das profecias de Daniel, os que tem referencial histórico, não podem ter acontecido nos dias e com os personagens citados, acreditam que alguns de seus ditos seriam apenas fantasia. Então precisamos nos perguntar: a cruz de Cristo, a ressurreição de Cristo, a volta de Cristo é para nós um mito ou é convicção de fé?

Muitas pessoas creem piamente de que textos bíblicos são fruto de imaginação ou criação coletiva que pretende acomodar as pessoas em uma pseudoliberdade para uma convivência pacífica e justa. E isto é ensinado séculos afora para acomodar interesses e necessidades, tanto as sociais como as individuais.

Daniel continua: “Os mestres sábios, aqueles que ensinaram muitas pessoas a fazer o que é certo, brilharão como as estrelas do céu, com um brilho que nunca se apagará”. Ou seja, o terceiro versículo aponta para o fato de que a verdade ensinada e crida nunca jamais será amordaçada. Tentativas não falta em nossos dias.

Dito em outras palavras: nada e ninguém, em tempo algum, poderá calar a voz do Evangelho. Isso porque sempre haverá pessoas que não se deixarão contaminar pelas falácias deste tempo, permanecendo com os olhos fitos no coração do Rei Jesus, o Senhor do Reino de Deus. Este reino não acaba. É eterno.

É bem por isso que a doutrina da ressurreição se torna doutrina básica e central no Novo Testamento. Se não há ressurreição dos mortos, então nem mesmo Cristo ressuscitou; e, se Cristo não ressuscitou, é inútil a nossa pregação, como também é inútil a fé que vocês têm” afirma o apóstolo Paulo em 1Coríntios 15. “Mais que isso, seremos considerados falsas testemunhas de Deus, pois contra ele testemunhamos que ressuscitou a Cristo dentre os mortos. Mas se de fato os mortos não ressuscitam, ele também não ressuscitou a Cristo”. A Igreja não tirou essa doutrina do nada. Um dos raros textos veterotestamentários sobre ressurreição temos em Isaías 26: “Os teus mortos e também o meu cadáver viverão e ressuscitarão. Despertem e cantem de alegria, vocês que habitam no pó, porque o teu orvalho, ó Deus, será como o orvalho de vida, e a terra dará à luz os seus mortos”.

Estamos no limiar de nosso ano eclesiástico. Domingo que vem é o último do ano no calendário litúrgico. Caminhamos entre a Páscoa da ressurreição até a coroação do Cristo Rei. Depois vem o Advento. Cristo volta. Vamos permitir que, como Igreja, sejamos bom testemunho neste mundo falível, mostrando — e vivendo — os valores que ficam para a eternidade.

Como diz Mia Couto, escritor moçambicano que se classifica com ateu não praticante”: ”Num mundo de dúvidas, onde tudo se desmorona, a igreja surge como a memória mais certa e permanente1.

Como Igreja, sejamos profetas, denunciemos, anunciemos mas, acima de tudo, vivamos o amor de Cristo Jesus.

Amém!

1 Weber, Eloir Enio. PL 45, Sinodal, 2020, p. 341 e 342
2 Rieck, Rolf. Em Tempo de Discipulado — Apocalipse, Encontro, 1999, p. 50
 


Autor(a): Pr. Rolf Rieck
Âmbito: IECLB / Sinodo: Sudeste / Paróquia: Rio de Janeiro - Martin Luther (Centro-RJ)
Área: Confessionalidade / Nível: Confessionalidade - Prédicas e Meditações
Testamento: Antigo / Livro: Daniel / Capitulo: 12 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 3
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 65865
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Quem conhece Deus também conhece as criaturas, as compreende e as ama, pois, nas criaturas, estão as pegadas da divindade.
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